Assistam ao filme antes de ler a fic que o continua, que neste blog já tem nove capítulos postados, só assim compreenderão como funciona a fanfic e como foi possível continuar o filme mesmo ele tendo começo, meio e fim. O filme é em inglês e não possui legendas, mas é possível encontrá-las no seguinte site: http://legendasraras.blogspot.com/2007/01/twins-of-evil-as-filhas-de-drcula-1971.html
http://www.youtube.com/watch?v=0WH699V9iro (Parte 1 - E a partir desta podem encontrar as outras oito)
E se ficarem curiosos para conhecer o filme "The Brides of Dracula" (1960), que deu origem a fic one-shot "100 escovadas antes de ir para a cama", acessem este link:
http://www.youtube.com/watch?v=O4dXnNgKmGE (Parte 1 - E a partir desta podem encontrar as outras oito)
Espero que gostem! E a partir de hoje estou retomando as postagens nesse blog, depois de um silêncio de quatro meses e meio....
Obrigada!
quarta-feira, 21 de outubro de 2009
terça-feira, 2 de junho de 2009
Em breve......
Um novo capítulo da saga da vampira mais perversa e sensual de todas: Frieda Gelhorn.
O terceiro capítulo de Bloody Mary, onde a jovem Madeline tenta, ao fazer um trabalho de escola, descobrir a razão do desaparecimento de uma equipe de jornalistas, porém, o que ela descobre é mais surpreendente do que se imagina.
E também novas histórias para os leitores ávidos por aventuras e romances!
O terceiro capítulo de Bloody Mary, onde a jovem Madeline tenta, ao fazer um trabalho de escola, descobrir a razão do desaparecimento de uma equipe de jornalistas, porém, o que ela descobre é mais surpreendente do que se imagina.
E também novas histórias para os leitores ávidos por aventuras e romances!
quinta-feira, 21 de maio de 2009
Bloody Mary - Capítulo 2: Phoebe volta para casa
Amanheceu mais um dia ensolarado em San Diego e eu acordei às 5 h e 30 min da manhã depois de passar a noite inteira sonhando com Ron Burgundy de uma forma inacreditavelmente real. Levantei e decidi ligar o computador para ver se tinha chegado algum e-mail e de repente, quando eu menos esperava, o telefone do meu quarto chamou e atendi voando, achando que podia ser uma das garotas, quando escutei uma conhecida voz masculina:
- Oi Miss Caruso, aqui é o Joe, fiquei sabendo pelo tio Wes que vocês pretendem fazer um trabalho sobre a equipe jornalística da KVWN e queria saber se posso fazê-lo com vocês, já que eu conheço algumas pessoas que conviveram com o quinteto...
Interrompi o Joe, lembrando que o besta tinha faltado a aula no dia anterior, certamente ajudando o pai a cuidar de algum paciente emergencial: - Primeiro: odeio esse apelido de Miss Caruso, segundo: o nosso trabalho era para estar em sigilo, terceiro: você podia ter esperado até eu chegar na aula e quarto: nunca mais me ligue a essa hora, então, conversamos na escola - e logo em seguida desliguei o telefone na cara dele.
Joe é o apelido de Joseph Sebastian Larkin, filho do médico da minha escola, Dr. Alan Larkin e capitão do time de futebol da escola, além de ser o mais grudento dos apaixonados, pois ele sempre dava um jeito de ficar que nem chiclete na Tracy Turnblad, por quem todos sabiam que ele era apaixonado, o que fazia todo mundo caçoar dele. Certamente, querer fazer o trabalho conosco era mais um pretexto para ficar perto da Tracy e mais uma vez, certamente sem sucesso, tentar dizer o que sentia.
Outra figura carimbada de San Diego, Wes Mantooth é o verdadeiro rei da antipatia, diretor de criação da KVWN a pelo menos 26 anos e tio do Joe, um homem de 64 anos, alto, consideravelmente corpulento, cabelos brancos e ex-repórter do Canal Dois, cuja falência tinha sido decretada cinco anos depois do sumiço da equipe jornalística da KVWN. Ele sempre foi rival de Ron Burgundy no que dizia respeito a quem era o melhor âncora da cidade e em outros aspectos que mal e mal eu conhecia.
Foi quando lembrei que Wes certamente estava olhando a exposição ontem, porém, longe de nossos olhos, já que ele não simpatizava nada com Harken e menos ainda gostava de saber que seu pior inimigo estava sendo homenageado, portanto, ele devia ter escutado a conversa que eu e as garotas tínhamos tido com o diretor da emissora e na certa deve ter contado ao Joe e conseqüentemente ao Link, filho dele e considerado o bonitão do terceiro ano da minha escola.
Então, imaginei que quando chegasse à escola, eu teria que agüentar Joe pedindo para fazer parte do meu grupo, porém, era mais importante agora eu me vestir e descer para tomar café se eu não quisesse me atrasar para pegar a Phoebe no aeroporto, mas, quando cheguei na escada, minha irmã mais velha tinha acabado de adentrar a porta usando a chave que a mamãe lhe dera e com várias malas pesadas, além de um grande sorriso: - Por acaso Maddie não vem me ajudar?
Desci correndo, quase caindo e a abracei muito forte quando cheguei na porta, chorando de felicidade por finalmente ter minha amada irmã de volta em casa: - Quando você chegou?!
- Mamãe ligou avisando que você ia me buscar no aeroporto, porém, eu não quero que você falte aula ou se atrase, então, resolvi antecipar meu vôo e cheguei aqui a 1 h e 30 min da manhã, porém, achei melhor me hospedar no hotel próximo para fazer uma surpresa pela manhã - respondeu a Phoebe muito feliz e me perguntando como eu estava.
Exceto a esquisita paixão que sentia por Burgundy, contei todo o resto numa empolgação que eu não tinha há muito tempo, deixando a Phoebe risonha como nunca desde que ela nos dera a notícia de que estava se divorciando: - Então você e as suas amigas vão contar a história dos cinco da KVWN? Eu imagino que vocês devem ter muita gente para entrevistar e devem ter encontrado muita coisa interessante sobre eles, não?
- Sim, porém, o que mais me intriga é qual teria sido a razão deles terem sumido assim - falei profundamente pensativa.
- Quem sabe fazendo esse trabalho, vocês não descubram algo sobre isso, pode haver alguma testemunha que não tenha sido ouvida naquela época - disse Phoebe me olhando.
Eu tinha esquecido que Phoebe era detetive da Homicídios de Phoenix, agora transferida para San Diego, e conseqüentemente entendia tudo sobre isso, inclusive pensei em pedir ajuda para ela, pois quem sabe, com isso, eu e meu grupo de trabalho poderíamos desvendar o grande mistério de San Diego dos últimos quarenta anos: o desaparecimento de Ron Burgundy e sua equipe.
- Mas tem uma outra coisa Phoebe: e se a verdade for pior do que San Diego pensa? - perguntei em um impulso.
- A vida é feita de coisas boas e ruins Maddie, aprenda isso enquanto você é nova pra não sofrer demais no futuro - respondeu Phoebe se baseando na própria experiência de ter sido casada com alguém que ela praticamente não conhecia até descobrir ser traída e se divorciar.
Pensei muito no que Phoebe disse enquanto subia junto com ela ao antigo quarto que era dela antes de ir morar no Arizona. Entramos no quarto e começamos a desfazer as malas dela, sendo aí que percebi que já eram 6h10min da manhã, faltando 40 minutos para papai e mamãe acordarem.
Sorrindo como nunca, combinei com a Phoebe de fazermos uma surpresa aos nossos pais e juntas, fizemos um lindo café da manhã, conseqüentemente deixando a cozinha consideravelmente bagunçada e tendo que limpá-la faltando sete minutos para nossos pais acordarem.
Rápidas como sempre éramos embora nossa diferença de idade fosse 15 anos, deixamos a cozinha limpa e sentamos à mesa esperando nossos pais e quando eles desceram, nos vendo sentadas juntas à mesa, comemoraram como loucos o retorno antecipado da Phoebe e a abraçaram como se tivessem ficado sem vê-la mais de séculos, embora ela sempre viesse todos os verões com o ex-marido para a nossa casa e telefonasse com uma freqüência de quatro dias.
Sorrindo mais ainda depois que ela explicou o motivo do retorno antecipado, nossos pais e nós duas tomamos café todos juntos, comemorando aos risos e matação de saudade a reunião da família.
Mamãe foi ajudar Phoebe a arrumar as coisas dela de volta no antigo quarto que ela ocupava enquanto papai dizia para eu ir me vestir de uma vez, senão eu ia me atrasar para a escola.
Subi correndo e me vesti mais rapidamente ainda, arrumando minhas coisas na bolsa, porque na noite anterior eu tinha esquecido de fazê-lo, descendo uns 10 minutos depois de ter subido, mas não sem antes conferir se estava tudo certo e não faltando nada.
Nada faltando e tudo certo, eu desci e fiquei esperando papai ficar pronto para me levar à escola, mas, quando menos esperava, escutei um ronco seguido de uma buzina que eu sabia muito bem de onde vinha: a picape do chefe Roarke, que o sobrinho dele, o Tyrrell, usava para levar a Isabella, prima dele e filha do chefe de polícia da cidade, para a escola.
Saí e escutei aquele típico sotaque nova-iorquino dele: - Quer vir com a gente hoje, Maddie?
Olhei para dentro e vi que meu pai descia, imediatamente perguntando a ele se eu podia ir com o Tyrrell e a Bella e recebendo uma resposta positiva, desde que o Barnabas Collins de cabelo espetado não acelerasse demais o carro, pois embora ele dirigisse melhor que muitos motoristas veteranos, ele era rápido demais e isso sempre fazia o chefe Roarke ter inúmeras queixas dele.
Saí para a calçada e entrei na picape sorrindo e cumprimentando, depois perguntando como eles estavam:
- Como sempre, eu tô bem, só que o tio Roarke vive dizendo que eu ainda vou pagar multa - respondeu aos risos o Tyrrell.
- O papai não tem tempo nem pra resolver todos os mil casos que chegam no departamento por dia, vai ter tempo de te dar uma multa, Collins? Além disso, ele nem guarda de trânsito é! - respondeu a Isabella, vulgarmente Bella, aos risos, se referindo ao fato do pai dela, chefe da polícia de San Diego, quase sempre estar lotado de incontáveis queixas e ao apelido que meu pai e o professor de matemática tinham posto no Tyrrell por acharem ele parecido com um ator chamado Jonathan Frid, que eu sabia ter feito papel de um vampiro chamado Barnabas Collins em uma série chamada Dark Shadows.
- Pô Bella, até você anda agora encasquetando com esse apelido em cima de mim? - perguntou o Tyrrell dando partida no carro danado da vida porque detestava o apelido.
Nada falei enquanto os dois iam discutindo pelo caminho sobre Tyrrell ser ou não parecido com Jonathan Frid, ainda que eu não imaginasse como uma discussão daquelas podia durar 15 minutos, o tempo que eu levava para chegar à escola de carro.
Quando chegamos na escola, os dois se calaram vendo que eu já estava olhando com cara estranha e cada um seguiu seu caminho depois que nós trocamos “bom dia” e “ótima aula pra você” e a Bella dando um beliscão na bunda do primo sem que ninguém notasse e deixando ele ainda mais danado da vida do que já estava, embora eu tivesse notado, ainda que discretamente e finalmente, descoberto a razão de todo mundo viver dizendo que o Tyrrell e a Bella eram namorados apesar de serem primos - irmãos: ela era louca de amores pelo primo, pois vivia praticamente amarrada nele, já que eles sempre estavam juntos, fosse onde fosse e como.
Jurei para mim mesma que não contaria aquilo a ninguém antes que o Tyrrell me abordasse no maior constrangimento, percebendo que eu tinha visto Bella beliscando onde não devia: - Você não vai dizer isso a alguém vai?
- O que você e a Bella fazem ou deixam de fazer não é problema meu, eu só temo que o chefe Roarke descubra e isso dê confusão, pois vocês são parentes - respondi deixando muito claro na minha expressão que nada diria sobre o episódio de mão boba quase explícita que eu havia testemunhado.
Segui silenciosamente junto com o Tyrrell para a aula de espanhol e ao chegar na sala, fiquei sabendo que o professor Ramirez tinha ficado doente e não viria, o que nos deixaria sem aula até o terceiro período, fato comemorado ruidosamente pela minha turma inteira, considerada “o reduto dos esquisitos” do terceiro ano da Escola Santa Clara de Assis de San Diego, porque a maioria da minha sala tinha alguma “esquisitice”, ao menos no conceito das detestáveis líderes de torcida.
Sentei com Pippa, Imy e Tracy enquanto o Tyrrell foi sozinho para o canto dele, onde ninguém se atrevia a incomodá-lo, sob risco de tomar um belo nocaute do melhor e mais forte boxeador da escola.
- E aí Maddie, que horas você e as garotas se reúnem comigo lá em casa? - perguntou a Pippa na maior animação, anunciando que o treinador Hooken se encontraria hoje em casa de folga e nos daria a entrevista para o trabalho de História.
- Por mim, todo mundo podia seguir direto pra sua casa depois do término da aula, mas primeiro vou ligar pro papai avisando, porque ontem eu esqueci e deu confusão - respondi muito alegre.
A Imy e a Tracy concordaram dizendo que também avisariam aos pais e depois ficamos jogando conversa fora durante quase meia hora até que o Joe chegou e correu para perto da gente perguntando de imediato se podia fazer parte do nosso grupo.
- Desde que você não se escore na gente pra ganhar nota de graça, concordamos - disse a Imy, que desde a oitava série não ia com a lata do Joe.
Joe fez cara de quem não gostou do que ouviu e respondeu quase à queima roupa, chamando a Imy pelo nome:
- Meu pai conheceu a equipe da KVWN e ele conhece muita gente, mas muita gente mesmo, que conviveu com eles, Imoghen, então, se eu for aceito no grupo, todo mundo aqui vai tirar um 10 do tamanho do planeta Terra.
Tracy olhou por um minuto e alguma coisa e disse: - O Dr. Larkin realmente pode colaborar muito pro nosso trabalho, então, não tem problema se a gente aceitar o Joe no grupo.
- Juntando a entrevista que vamos fazer hoje com o tio Hooken e mais o depoimento do Dr. Alan, nossa, se nosso trabalho levar menos de 10 vai ser cisma da nariguda Minnie - disse a Pippa chamando a professora pelo apelido que a escola inteira tinha posto na Senhora Potter em razão do enorme nariz dela e da personagem do desenho Pica-Pau.
- Ela tem cisma com todo mundo, até com quem é quieto que nem o Barnabas Collins - falou o Joe em voz baixinha, pois não tinha sido apenas uma vez que ele quase apanhou do Tyrrell por dizer o que não devia e ele ter ouvido.
- Você realmente pede pra tomar porrada Joe - falou Tracy, que detestava quando alguém ficava de cisma por qualquer razão.
Resolvida a parte do novo membro do nosso grupo de trabalho, ficamos reunindo as informações até o momento conseguidas e ficamos comentando de algumas coisas contadas pelo Harken, inclusive boatos sobre um tórrido romance gay entre Brian Fantana e Brick Tamland, o que fez Joe rir até doer o estômago.
- Cara, não consigo imaginar esses dois se pegando é nunca! - o Joe ria até ficar vermelho e sem ar.
Imy fez a maior cara de nojo imaginando enquanto eu, a Pippa e a Tracy nos entreolhamos devido ao vexame que passávamos porque o Joe ria pior e mais alto que o Coringa do Batman.
Depois que passamos dois períodos sem aula, tivemos matemática financeira com a professora Gallagher, mais conhecida como “Cabeça de Fogo”, porque além de ser muito ruiva, era esquentada igual uma brasa.
Passado o terceiro período, fomos para o intervalo e ficamos conversando todo o tempo, inclusive na fila para pegar o lanche, onde encontramos o Emmett, atacante do time de futebol e ele como sempre, fazia elogios a mim, a Pippa e a Imy, mas quando viu a Tracy, só faltou disparar da fila sem pegar nada, mas como não queria ficar sem lanche, digamos que “se agüentou”.
Depois que ele saiu da fila, Tracy perguntou meio triste: - Ele ainda...?
Ficamos sem saber o que responder, embora a escola inteira soubesse o porquê do Emmett agir daquele jeito: dois meses atrás um acidente aconteceu no depósito de material esportivo, que não tinha sido esclarecido até o momento, apesar de um monte de depoimentos terem apontado Tracy como pivô do acidente, pois o imbecil atacante do time tinha feito uma aposta com os amigos que conseguiria agarrá-la à força e depois contar para todo mundo, para a escola inteira caçoar mais ainda dela.
Porém, quando ela se desvencilhou dando um chute daqueles na canela dele, um taco de beisebol voou do fundo do vestiário até atingir em cheio a cabeça do Emmett, que por milagre não sofrera nenhuma seqüela, embora ele tenha ficado internado no hospital devido ao impacto da batida.
- Ninguém mandou ele tentar aquilo com você Tracy, bem feito pra ele - disse a Pippa, que odiava o Emmett desde que ele tinha feito uma brincadeira de mau gosto que ele tinha feito com ela na formatura do ensino fundamental.
Olhamos a Pippa quando Tracy limpou uma lágrima do rosto, porque apesar de ter quase sido vítima de uma chacota do Emmett, ela foi a primeira a gritar feito desesperada quando viu ele caído no chão desacordado e chamar o resgate para levá-lo ao hospital.
Percebemos que ele viu a cena porque ele parou no meio do refeitório e se voltou até a gente, que já ia para a mesa e quando terminamos de sentar, ele se sentou e disse:
- Acho que está na hora de eu enfrentar o que estou sentindo e espero que você já tenha me perdoado por aquela coisa que eu quis te fazer e fique sabendo que eu agradeço por você ter me ajudado, embora eu ultimamente tenha agido como um idiota.
- Idiota você já é desde que nasceu - disse a Pippa, levando de mim em seguida uma boa cutucada para ficar quieta.
Emmett olhou a Pippa por alguns segundos e a ignorou, sendo que eu esperava que ele mandasse a “gorda” calar a boca e percebendo que realmente ele estava bem mudado desde o “acidente” que poderia tê-lo matado.
- Sabe Tracy, não é que eu tenha medo de me aproximar, o que eu tenho medo mesmo é do Champ Kind querer me matar como tentou fazer com a ex-líder de torcida Trish, por isso eu preferi me afastar, porque sei que ele é seu anjo da guarda, embora ele tenha a aparência mais sinistra que eu já vi na minha vida toda - Emmett terminou a frase gaguejando e com as mãos trêmulas.
Tracy, Pippa, Imy, Joe e eu olhamos Emmett com espanto, especialmente a Tracy, ficando bastante brava e ele disse, pálido como nunca: - Eu imaginava que você ia querer me matar depois dessa, mas eu precisava falar, isso estava preso na minha garganta.
Ao invés de ficar ainda mais danada da vida, Tracy perguntou: - Como assim?
- Certamente você vai dizer que foi uma alucinação e que elas podem ser reais até um pouco demais, mas eu garanto: eu vi a cara dele, senti os dedos gelados dele agarrando o meu pescoço e ainda o ouvi me ameaçando de morte se eu me aproximasse de você de novo e o pior de tudo é que o cara parecia o Barnabas Collins furioso por conta do tamanho daqueles caninos! - disse o Emmett apavorado, como se tivesse acabado de acordar de um longo pesadelo.
- Dedos gelados? Até onde eu sei anjos não são seres muito corpóreos - falou Imy olhando o Emmett como se ele tivesse ficado doido de pedra.
- Caninos grandes? - Joe olhou Emmett e de repente ficou numa espiral de pensamento, até que falou: - Você tá dizendo que o Champ Kind é um...?
- Sinceramente, eu não sei se foi coisa da minha cabeça que pareceu demasiadamente real, porém, que eu fiquei morto de medo, isso com certeza! - Emmett parecia uma criança com todo aquele medo.
- Você e o Joe ficaram doidos, essa coisa de vampiro não existe - disse a Pippa olhando os dois como se eles fossem idiotas e compreendendo o raciocínio silencioso do Joe.
- Por acaso tem explicação melhor Pippa? - perguntou Joe e eu percebi que ia começar uma discussão na mesa, já que eu sabia que ela ia acusar o Emmett de usar drogas ou coisa parecida e ele ia defender o amigo atacante certamente xingando a Pippa e ela ia voar em cima do Joe.
- Vocês dois não comecem antes que todo mundo vá parar na diretoria por briga e todos nós sabemos que o diretor Petrarchus não é moleza quando pune quem faz o que não deve - falei, deixando muito claro que era melhor eles se calarem antes que piorasse.
Os dois calaram e ficaram trocando olhares cheios de chispas de ódio enquanto Emmett parava de tremer e pedia mil desculpas para Tracy, que sorria dizendo que já havia esquecido tudo e que eles poderiam ser amigos, embora ela não tivesse acreditado em uma única palavra que ele tinha dito em relação à tacada que tinha tomado na cabeça, mas achava melhor não dizer nada sob risco de polemizar ainda mais.
Terminado o intervalo e conseqüentemente a aula devido ao aniversário de San Diego, ligaria para o papai avisando que iria à casa da Pippa e almoçaria lá porque tínhamos que continuar o trabalho, porém, lembrei que era o dia das compras do mês, que tinham ficado sob minha responsabilidade desde que tínhamos descoberto a doença de Parkinson na mamãe.
Mandei uma mensagem pelo celular para Tracy, Pippa, Imy e Joe avisando que eu chegaria na casa da Piper por último, por conta de ser a responsável por suprir a casa de comida pelos próximos 30 dias e fui voando pegar o ônibus até o mercado onde eu fazia as compras, chegando lá depois de dez minutos e descendo na parada que ficava do outro lado do mercado, esperando que o semáforo fechasse logo, já que o movimento dos carros naquela via era inacreditável até mesmo para uma cidade do porte de San Diego.
Fechado o semáforo, eu precisava ser rápida, já que o tamanho da pista era seis vezes a calçada e o costume era o sinal abrir muito rápido, fazendo todo mundo que circulava ali esperar mais tempo para atravessar a rua por completo.
Eu, apressada, procurei ir mais rápido que pudesse e quando terminava de atravessar a segunda parte da rua, percebi que algo caiu da minha bolsa e me abaixei para juntar, quando ouvi um som guinchado que parecia alguma coisa fora de controle vindo a alguns metros, senti algo ou alguém me empurrando e de relance, vendo algo acontecer, embora eu não estivesse entendendo muito bem, além de escutar um impacto que me doeu no ouvido seguido de uma voz masculina incrivelmente familiar:
- Não te ensinaram que se confere as coisas antes de carregá-las e que é perigoso parar no meio de uma via movimentada, garota?
Olhei para cima e quase desmaiei quando vi quem havia salvado minha vida: uma cópia perfeita e fidelíssima de Ron Burgundy, tanto no corpo como no rosto, além da voz igualmente linda e musical, porém, quase apaguei mesmo quando vi a frente do caminhão, amassada de tal forma como se alguma coisa tivesse o feito parar à força.
- Foi burrice minha, desculpa se eu causei algum tipo de problema ao senhor - gaguejei a frase inteira de tão nervosa que eu estava e percebendo a burrada que por pouco não me fez ser esmagada por toneladas de metal: a bolsa estava com a metade do fecho aberto.
- Pra mim você não causou nada, mas por muito pouco essa caminhonete não te transformou em pizza devido à sua falta de prudência com as regras de trânsito - disse ele me olhando e começando a se distanciar sem dizer nada como se eu tivesse despertado algum tipo de asco nele.
Não consegui dizer mais nada, sequer perguntar como ele se chamava enquanto ele se afastava até ficar longe do meu campo de visão, quando vi uma equipe de resgate chegando para levar eu e o motorista imprudente que sangrava muito por ter dado de cara no pára-brisa do carro devido ao impacto e levantei sentindo uma imensa dor no rosto, porque só naquele momento percebi que bati de cara no chão ao ser empurrada pelo meu herói.
Já estava em um leito no hospital há pelo menos uma hora, quando chegou ninguém menos que o famoso e bondoso Dr. Larkin, pai do Joe e claro, todo o meu grupo de trabalho, certamente avisado por ele que eu tinha sofrido um “pequeno acidente” e apavorado, perguntando umas mil vezes como eu estava ou se não tinha quebrado algum osso.
- Maddie está bem, apenas com dor no rosto por ter caído na calçada quando um alguém misterioso a salvou, segundo depoimento de uma testemunha - respondeu o médico Alan na tentativa de acalmar o filho e minhas três amigas.
Foi quando o acontecido veio como um filme na minha cabeça, me deixando apavorada: o carro parou a pouca distância de mim devido a um corpo grande e forte, usando um par de ombros firmes, ter criado um amassado daqueles na frente do caminhão e certamente eram do “fantasma de Ron Burgundy”, que tinha me salvado de morrer esmagada contra um Volvo estacionado próximo de mim e o que me apavorava era que eu não o tinha visto antes de tudo aquilo ocorrer.
A sensação de que eu era Bella Swan sendo salva pela primeira vez por Edward Cullen era certa, porém, aquele era mais lindo, mais perfeito e mais forte, um deus grego que parecia ter caído do Monte Olimpo para me salvar.
Eu tinha a sorte de ter ficado viva, além de Alan não ter avisado aos meus pais do acidente, pois minha mãe tinha sérias crises de Parkinson quando ficava nervosa demais, mas claro que ele avisou a Phoebe, que chegou louca de vontade de encher o imprudente motorista de porrada, mas sendo acalmada pelo Dr. Larkin, que dizia que eu estava bem.
- Esse louco podia ter matado a Maddie! - exclamava a Phoebe repetidamente.
- Exceto pela dor no rosto, estou bem Phoebe - respondi mesmo sabendo que não podia, porque o Dr. Alan me recomendou o máximo de repouso e falar o mínimo possível.
Phoebe disse aos outros que a parte escrita do trabalho ia ficar para amanhã porque eu precisava descansar, afinal aquele acidente havia sido feio, e me levou para casa.
Quando chegamos em casa, Phoebe me perguntou como eu podia ter feito a burrice de me abaixar no meio da rua para recolher uma coisa caída da bolsa.
- Eu sei que não devia ter feito isso, mas você sabe como detesto perder qualquer coisa, ainda mais agora que tivemos que cortar várias despesas porque a mamãe sofre de Parkinson - respondi embora eu soubesse que nada justificava minha imprudência.
- Eu te entendo Maddie, realmente entendo seu motivo, porém, ele não justifica o que você fez, então, eu vou passar a alongar o meu caminho para o departamento pra te levar à escola, afinal, eu não te quero metida em encrenca e também garantir que você não cometa outra burrice - disse a Phoebe, me deixando desanimada, porém, eu compreendia, afinal, ela queria minha segurança mais que tudo e eu não podia simplesmente esquecer que o fato de eu ter quase morrido também tinha sido culpa minha.
Subi para meu quarto depois de conversar com a Phoebe e tranquei a porta porque naquela hora não queria ninguém me incomodando, querendo ficar sozinha para reordenar meus pensamentos, porque até ali a minha cabeça rodava mais que o planeta Terra, especialmente por eu não conseguir parar um só minuto de pensar naquele amor inalcançável que sentia por Ron Burgundy.
Me joguei na cama com um desânimo que não sentia desde muito tempo e praticamente dormi, tamanho o cansaço psíquico que sentia, embora eu não estivesse cansada fisicamente.
De repente, ouvi alguém chamando meu nome de uma forma bela e delicada, me acordando e fazendo com que eu andasse em direção à origem daquele som, que era em algum lugar onde talvez minhas pernas não pudessem me levar, mas, por alguma razão desconhecida, não parei de andar até chegar a uma antiga casa que ficava muito longe de onde eu estava antes.
A porta velha e grande em madeira trabalhada se abriu sem que eu precisasse tocá-la, me permitindo entrar e subir até a origem daquele som lindo e delicado, um quarto exatamente igual ao do clipe “Afternoon Delight”, do filme “O âncora”, onde ninguém menos que Ron Burgundy me esperava: - Bem - vinda, Maddie.
Me aproximei sorrindo e em absoluto silêncio, porque nenhuma palavra caberia em momento tão sublime como aquele, onde finalmente eu recebia um beijo verdadeiro daquele que eu amava, além de um forte e protetor abraço, que me fez sentir a mais amada das garotas, quando, de repente, os outros quatro membros da equipe da KVWN e mais uns quantos homens e mulheres entraram e ficaram nos olhando, até que Brick, na altura de seu descomunal tamanho, disse a Ron sorrindo da forma mais sinistra e assustadora que eu já tinha visto:
- A partir dessa noite ela nos pertencerá e o mesmo será com todos aqueles que estiverem próximos dela.
Ouvindo aquela frase, tudo de repente ficou escuro e de alguma forma me dei conta do que estava acontecendo e mais que qualquer coisa desejei fugir, porém, uma dor inacreditável tomou conta de mim, seguida de um grito desesperado.
Seguido daquele grito, dei um inacreditável pulo na cama, descobrindo que tudo não tinha passado de um pesadelo dos mais terríveis e reais que eu já tinha tido.
Quando olhei o relógio do celular, vi que tinham se passado duas horas desde que eu havia me atirado na cama e uma mensagem do Joe dizendo que a parte escrita do trabalho tinha sido concluída, a entrevista com o treinador tinha sido feita e que ambas as coisas estavam no meu e-mail para que eu visse e enviasse a professora Potter e que amanhã, durante o intervalo da aula, iríamos organizar quem iria apresentar o que do trabalho e depois da aula, todo mundo iria pra casa da Tracy ensaiar a apresentação.
Respondi dizendo que estava tudo bem e que eu não me atrasaria para depois da aula, indo logo depois para o computador ver meu e-mail, pegar o que Joe disse que tinha enviado e ver como tinha ficado.
Embora eu estivesse perfeitamente acordada e soubesse que um pesadelo era apenas um pesadelo, eu me perguntava por que justamente com aquilo eu havia sonhado e mais uma pergunta se fez na minha cabeça: será que o meu pesadelo dizia alguma coisa sobre o desaparecimento dos cinco da KVWN da qual eu ainda não tinha me dado conta?
- Oi Miss Caruso, aqui é o Joe, fiquei sabendo pelo tio Wes que vocês pretendem fazer um trabalho sobre a equipe jornalística da KVWN e queria saber se posso fazê-lo com vocês, já que eu conheço algumas pessoas que conviveram com o quinteto...
Interrompi o Joe, lembrando que o besta tinha faltado a aula no dia anterior, certamente ajudando o pai a cuidar de algum paciente emergencial: - Primeiro: odeio esse apelido de Miss Caruso, segundo: o nosso trabalho era para estar em sigilo, terceiro: você podia ter esperado até eu chegar na aula e quarto: nunca mais me ligue a essa hora, então, conversamos na escola - e logo em seguida desliguei o telefone na cara dele.
Joe é o apelido de Joseph Sebastian Larkin, filho do médico da minha escola, Dr. Alan Larkin e capitão do time de futebol da escola, além de ser o mais grudento dos apaixonados, pois ele sempre dava um jeito de ficar que nem chiclete na Tracy Turnblad, por quem todos sabiam que ele era apaixonado, o que fazia todo mundo caçoar dele. Certamente, querer fazer o trabalho conosco era mais um pretexto para ficar perto da Tracy e mais uma vez, certamente sem sucesso, tentar dizer o que sentia.
Outra figura carimbada de San Diego, Wes Mantooth é o verdadeiro rei da antipatia, diretor de criação da KVWN a pelo menos 26 anos e tio do Joe, um homem de 64 anos, alto, consideravelmente corpulento, cabelos brancos e ex-repórter do Canal Dois, cuja falência tinha sido decretada cinco anos depois do sumiço da equipe jornalística da KVWN. Ele sempre foi rival de Ron Burgundy no que dizia respeito a quem era o melhor âncora da cidade e em outros aspectos que mal e mal eu conhecia.
Foi quando lembrei que Wes certamente estava olhando a exposição ontem, porém, longe de nossos olhos, já que ele não simpatizava nada com Harken e menos ainda gostava de saber que seu pior inimigo estava sendo homenageado, portanto, ele devia ter escutado a conversa que eu e as garotas tínhamos tido com o diretor da emissora e na certa deve ter contado ao Joe e conseqüentemente ao Link, filho dele e considerado o bonitão do terceiro ano da minha escola.
Então, imaginei que quando chegasse à escola, eu teria que agüentar Joe pedindo para fazer parte do meu grupo, porém, era mais importante agora eu me vestir e descer para tomar café se eu não quisesse me atrasar para pegar a Phoebe no aeroporto, mas, quando cheguei na escada, minha irmã mais velha tinha acabado de adentrar a porta usando a chave que a mamãe lhe dera e com várias malas pesadas, além de um grande sorriso: - Por acaso Maddie não vem me ajudar?
Desci correndo, quase caindo e a abracei muito forte quando cheguei na porta, chorando de felicidade por finalmente ter minha amada irmã de volta em casa: - Quando você chegou?!
- Mamãe ligou avisando que você ia me buscar no aeroporto, porém, eu não quero que você falte aula ou se atrase, então, resolvi antecipar meu vôo e cheguei aqui a 1 h e 30 min da manhã, porém, achei melhor me hospedar no hotel próximo para fazer uma surpresa pela manhã - respondeu a Phoebe muito feliz e me perguntando como eu estava.
Exceto a esquisita paixão que sentia por Burgundy, contei todo o resto numa empolgação que eu não tinha há muito tempo, deixando a Phoebe risonha como nunca desde que ela nos dera a notícia de que estava se divorciando: - Então você e as suas amigas vão contar a história dos cinco da KVWN? Eu imagino que vocês devem ter muita gente para entrevistar e devem ter encontrado muita coisa interessante sobre eles, não?
- Sim, porém, o que mais me intriga é qual teria sido a razão deles terem sumido assim - falei profundamente pensativa.
- Quem sabe fazendo esse trabalho, vocês não descubram algo sobre isso, pode haver alguma testemunha que não tenha sido ouvida naquela época - disse Phoebe me olhando.
Eu tinha esquecido que Phoebe era detetive da Homicídios de Phoenix, agora transferida para San Diego, e conseqüentemente entendia tudo sobre isso, inclusive pensei em pedir ajuda para ela, pois quem sabe, com isso, eu e meu grupo de trabalho poderíamos desvendar o grande mistério de San Diego dos últimos quarenta anos: o desaparecimento de Ron Burgundy e sua equipe.
- Mas tem uma outra coisa Phoebe: e se a verdade for pior do que San Diego pensa? - perguntei em um impulso.
- A vida é feita de coisas boas e ruins Maddie, aprenda isso enquanto você é nova pra não sofrer demais no futuro - respondeu Phoebe se baseando na própria experiência de ter sido casada com alguém que ela praticamente não conhecia até descobrir ser traída e se divorciar.
Pensei muito no que Phoebe disse enquanto subia junto com ela ao antigo quarto que era dela antes de ir morar no Arizona. Entramos no quarto e começamos a desfazer as malas dela, sendo aí que percebi que já eram 6h10min da manhã, faltando 40 minutos para papai e mamãe acordarem.
Sorrindo como nunca, combinei com a Phoebe de fazermos uma surpresa aos nossos pais e juntas, fizemos um lindo café da manhã, conseqüentemente deixando a cozinha consideravelmente bagunçada e tendo que limpá-la faltando sete minutos para nossos pais acordarem.
Rápidas como sempre éramos embora nossa diferença de idade fosse 15 anos, deixamos a cozinha limpa e sentamos à mesa esperando nossos pais e quando eles desceram, nos vendo sentadas juntas à mesa, comemoraram como loucos o retorno antecipado da Phoebe e a abraçaram como se tivessem ficado sem vê-la mais de séculos, embora ela sempre viesse todos os verões com o ex-marido para a nossa casa e telefonasse com uma freqüência de quatro dias.
Sorrindo mais ainda depois que ela explicou o motivo do retorno antecipado, nossos pais e nós duas tomamos café todos juntos, comemorando aos risos e matação de saudade a reunião da família.
Mamãe foi ajudar Phoebe a arrumar as coisas dela de volta no antigo quarto que ela ocupava enquanto papai dizia para eu ir me vestir de uma vez, senão eu ia me atrasar para a escola.
Subi correndo e me vesti mais rapidamente ainda, arrumando minhas coisas na bolsa, porque na noite anterior eu tinha esquecido de fazê-lo, descendo uns 10 minutos depois de ter subido, mas não sem antes conferir se estava tudo certo e não faltando nada.
Nada faltando e tudo certo, eu desci e fiquei esperando papai ficar pronto para me levar à escola, mas, quando menos esperava, escutei um ronco seguido de uma buzina que eu sabia muito bem de onde vinha: a picape do chefe Roarke, que o sobrinho dele, o Tyrrell, usava para levar a Isabella, prima dele e filha do chefe de polícia da cidade, para a escola.
Saí e escutei aquele típico sotaque nova-iorquino dele: - Quer vir com a gente hoje, Maddie?
Olhei para dentro e vi que meu pai descia, imediatamente perguntando a ele se eu podia ir com o Tyrrell e a Bella e recebendo uma resposta positiva, desde que o Barnabas Collins de cabelo espetado não acelerasse demais o carro, pois embora ele dirigisse melhor que muitos motoristas veteranos, ele era rápido demais e isso sempre fazia o chefe Roarke ter inúmeras queixas dele.
Saí para a calçada e entrei na picape sorrindo e cumprimentando, depois perguntando como eles estavam:
- Como sempre, eu tô bem, só que o tio Roarke vive dizendo que eu ainda vou pagar multa - respondeu aos risos o Tyrrell.
- O papai não tem tempo nem pra resolver todos os mil casos que chegam no departamento por dia, vai ter tempo de te dar uma multa, Collins? Além disso, ele nem guarda de trânsito é! - respondeu a Isabella, vulgarmente Bella, aos risos, se referindo ao fato do pai dela, chefe da polícia de San Diego, quase sempre estar lotado de incontáveis queixas e ao apelido que meu pai e o professor de matemática tinham posto no Tyrrell por acharem ele parecido com um ator chamado Jonathan Frid, que eu sabia ter feito papel de um vampiro chamado Barnabas Collins em uma série chamada Dark Shadows.
- Pô Bella, até você anda agora encasquetando com esse apelido em cima de mim? - perguntou o Tyrrell dando partida no carro danado da vida porque detestava o apelido.
Nada falei enquanto os dois iam discutindo pelo caminho sobre Tyrrell ser ou não parecido com Jonathan Frid, ainda que eu não imaginasse como uma discussão daquelas podia durar 15 minutos, o tempo que eu levava para chegar à escola de carro.
Quando chegamos na escola, os dois se calaram vendo que eu já estava olhando com cara estranha e cada um seguiu seu caminho depois que nós trocamos “bom dia” e “ótima aula pra você” e a Bella dando um beliscão na bunda do primo sem que ninguém notasse e deixando ele ainda mais danado da vida do que já estava, embora eu tivesse notado, ainda que discretamente e finalmente, descoberto a razão de todo mundo viver dizendo que o Tyrrell e a Bella eram namorados apesar de serem primos - irmãos: ela era louca de amores pelo primo, pois vivia praticamente amarrada nele, já que eles sempre estavam juntos, fosse onde fosse e como.
Jurei para mim mesma que não contaria aquilo a ninguém antes que o Tyrrell me abordasse no maior constrangimento, percebendo que eu tinha visto Bella beliscando onde não devia: - Você não vai dizer isso a alguém vai?
- O que você e a Bella fazem ou deixam de fazer não é problema meu, eu só temo que o chefe Roarke descubra e isso dê confusão, pois vocês são parentes - respondi deixando muito claro na minha expressão que nada diria sobre o episódio de mão boba quase explícita que eu havia testemunhado.
Segui silenciosamente junto com o Tyrrell para a aula de espanhol e ao chegar na sala, fiquei sabendo que o professor Ramirez tinha ficado doente e não viria, o que nos deixaria sem aula até o terceiro período, fato comemorado ruidosamente pela minha turma inteira, considerada “o reduto dos esquisitos” do terceiro ano da Escola Santa Clara de Assis de San Diego, porque a maioria da minha sala tinha alguma “esquisitice”, ao menos no conceito das detestáveis líderes de torcida.
Sentei com Pippa, Imy e Tracy enquanto o Tyrrell foi sozinho para o canto dele, onde ninguém se atrevia a incomodá-lo, sob risco de tomar um belo nocaute do melhor e mais forte boxeador da escola.
- E aí Maddie, que horas você e as garotas se reúnem comigo lá em casa? - perguntou a Pippa na maior animação, anunciando que o treinador Hooken se encontraria hoje em casa de folga e nos daria a entrevista para o trabalho de História.
- Por mim, todo mundo podia seguir direto pra sua casa depois do término da aula, mas primeiro vou ligar pro papai avisando, porque ontem eu esqueci e deu confusão - respondi muito alegre.
A Imy e a Tracy concordaram dizendo que também avisariam aos pais e depois ficamos jogando conversa fora durante quase meia hora até que o Joe chegou e correu para perto da gente perguntando de imediato se podia fazer parte do nosso grupo.
- Desde que você não se escore na gente pra ganhar nota de graça, concordamos - disse a Imy, que desde a oitava série não ia com a lata do Joe.
Joe fez cara de quem não gostou do que ouviu e respondeu quase à queima roupa, chamando a Imy pelo nome:
- Meu pai conheceu a equipe da KVWN e ele conhece muita gente, mas muita gente mesmo, que conviveu com eles, Imoghen, então, se eu for aceito no grupo, todo mundo aqui vai tirar um 10 do tamanho do planeta Terra.
Tracy olhou por um minuto e alguma coisa e disse: - O Dr. Larkin realmente pode colaborar muito pro nosso trabalho, então, não tem problema se a gente aceitar o Joe no grupo.
- Juntando a entrevista que vamos fazer hoje com o tio Hooken e mais o depoimento do Dr. Alan, nossa, se nosso trabalho levar menos de 10 vai ser cisma da nariguda Minnie - disse a Pippa chamando a professora pelo apelido que a escola inteira tinha posto na Senhora Potter em razão do enorme nariz dela e da personagem do desenho Pica-Pau.
- Ela tem cisma com todo mundo, até com quem é quieto que nem o Barnabas Collins - falou o Joe em voz baixinha, pois não tinha sido apenas uma vez que ele quase apanhou do Tyrrell por dizer o que não devia e ele ter ouvido.
- Você realmente pede pra tomar porrada Joe - falou Tracy, que detestava quando alguém ficava de cisma por qualquer razão.
Resolvida a parte do novo membro do nosso grupo de trabalho, ficamos reunindo as informações até o momento conseguidas e ficamos comentando de algumas coisas contadas pelo Harken, inclusive boatos sobre um tórrido romance gay entre Brian Fantana e Brick Tamland, o que fez Joe rir até doer o estômago.
- Cara, não consigo imaginar esses dois se pegando é nunca! - o Joe ria até ficar vermelho e sem ar.
Imy fez a maior cara de nojo imaginando enquanto eu, a Pippa e a Tracy nos entreolhamos devido ao vexame que passávamos porque o Joe ria pior e mais alto que o Coringa do Batman.
Depois que passamos dois períodos sem aula, tivemos matemática financeira com a professora Gallagher, mais conhecida como “Cabeça de Fogo”, porque além de ser muito ruiva, era esquentada igual uma brasa.
Passado o terceiro período, fomos para o intervalo e ficamos conversando todo o tempo, inclusive na fila para pegar o lanche, onde encontramos o Emmett, atacante do time de futebol e ele como sempre, fazia elogios a mim, a Pippa e a Imy, mas quando viu a Tracy, só faltou disparar da fila sem pegar nada, mas como não queria ficar sem lanche, digamos que “se agüentou”.
Depois que ele saiu da fila, Tracy perguntou meio triste: - Ele ainda...?
Ficamos sem saber o que responder, embora a escola inteira soubesse o porquê do Emmett agir daquele jeito: dois meses atrás um acidente aconteceu no depósito de material esportivo, que não tinha sido esclarecido até o momento, apesar de um monte de depoimentos terem apontado Tracy como pivô do acidente, pois o imbecil atacante do time tinha feito uma aposta com os amigos que conseguiria agarrá-la à força e depois contar para todo mundo, para a escola inteira caçoar mais ainda dela.
Porém, quando ela se desvencilhou dando um chute daqueles na canela dele, um taco de beisebol voou do fundo do vestiário até atingir em cheio a cabeça do Emmett, que por milagre não sofrera nenhuma seqüela, embora ele tenha ficado internado no hospital devido ao impacto da batida.
- Ninguém mandou ele tentar aquilo com você Tracy, bem feito pra ele - disse a Pippa, que odiava o Emmett desde que ele tinha feito uma brincadeira de mau gosto que ele tinha feito com ela na formatura do ensino fundamental.
Olhamos a Pippa quando Tracy limpou uma lágrima do rosto, porque apesar de ter quase sido vítima de uma chacota do Emmett, ela foi a primeira a gritar feito desesperada quando viu ele caído no chão desacordado e chamar o resgate para levá-lo ao hospital.
Percebemos que ele viu a cena porque ele parou no meio do refeitório e se voltou até a gente, que já ia para a mesa e quando terminamos de sentar, ele se sentou e disse:
- Acho que está na hora de eu enfrentar o que estou sentindo e espero que você já tenha me perdoado por aquela coisa que eu quis te fazer e fique sabendo que eu agradeço por você ter me ajudado, embora eu ultimamente tenha agido como um idiota.
- Idiota você já é desde que nasceu - disse a Pippa, levando de mim em seguida uma boa cutucada para ficar quieta.
Emmett olhou a Pippa por alguns segundos e a ignorou, sendo que eu esperava que ele mandasse a “gorda” calar a boca e percebendo que realmente ele estava bem mudado desde o “acidente” que poderia tê-lo matado.
- Sabe Tracy, não é que eu tenha medo de me aproximar, o que eu tenho medo mesmo é do Champ Kind querer me matar como tentou fazer com a ex-líder de torcida Trish, por isso eu preferi me afastar, porque sei que ele é seu anjo da guarda, embora ele tenha a aparência mais sinistra que eu já vi na minha vida toda - Emmett terminou a frase gaguejando e com as mãos trêmulas.
Tracy, Pippa, Imy, Joe e eu olhamos Emmett com espanto, especialmente a Tracy, ficando bastante brava e ele disse, pálido como nunca: - Eu imaginava que você ia querer me matar depois dessa, mas eu precisava falar, isso estava preso na minha garganta.
Ao invés de ficar ainda mais danada da vida, Tracy perguntou: - Como assim?
- Certamente você vai dizer que foi uma alucinação e que elas podem ser reais até um pouco demais, mas eu garanto: eu vi a cara dele, senti os dedos gelados dele agarrando o meu pescoço e ainda o ouvi me ameaçando de morte se eu me aproximasse de você de novo e o pior de tudo é que o cara parecia o Barnabas Collins furioso por conta do tamanho daqueles caninos! - disse o Emmett apavorado, como se tivesse acabado de acordar de um longo pesadelo.
- Dedos gelados? Até onde eu sei anjos não são seres muito corpóreos - falou Imy olhando o Emmett como se ele tivesse ficado doido de pedra.
- Caninos grandes? - Joe olhou Emmett e de repente ficou numa espiral de pensamento, até que falou: - Você tá dizendo que o Champ Kind é um...?
- Sinceramente, eu não sei se foi coisa da minha cabeça que pareceu demasiadamente real, porém, que eu fiquei morto de medo, isso com certeza! - Emmett parecia uma criança com todo aquele medo.
- Você e o Joe ficaram doidos, essa coisa de vampiro não existe - disse a Pippa olhando os dois como se eles fossem idiotas e compreendendo o raciocínio silencioso do Joe.
- Por acaso tem explicação melhor Pippa? - perguntou Joe e eu percebi que ia começar uma discussão na mesa, já que eu sabia que ela ia acusar o Emmett de usar drogas ou coisa parecida e ele ia defender o amigo atacante certamente xingando a Pippa e ela ia voar em cima do Joe.
- Vocês dois não comecem antes que todo mundo vá parar na diretoria por briga e todos nós sabemos que o diretor Petrarchus não é moleza quando pune quem faz o que não deve - falei, deixando muito claro que era melhor eles se calarem antes que piorasse.
Os dois calaram e ficaram trocando olhares cheios de chispas de ódio enquanto Emmett parava de tremer e pedia mil desculpas para Tracy, que sorria dizendo que já havia esquecido tudo e que eles poderiam ser amigos, embora ela não tivesse acreditado em uma única palavra que ele tinha dito em relação à tacada que tinha tomado na cabeça, mas achava melhor não dizer nada sob risco de polemizar ainda mais.
Terminado o intervalo e conseqüentemente a aula devido ao aniversário de San Diego, ligaria para o papai avisando que iria à casa da Pippa e almoçaria lá porque tínhamos que continuar o trabalho, porém, lembrei que era o dia das compras do mês, que tinham ficado sob minha responsabilidade desde que tínhamos descoberto a doença de Parkinson na mamãe.
Mandei uma mensagem pelo celular para Tracy, Pippa, Imy e Joe avisando que eu chegaria na casa da Piper por último, por conta de ser a responsável por suprir a casa de comida pelos próximos 30 dias e fui voando pegar o ônibus até o mercado onde eu fazia as compras, chegando lá depois de dez minutos e descendo na parada que ficava do outro lado do mercado, esperando que o semáforo fechasse logo, já que o movimento dos carros naquela via era inacreditável até mesmo para uma cidade do porte de San Diego.
Fechado o semáforo, eu precisava ser rápida, já que o tamanho da pista era seis vezes a calçada e o costume era o sinal abrir muito rápido, fazendo todo mundo que circulava ali esperar mais tempo para atravessar a rua por completo.
Eu, apressada, procurei ir mais rápido que pudesse e quando terminava de atravessar a segunda parte da rua, percebi que algo caiu da minha bolsa e me abaixei para juntar, quando ouvi um som guinchado que parecia alguma coisa fora de controle vindo a alguns metros, senti algo ou alguém me empurrando e de relance, vendo algo acontecer, embora eu não estivesse entendendo muito bem, além de escutar um impacto que me doeu no ouvido seguido de uma voz masculina incrivelmente familiar:
- Não te ensinaram que se confere as coisas antes de carregá-las e que é perigoso parar no meio de uma via movimentada, garota?
Olhei para cima e quase desmaiei quando vi quem havia salvado minha vida: uma cópia perfeita e fidelíssima de Ron Burgundy, tanto no corpo como no rosto, além da voz igualmente linda e musical, porém, quase apaguei mesmo quando vi a frente do caminhão, amassada de tal forma como se alguma coisa tivesse o feito parar à força.
- Foi burrice minha, desculpa se eu causei algum tipo de problema ao senhor - gaguejei a frase inteira de tão nervosa que eu estava e percebendo a burrada que por pouco não me fez ser esmagada por toneladas de metal: a bolsa estava com a metade do fecho aberto.
- Pra mim você não causou nada, mas por muito pouco essa caminhonete não te transformou em pizza devido à sua falta de prudência com as regras de trânsito - disse ele me olhando e começando a se distanciar sem dizer nada como se eu tivesse despertado algum tipo de asco nele.
Não consegui dizer mais nada, sequer perguntar como ele se chamava enquanto ele se afastava até ficar longe do meu campo de visão, quando vi uma equipe de resgate chegando para levar eu e o motorista imprudente que sangrava muito por ter dado de cara no pára-brisa do carro devido ao impacto e levantei sentindo uma imensa dor no rosto, porque só naquele momento percebi que bati de cara no chão ao ser empurrada pelo meu herói.
Já estava em um leito no hospital há pelo menos uma hora, quando chegou ninguém menos que o famoso e bondoso Dr. Larkin, pai do Joe e claro, todo o meu grupo de trabalho, certamente avisado por ele que eu tinha sofrido um “pequeno acidente” e apavorado, perguntando umas mil vezes como eu estava ou se não tinha quebrado algum osso.
- Maddie está bem, apenas com dor no rosto por ter caído na calçada quando um alguém misterioso a salvou, segundo depoimento de uma testemunha - respondeu o médico Alan na tentativa de acalmar o filho e minhas três amigas.
Foi quando o acontecido veio como um filme na minha cabeça, me deixando apavorada: o carro parou a pouca distância de mim devido a um corpo grande e forte, usando um par de ombros firmes, ter criado um amassado daqueles na frente do caminhão e certamente eram do “fantasma de Ron Burgundy”, que tinha me salvado de morrer esmagada contra um Volvo estacionado próximo de mim e o que me apavorava era que eu não o tinha visto antes de tudo aquilo ocorrer.
A sensação de que eu era Bella Swan sendo salva pela primeira vez por Edward Cullen era certa, porém, aquele era mais lindo, mais perfeito e mais forte, um deus grego que parecia ter caído do Monte Olimpo para me salvar.
Eu tinha a sorte de ter ficado viva, além de Alan não ter avisado aos meus pais do acidente, pois minha mãe tinha sérias crises de Parkinson quando ficava nervosa demais, mas claro que ele avisou a Phoebe, que chegou louca de vontade de encher o imprudente motorista de porrada, mas sendo acalmada pelo Dr. Larkin, que dizia que eu estava bem.
- Esse louco podia ter matado a Maddie! - exclamava a Phoebe repetidamente.
- Exceto pela dor no rosto, estou bem Phoebe - respondi mesmo sabendo que não podia, porque o Dr. Alan me recomendou o máximo de repouso e falar o mínimo possível.
Phoebe disse aos outros que a parte escrita do trabalho ia ficar para amanhã porque eu precisava descansar, afinal aquele acidente havia sido feio, e me levou para casa.
Quando chegamos em casa, Phoebe me perguntou como eu podia ter feito a burrice de me abaixar no meio da rua para recolher uma coisa caída da bolsa.
- Eu sei que não devia ter feito isso, mas você sabe como detesto perder qualquer coisa, ainda mais agora que tivemos que cortar várias despesas porque a mamãe sofre de Parkinson - respondi embora eu soubesse que nada justificava minha imprudência.
- Eu te entendo Maddie, realmente entendo seu motivo, porém, ele não justifica o que você fez, então, eu vou passar a alongar o meu caminho para o departamento pra te levar à escola, afinal, eu não te quero metida em encrenca e também garantir que você não cometa outra burrice - disse a Phoebe, me deixando desanimada, porém, eu compreendia, afinal, ela queria minha segurança mais que tudo e eu não podia simplesmente esquecer que o fato de eu ter quase morrido também tinha sido culpa minha.
Subi para meu quarto depois de conversar com a Phoebe e tranquei a porta porque naquela hora não queria ninguém me incomodando, querendo ficar sozinha para reordenar meus pensamentos, porque até ali a minha cabeça rodava mais que o planeta Terra, especialmente por eu não conseguir parar um só minuto de pensar naquele amor inalcançável que sentia por Ron Burgundy.
Me joguei na cama com um desânimo que não sentia desde muito tempo e praticamente dormi, tamanho o cansaço psíquico que sentia, embora eu não estivesse cansada fisicamente.
De repente, ouvi alguém chamando meu nome de uma forma bela e delicada, me acordando e fazendo com que eu andasse em direção à origem daquele som, que era em algum lugar onde talvez minhas pernas não pudessem me levar, mas, por alguma razão desconhecida, não parei de andar até chegar a uma antiga casa que ficava muito longe de onde eu estava antes.
A porta velha e grande em madeira trabalhada se abriu sem que eu precisasse tocá-la, me permitindo entrar e subir até a origem daquele som lindo e delicado, um quarto exatamente igual ao do clipe “Afternoon Delight”, do filme “O âncora”, onde ninguém menos que Ron Burgundy me esperava: - Bem - vinda, Maddie.
Me aproximei sorrindo e em absoluto silêncio, porque nenhuma palavra caberia em momento tão sublime como aquele, onde finalmente eu recebia um beijo verdadeiro daquele que eu amava, além de um forte e protetor abraço, que me fez sentir a mais amada das garotas, quando, de repente, os outros quatro membros da equipe da KVWN e mais uns quantos homens e mulheres entraram e ficaram nos olhando, até que Brick, na altura de seu descomunal tamanho, disse a Ron sorrindo da forma mais sinistra e assustadora que eu já tinha visto:
- A partir dessa noite ela nos pertencerá e o mesmo será com todos aqueles que estiverem próximos dela.
Ouvindo aquela frase, tudo de repente ficou escuro e de alguma forma me dei conta do que estava acontecendo e mais que qualquer coisa desejei fugir, porém, uma dor inacreditável tomou conta de mim, seguida de um grito desesperado.
Seguido daquele grito, dei um inacreditável pulo na cama, descobrindo que tudo não tinha passado de um pesadelo dos mais terríveis e reais que eu já tinha tido.
Quando olhei o relógio do celular, vi que tinham se passado duas horas desde que eu havia me atirado na cama e uma mensagem do Joe dizendo que a parte escrita do trabalho tinha sido concluída, a entrevista com o treinador tinha sido feita e que ambas as coisas estavam no meu e-mail para que eu visse e enviasse a professora Potter e que amanhã, durante o intervalo da aula, iríamos organizar quem iria apresentar o que do trabalho e depois da aula, todo mundo iria pra casa da Tracy ensaiar a apresentação.
Respondi dizendo que estava tudo bem e que eu não me atrasaria para depois da aula, indo logo depois para o computador ver meu e-mail, pegar o que Joe disse que tinha enviado e ver como tinha ficado.
Embora eu estivesse perfeitamente acordada e soubesse que um pesadelo era apenas um pesadelo, eu me perguntava por que justamente com aquilo eu havia sonhado e mais uma pergunta se fez na minha cabeça: será que o meu pesadelo dizia alguma coisa sobre o desaparecimento dos cinco da KVWN da qual eu ainda não tinha me dado conta?
quinta-feira, 14 de maio de 2009
Bloody Mary - Capítulo 1: Trabalho de Escola
Aquele deveria ser apenas mais um dia chato de aulas na escola onde eu estudava em San Diego, Califórnia, onde eu acordei incrivelmente mais cedo do que de costume para sair e comprar um presente para minha irmã Phoebe, que estava, voltando para casa de Phoenix, no Arizona, depois de se divorciar do marido, com quem ela foi casada por cinco anos e meio.
Realmente, esse dia não seria dos melhores, principalmente porque eu teria aula com a Senhora Potter, a professora de história que sugava nossa energia a cada aula, tamanha a exigência dela em relação à minha turma e principalmente a mim, a Piper, que todo mundo chamava de Pippa, e a Imoghen, mais conhecida como Imy, as garotas que sentavam comigo e minhas amigas desde que me lembro por gente.
Depois de comprar um vestido de verão verde água para Phoebe, eu segui direito para a escola, aonde cheguei atrasada porque perdi o ônibus do horário que normalmente eu pegava.
- Madeline! - ouvi a voz estridente e alta da professora Potter enquanto tentava entrar sem ser notada e conseqüentemente tomar uma advertência por atraso.
- A Phoebe, minha mana mais velha, está voltando do Arizona, então fui comprar um presente pra ela, só que quando saí da loja pra pegar meu ônibus, me dei conta que ele já tinha passado, por isso eu me atrasei - expliquei mostrando o pacote de presente vermelho com laço dourado, na tentativa da Senhora Potter não me dar uma bronca daquelas.
Mrs. Potter ficou olhando por um minuto e me respondeu: - Tudo bem Maddie, por hoje passa, afinal não é todo o dia que uma pessoa que gostamos volta depois de anos para casa, mas da próxima, você leva advertência, afinal é a segunda vez que a senhorita se atrasa para a minha aula.
Eu sentei danada da vida, querendo que a aula de história passasse voando e eu pudesse ir logo para o vestiário me vestir para a educação física, só que a professora, com aquela voz irritante, parecia fazer questão de deixar todo mundo totalmente sem entusiasmo para nada e, para a situação piorar ainda mais, resolveu nos dar um trabalho enorme para fazer durante a semana em que se comemorava o aniversário da cidade, quando todo mundo saía dois períodos mais cedo da aula.
- Alunos, como vocês devem saber, essa semana se comemora o aniversário da nossa adorada San Diego, então eu acho que seria uma boa chance de pedir a vocês que mostrem o que conhecem da nossa cidade de uma forma bem criativa e diferente, podendo pesquisar histórias de antigamente, fatos mais recentes, pessoas célebres e tantas outras opções de trabalho - disse Senhora Potter, completando que o trabalho devia ter dados de identificação e bibliografia, coisa que todo mundo sabia de cor, só que o conteúdo entre eles era quase uma monografia universitária devido à quantidade de coisas que ela pedia, que não cabiam em poucas folhas.
Então, logo de cara me sentei com a Pippa e a Imy, disposta a fazer o melhor, e preferencialmente o menor, trabalho que fosse possível, só que como nenhuma de nós queria fazer algo no lugar comum, praticamente não tínhamos idéia de que caminho tomar para não tomar uma bomba na nota de História ao mesmo tempo em que desejávamos que a Senhora Potter não tivesse nascido.
Quando a aula de História terminou, nos trocamos no vestiário próximo da sala e fomos para a educação física, onde mais uma vez a Pippa atraiu a atenção de todos garotos e do professor Romany por causa do curto do short e da camiseta baby look que deixava em destaque os enormes seios dela, que conseguiam a façanha de tapar meio gol na hora do futebol, onde ela era a goleira do time, enquanto eu e a Imy jogávamos vôlei e tomávamos algumas boladas porque não exatamente éramos grandes jogadoras.
Depois de cinqüenta minutos, a aula acabou e íamos para minha casa almoçar, como sempre fazíamos uma vez por semana, porém, antes que déssemos um passo fora da escola, fomos abordadas por Tracy Turnblad, da qual a maioria da turma fazia chacota por causa dos quilos a mais, não de gordura, mas de músculo, porque ela lutava boxe tailandês, que pelo que eu sabia da minha mãe contando sobre o tempo em que ficou no Canal Quatro KVWN, era um esporte que o comentarista esportivo da emissora praticava.
- Garotas, eu estou sem grupo pro trabalho, será que posso trabalhar com vocês? - ela perguntou dando aquele sorriso meio brejeiro que era típico das garotas do Texas.
Pippa, Imy e eu nos olhamos por um minuto e como simpatizávamos um bocado com a Tracy, concordamos, o que deixou ela feliz demais e nos dando inúmeros obrigadas durante todo o caminho até a minha casa, já que eu a convidei para almoçar com a gente.
Minha casa, o local mais movimentado de todo o bairro onde eu moro, já que minha mãe recebe visitas todo o santo dia, seja a das mulheres com quem ela toma chá no Clube de Tênis da cidade ou dos ativistas contra a segregação racial com quem o papai trabalha desde que a Phoebe nasceu e que eu me conheço por gente.
Tracy olhou impressionada a minha casa, comentando que mamãe tinha um gosto bem inusitado para decoração, me deixando louca de vergonha, já que a foto do âncora Ron Burgundy e sua equipe formada por mais três homens e uma loira tapava boa parte da parede da sala, porém, compreendi a razão do comentário dela quando uma lágrima saiu dos olhos dela olhando o loiro musculoso e de chapéu cowboy da foto, cujo nome era Champ Kind até onde eu sabia sobre aquele cartaz de gosto duvidoso.
- O que foi, pequena Tracy? - minha mãe Ronica perguntou ao ver que ela estava emocionada.
Foi quando meu pai Charlie, carregando as travessas do almoço, se meteu no meio da conversa, reconhecendo de cara a Tracy: - É a filha daquela sua companheira de chá, a Edna Turnblad! Caramba, mas essa menina é igual à Edna, só que mais forte e com franjinha! - e se referindo a franja que combinava direitinho com o corte de cabelo dela, um comprido moderno de cor escura.
Eu, a Imy e a Pippa ficamos nos olhando atônitas quando a Tracy, sorrindo, nos disse que era sobrinha de Champ Kind, que a mãe dela era irmã caçula dele, tendo 16 anos quando o comentarista esportivo do Canal Quatro sumiu em 1977.
- Sabe que até hoje essa história me intriga demais? - disse meu pai em tom de dúvida e completando em seguida: - Cadê aquele quinteto, que fim será que eles tiveram?
- Infelizmente isso ficou sem resolução até hoje, há quem acredite que eles foram assassinados, outros crêem que cada um seguiu seu rumo por lugares desconhecidos, outros acreditam que o Bloody Mary os engoliu e por aí vai - disse minha mãe como se aquela penúltima parte fizesse algum sentido, já que eu não acreditava em lendas urbanas, embora aquela fosse a mais famosa da cidade.
Foi quando a Pippa dirigiu a mim, a Imy e a Tracy aquele olhar abrilhantado de quem estava tendo uma idéia, porém, quando ela resolvia ter alguma, era sempre sinal de muitos problemas, pois não tinha sido apenas uma vez que eu e Imy tínhamos nos metido em encrenca por conta das idéias mirabolantes que ela vivia tendo e claro, tomado algumas bombas em trabalhos.
- Por favor, Pippa, outra das suas idéias malucas não! Você já nos meteu em problemas suficientes por conta da sua “criatividade”! - exclamei, já muito p da vida por conta da vergonha que passava devido a foto que mamãe tinha posto na sala à vista de todo mundo.
Mas a Pippa não desistia nem comigo furiosa: - Dessa vez eu prometo não meter ninguém em problemas, na verdade o nosso trabalho está bem naquela parede - ela disse isso apontando o cartaz que ocupava parte da parede da sala.
- Tá Pippa, Ron Burgundy e sua equipe de jornalismo, o que isso tem de tremendamente interessante? - disse a Imy quando conseguia ser o máximo de desagradável que podia.
- O tio Hooken conheceu todos eles, a mãe da lindinha da Tracy é irmã do Champ Kind e a dona Ronica trabalhou na sede do Canal Quatro por seis anos, além de que Burgundy foi o maior âncora que essa cidade teve nos anos 60 e 70, contando com uma equipe de apoio das boas, o que mais vocês querem? Se pesquisarmos nas fontes certas, o nosso trabalho vai ser o melhor que aquela professora magrelona e nariguda já viu! - exclamou a Pippa na maior alegria que ela irradiava quando conseguia que os peitos dela não quase pulassem fora do decote da blusa.
Franklin Hooken era o treinador do time de futebol americano da escola onde eu estudava e tio da Pippa, com quem ela tinha vindo morar por conta da casa dele ser apenas cinco quarteirões do colégio e pelo fato dela ter um amor platônico pelo tio, um cara enorme e forte que era uma flor de tão gentil apesar de se parecer com o antipático presidente da WWE, Mr. McMahon e, além disso, tinha 54 anos de idade, aparentando ser mais jovem que sua idade.
- Ah sim, o treinador do time de futebol, uma vez eu ouvi ele comentar com os meninos do time sobre o exemplo que o tio Champ gostava de dar às pessoas! - exclamou a Tracy, que pela expressão facial, tinha amado a idéia da Pippa para o nosso trabalho e em seguida disse surpresa: - Então o treinador Hooken é seu tio? Nossa!
Pippa sorriu suspirando: - Sim, o tio mais maravilhoso que uma sobrinha pode ter!
Imy pensou durante um minuto e meio e depois disse: - No fim acho que pode dar certo, não custa nada.
- Eu concordo já que todas concordam, além do mais, a idéia não é de toda ruim e eu sinceramente espero que nossa nota seja boa - falei enquanto tentava esconder que estava encantada com a beleza loura, européia e gélida de Champ Kind e o ruivo acobreado dos cabelos e o olhar incrivelmente sensual de Ron Burgundy, coisas nas quais eu não tinha reparado antes da Tracy “me acordar”.
As garotas repararam que eu não tirava os olhos do cartaz e me cutucaram, pois o papai já tinha ajudado a mamãe a servir o almoço e eles nos chamavam para sentar.
Sentamos e comemos a incrível lasanha de calabresa e frango feita pela mamãe ao mesmo tempo em que morríamos de rir das piadas do papai e nos emocionávamos com as histórias da mamãe.
Depois de mais ou menos uma hora, subimos correndo ao meu quarto para pesquisar mais no meu computador, de última geração e recentemente comprado pelo papai, sobre a equipe do Canal Quatro KVWN: Ron Burgundy, Charlie Antonius McKeller Kind (Champ Kind), Brick Tamland, Brian Petrarchus (Brian Fantana) e Veronica Corningstone, a única mulher da equipe, uma loira de cara muito séria, porém, incríveis olhos verdes que cintilavam.
Gargalhávamos no quarto lendo algumas das anedotas do grupo e algumas histórias envolvendo uma legítima guerra dos sexos no horário nobre ao vivo e a cores ao mesmo tempo em que outras nos comoviam ou nos indignavam, já que o machismo daquela época era um absoluto absurdo.
Salvamos todo o tipo de informação que pudemos até as três e tanto da tarde, quando a Pippa propôs que fizéssemos entrevistas com a minha mãe, a da Tracy e o tio dela, além de irmos à sede da emissora, já que estava tendo uma exposição homenageando a célebre equipe que era ainda considerada uma das grandes equipes de jornalismo da América, mesmo que os quatro homens fossem um bando de chauvinistas, coisa da qual a Tracy discordou quase aos berros no caso de Champ Kind, pois ela dizia que a mãe dela falava que ele era íntegro e dono de um bom coração.
Concordamos para não começar uma discussão, pois logo notamos que ela, apesar da cara de menina calma, tinha uma voz de trovão que só ouvindo se acreditava e ela ficava zangada com uma tremenda facilidade, o que não nos dava outra opção a não ser assentirmos e ficarmos quietas.
Tratamos logo de pegar documentos e bolsas, pois iríamos primeiro à exposição na sede do Canal Quatro, porque, naquela tarde, a mamãe tinha ido fazer terapia, o treinador Hooken estava com o time da escola e a mãe da Tracy estava trabalhando, então resolvemos ir, só que para chegarmos, pegamos um ônibus que estava completamente lotado e passamos a viagem toda em pé, passando pelas situações mais chatas possíveis: o cobrador de olho nos peitos da Pippa, eu tendo que agüentar o fedor de um bêbado praticamente colado em mim e a Imy sendo espremida pelo corpanzil de 65 kg, distribuídos em 1,70 m, da Tracy.
Chegamos depois de quase vinte minutos dentro daquele coletivo sufocado e calorento e quando entramos no prédio de trinta andares, nos identificamos para o porteiro:
- Madeline McCormack, “Maddie”.
- Piper Hooken, “Pippa”.
- Imoghen Forest Green, “Imy” - ela se identificou vermelha feito pimenta, pois odiava o nome que tinha, razão pela qual todo mundo a chamava de Imy.
- Tracy Turnblad - ela sorriu se identificando e dizendo que era filha da irmã de Champ Kind.
O porteiro ficou nos olhando durante vários minutos, depois tirou os olhos dos peitos da Pippa, sorriu para Tracy e perguntou a Imy: - Você por acaso é uma cherokee?
- Eu sou filha de um - respondeu ela ajeitando a tiara no cabelo preto e ondulado, cuja cor ela havia herdado do pai, um legítimo índio cherokee e a ondulação da mãe, uma mulher branca da Louisiana chamada Lucy.
Entramos sem dizer mais nada, só que o porteiro veio atrás de mim e perguntou, meio que me reconhecendo: - Você não é filha caçula da dona Ronica McCormack, ex-funcionária daqui?
- Sim, sou eu, por quê? - perguntei rindo levemente e meio que imaginando o motivo da resposta, já que mamãe ainda tinha muitos amigos no antigo emprego, inclusive o diretor da emissora, Ed Harken.
- Ela sempre vem visitar o senhor Harken e fala que você tem sido a responsável pela casa desde que ela ficou doente - sorriu o porteiro.
Escutando aquilo, senti um aperto no peito, já que infelizmente minha mãe sofria do mal de Parkinson fazia um ano e todo o dia ela fazia tratamento e terapia ocupacional para controlar os sintomas, mas ela tinha dado uma sorte danada porque a doença tinha sido descoberta no estágio inicial, o que facilitava muito as coisas, pois ela tinha apenas 52 anos, jovem demais para padecer daquilo.
Sorri e disse obrigada, indo rapidamente até as garotas, já impacientes com a minha demora na portaria, para o elevador que nos levaria ao terceiro andar, onde a exposição acontecia e tomava mais dois andares da emissora.
Ao chegarmos no terceiro andar, ficamos assustadas devido às tantas coisas pessoais de cada um que havia ali, mas o que realmente nos deixou assustadas de cara foi uma foto de Brick Tamland participando de um campeonato americano de fisiculturismo usando apenas uma sunga dourada e sem o célebre óculos fundo de garrafa que o deixava com cara de paspalhão.
O rosto meio amorenado da Imy ficou vermelho igual uma pimenta, a Pippa deu um sorriso malicioso seguido de uma mordidela no lábio inferior, a Tracy virou o rosto para um lado e eu não conseguia segurar as risadas, porque a mistura de duas coisas tão incrivelmente opostas era bizarra.
- As senhoritas querem ver o que primeiro? - uma voz muito conhecida da minha audição ecoou na sala.
- Senhor Harken! - exclamei feliz da vida ao revê-lo depois que ele foi parar no hospital depois de um acidente doméstico.
- Madeline Smith! - exclamou ele vindo me abraçar e me chamando, apenas de pirraça e rindo, pelo apelido que os mais velhos que me conheciam tinham me posto por me acharem parecida com uma atriz e modelo da década de 70 que tinha feito alguns filmes da produtora inglesa Hammer e um filme do James Bond, sendo por isso que o time de futebol da escola me chamava de “Miss Caruso”, apelido que eu odiava.
As outras garotas riram enquanto eu o abraçava muito feliz e explicava o porquê da nossa ida ali e ele nos respondeu sorrindo:
- Fiquem felizes porque eu serei o guia de vocês nessa exposição! - disse ele muito feliz porque os organizadores da exposição tinham concordado que os visitantes deviam vir em grupos com hora marcada para evitar bagunça ou desordem, afinal ali tinha tantos objetos que era impossível andar ali sem bater em nada se estivesse lotado.
- Senhor Harken, será que tem como eu tirar uma cópia daquela foto maravilhosa do Brick Tamland? - perguntou a Pippa apontando a foto que tinha nos impressionado quando chegamos e nos matando de vergonha, especialmente a Tracy, que ainda estava vermelhona.
- Mocinha, eu não tenho como tirar uma cópia daquela foto, mas acho que posso permitir que tire uma foto com seu celular ou uma digital caso você tenha alguma das duas - disse Harken, pego de surpresa pelo inesperado pedido da Pippa.
Imediatamente, a Pippa tirou da bolsa uma máquina digital e a posicionou de modo que ela pegasse a foto inteira e deu um flash seguido de um gritinho agudo, o que fez a Tracy perguntar: - A Pippa é assim mesmo?
Imy respondeu antes que eu dissesse alguma coisa: - É Tracy, ela é chegadona em um cara musculoso.
Olhei e assenti enquanto eu pensava no que a Tracy pensaria da gente depois daquela, dando graças a Deus que não tivesse mais ninguém ali além de nós, senão o vexame seria maior ainda do que já era, mas no fim, ela aparentemente nem se importou muito com a conduta escandalosa da Pippa e sorria enquanto via as coisas pessoais de seu tio expostas ali, incluindo uma foto dele com a mãe dela, datada de 1976, um ano antes do desaparecimento dele.
Foi quando Harken viu a tal foto que Tracy olhava e a olhou melhor, ficando impressionado e mudo com a semelhança de Tracy com Edna, em seguida perguntando: - Por acaso você é da família Kind?
- Eu sou a filha de Edna Kind, meu nome é Tracy Turnblad - ela disse estendendo a mão para apertar a de Ed Harken e sorrindo.
O coração de Harken deu um pulo de tão impressionado que ele ficou com a semelhança de Tracy com a mãe, uma era o retrato da outra: - Meu Deus, se o Champ estivesse aqui, ficaria impressionado de como você e Edna se parecem!
- Obrigada, senhor Harken - disse Tracy sorrindo.
Durante o diálogo entre a Tracy e o Harken, eu notei que a porta de emergência do andar se fechou bruscamente e corri até lá com a certeza de que tinha alguém ali, mas quando abri novamente a porta, não havia viva alma, então pensei que podia ser o vento, porém, nas minhas narinas entrou um perfume muito estranho, uma mistura de água de lavanda com champanhe e existia o fato de que uma corrente de ar não fecharia uma porta daquele tamanho no terceiro andar de um prédio.
Fiquei muito assustada e fui rapidamente contar ao Harken o que tinha acontecido e ele imediatamente chamou a segurança do prédio para que eles vasculhassem, através do circuito interno de tv, o local todo em busca de algum invasor, porém, vasculhando todos os andares, inclusive as saídas de emergência, não acharam ninguém suspeito, sequer uma sombra.
O meu coração pulou no peito depois disso, me deixando um monte de dúvidas, inclusive de que podia haver alguma assombração naquele lugar, porém, logo espantei essa idéia, afinal de contas fantasmas eram coisas de mitologia e filme de terror.
Passado o susto, começamos a andar pela exposição guiadas por Harken, que nos mostrava os mais variados objetos de cada membro da equipe, inclusive um conjunto de sutiã e calcinha cravejados de brilhantes que pertencera a Veronica Corningstone.
- Nossa, olha o tamanho desse sutiã, os peitos dela deviam ser enormes, não é tio? - perguntou a Pippa com espanto quando viu que o sutiã era 44.
- Acho difícil alguma mulher nesse país ter os seios do tamanho dos seus Pippa, nem a Dolly Parton, com todo o silicone que ela tem, conseguiu superar a sua marca! - falou a Imy rindo muito.
- Às vezes eu odeio ter peitos tão grandes, porque comprar blusas e vestidos, na maior parte das vezes, é a missão mais impossível que eu tenho, pois nenhuma me serve e quase sempre eu tenho que ir às lojas de tamanhos de gente gorda! - disse Pippa p da vida.
Harken, rindo um pouco, disse, naquele tom paternal que caracterizava o jeito de conversar dele: - Cada um convive com o que Deus deu, Imoghen, então, ninguém devia fazer comentários como os seus e Pippa, ser gordo não é crime, portanto não fale dessa forma.
A Imy e a Pippa ficaram tão vermelhas que eu achei que elas soltariam fumaça pelos ouvidos ao mesmo tempo em que eu, Tracy e Harken dávamos gargalhadas da reação delas.
Depois de alguns minutos apenas olhando objetos pessoais e fotos de bastidores, nós quatro paramos diante de quatro fotos grandes de cada um dos cinco membros da equipe, fotos realmente lindas, mas a mais de todas elas certamente era de Ron Burgundy, que de “O âncora - A lenda de Ron Burgundy”, filme humorístico de 2004, para a vida real, tinha uma diferença berrante: o Ron da vida real era alguns milhões de anos luz mais bonito que Will Ferrell, o intérprete dele no filme.
Porém, o estilo de se vestir era absolutamente igual e eu até me atrevi a compará-lo a Edward Cullen, da série Twilight, em relação à blusa de gola rulê e calças jeans que Ron vestia na foto, porém o que realmente me chamava atenção era o ruivo escuro e acobreado dos cabelos, os bigodes tão mais finos, bonitos e curtos dele que tinham contraste com o azul claro dos olhos, o que fez meu coração pular no peito de tão encantada que fiquei.
Mas sinceramente, não podia negar que o Champ Kind da vida real era realmente e também alguns milhões de anos luz mais bonito que David Koechner, que o tinha interpretado no filme que citei, pois o da foto era um loiro de olhos verdes e traços incrivelmente perfeitos advindos da ascendência dinamarquesa dele, segundo o que Harken tinha contado enquanto falava das vidas de todos.
Outra coisa que nos impressionou foram as semelhanças faciais de Brian, Brick e Veronica com seus intérpretes do filme, porém as diferenças físicas berravam visualmente: enquanto Veronica tinha cabelos mais longos e loiros, além quadril e seios maiores e mais redondos que os de Christina Applegate, Brian tinha cabelos um pouco mais curtos e um bigode mais curto e fino, além de corpo de um legítimo lutador, bem bronzeado de sol, muito diferente de Paul Rudd e Brick era bem mais alto e musculoso que Steve Carell, como se algum metido a Dr. Frankenstein tivesse colocado a cabeça do “Virgem de 40 Anos” no corpo do “Incrível Hulk” da televisão.
- Juro, se eu encontro um exemplar desses na rua, eu agarro e não solto mais! - falou a Pippa sorrindo de orelha a orelha.
- Pippa, não precisa demonstrar novamente que adora um par de bíceps! - falou a Tracy muito brava, mostrando que já não estava gostando nadinha do comportamento escandaloso da Pippa, pois, desde a hora em que tínhamos chegado, ela não parava de elogiar Brick e fazer comentários um tanto indecorosos, deixando Harken em uma mistura de cores faciais.
Imy nada disse enquanto Harken falou com aquela eterna calmaria: - Não precisam começar uma discussão por causa dos gostos masculinos de vocês, porque esse tipo de coisa não se discute, Tracy.
- Mas depois falam dela e ela não gosta, só não quero que fiquem dizendo que ela é promíscua - respondeu a Tracy, se referindo ao fato de que as líderes de torcida diziam isso aos quatro ventos, coisa que eu odiava mortalmente e que me deixava com vontade de eliminar a Amber Von Tussle, responsável por iniciar toda a fofoca e líder da torcida do time de futebol.
O sorriso da Pippa se desfez em fração de segundo, fazendo ela apertar a câmera contra a mão e na certa praguejar mentalmente contra a nojenta da Amber, mas, como sempre, a voz calma e paternal do Harken eliminou a tensão: - Se você não é assim Pippa, não há com o que se preocupar, simplesmente ignore esses comentários.
- O senhor é uma graça! - sorriu a Pippa novamente enquanto o diretor da emissora nos conduzia ao quarto andar através das escadas.
Eu tinha que admitir, não me admirava da mamãe gostar tanto de Edward Harken, porque ele realmente era uma pessoa admirável e profundamente paternal, cuja voz repleta da calmaria sábia dos mais de 70 anos vividos acalmava todas as tensões e aparência de vovô de história infantil, mesmo que de gravata, nos fazia simpatizar com ele imediatamente.
Durante a subida, conversávamos sobre a equipe, quando o mesmo cheiro que eu havia sentido ao olhar a saída de emergência invadiu as narinas de todo mundo, deixando Harken com o coração aos pulos.
- Santo Deus, esse perfume é, é, é... do Champ! - exclamou ele branco feito papel e com a respiração extremamente ofegante.
Eu, Pippa e Tracy o acudimos enquanto Imy congelou na escada sem imaginarmos o motivo.
- Dá pra você vir nos ajudar Imoghen? - perguntei chamando-a pelo nome, pois era a única coisa que a “descongelava” quando ela ficava dura igual pedra.
Como resposta recebemos um grito de pânico, quando a Imy por pouco não rolou escada abaixo depois de um pulo para trás.
- Menina, pelo amor de Deus! - exclamou Harken indo acudi-la mesmo estando ainda com o coração disparando.
Imy apontava um canto no teto altíssimo balbuciando palavras incompreensíveis, mas logo ela gritou em alto e bom som, apavorada como nunca a tínhamos visto: - Um par de pontos roxos brilhavam, pareciam olhos nos observando!
Nos perguntávamos como assim olhos nos observando enquanto Harken olhava atentamente o canto que ela apontava e não via nada, dizendo que era impossível que alguma coisa ou alguém pudesse ficar pendurado ali e tentando acalmar a Imy com sua conclusão: - Podiam ser mariposas ou algo parecido, afinal existem bichinhos desses de todas as cores.
- Eu não sei, mas pra mim pareciam olhos! - disse a Imy ainda muito apavorada e terminando de subir as escadas com a gente, enquanto eu dava olhadas de canto de olho para trás e tinha a impressão que éramos seguidos.
Ao chegarmos ao quarto andar, onde se destacavam ensaios fotográficos feitos pelos cinco da KVWN e cada uma de nós, exceto Tracy, ficou espantada com a perfeição física dos quatro homens e das curvas de Veronica.
- Impressão minha ou Ron Burgundy e Champ Kind eram remadores? - disse Imy observando uma foto em que Burgundy estava deitado de sunga vermelha sobre uma bóia em uma piscina e outra onde Champ aparecia treinando e deduzindo o detalhe devido ao fato do pai dela ser esportista profissional de remo.
- Eles eram remadores e halterofilistas, mas o Champ também lutava boxe tailandês - respondeu Harken observando as fotos com um quê de nostalgia.
- Mas os dois não parecem nada com os atletas que levantam aqueles pesos nas olimpíadas - observou desnecessariamente a Pippa enquanto Tracy dizia que também praticava essa modalidade de boxe.
- Os halteres eram apenas para deixá-los com os braços maiores, porque o real esporte deles era o remo, tanto é que foram durante anos campeões americanos de remo pelo estado da Califórnia - falou Ed ao observar o ensaio fotográfico onde Ron aparecia vestido de remador e espantado com o que Tracy dissera.
Eu observava alguns e me espantava de até onde o homem podia chegar em sua busca pelo corpo perfeito, pois cada um deles era perfeito na parte física ao seu modo: Ron remava e praticava halteres, Champ fazia os mesmos esportes de Ron, além do chamado muay thay, Brian era lutador e segundo Harken, dono de uma força descomunal mesmo para o tamanho dele e Brick era um fisiculturista ao estilo Lou Ferrigno e pior ainda, o estilo físico praticamente berrava na cara de quem olhasse.
Já Veronica era linda por natureza: loiríssima, curvilínea e dona de formas arredondadas e grandes que se destacavam debaixo dos terninhos, vestidos e lingeries que ela usava nas fotos, algumas que certamente deixariam os garotos da minha turma de quatro, especialmente dois ensaios onde ela aparecia completamente nua, mas sem mostrar a intimidade, apenas o bumbum e os seios ficavam à vista, mas sem vulgaridade, pois o que se valorizava era a parte artístico-temática do ensaio, onde predominavam caras e bocas sensuais, além das fantasias de Cleópatra e policial feminina.
- Veronica era a deusa da KVWN, por quem os homens dariam a alma para ter uma noite de prazer - disse Harken, observando as fotos a certa distância.
- Mas esses ensaios mais sensuais não complicavam a reputação dela na tv e fora dela? - perguntei observando as fotos e relacionando com o contexto doido dos anos 70 no que eu considerava a cidade mais maluca dos Estados Unidos.
- Veronica dizia que a mulher é sensual e sexual de nascença, que ela libera os instintos sexuais de forma intensa quando é reprimida, mas que “pode fazê-lo cuidadosamente sem problemas” quando é criada com mais liberdade, como foi o caso dela, filha de médicos - respondeu Harken gesticulando com os dedos formando aspas, desmentindo algumas coisas ditas sobre ela no filme “O âncora” e completando com um sorriso: - Então ela se liberava fotografando vestida de modo sensual ou sendo a mais fogosa das namoradas, como ela era com Ron Burgundy, mas dependendo de como o humor dela se comportava.
- Tenho que admitir: ela realmente tinha cacife pra isso - falei, impressionada pelo corpo perfeito e cheio de curvas que ela tinha e que sinceramente, eu invejava, ao mesmo tempo em que sentia um inacreditável e absurdo ciúme de Ron.
Enquanto eu e Harken debatíamos o comportamento liberal de Veronica, Tracy olhava os ensaios feitos por Champ com cara de quem via um velho conhecido, Imy anotava tudo o que podia e Pippa ficava visualmente de quatro pelos músculos de Brick e Brian.
Foi quando Harken nos chamou ao quinto andar, o último da exposição e onde se encontravam as melhores reportagens feitas pelo grupo, além de entrevistas deles e vários programas inteiros do Jornal das Seis, transmitidos ao vivo por uma tela de cinema onde os curiosos poderiam ver para ter uma idéia de como a equipe trabalhava, antes e depois de Veronica.
- Bem que a gente podia trazer a nossa turma aqui para ver a exposição, isso nos daria uma nota a mais! - falei, extremamente encantada com a exposição e mais ainda com a voz de Ron, linda, grave e profundamente doce, além de tão musical quanto à do vampiro dos sonhos de todas as adolescentes americanas, Edward Cullen.
- Uma grande idéia Maddie e para sua maior felicidade, semana que vem a exposição só abre as turmas das escolas e por uma felicíssima coincidência, a sua escola será a primeira a vir! - respondeu Harken sorrindo.
- Verdade que as fitas originais estavam com a qualidade comprometida e tiveram que ser restauradas? - perguntou Imoghen, se metendo no meio da nossa conversa e ao mesmo tempo muito faceira com o que Harken tinha dito.
- Aconteceu sim, levamos quase quatro anos de muito trabalho para conseguir restaurar essas gravações e disponibilizá-las ao público - disse Harken ainda muito feliz enquanto eu ia, aos pulos de comemoração, contar para Pippa e Tracy a feliz novidade que nos daria um tremendo 10 no trabalho.
As duas me envolveram num abraço esmagador e logo Harken e Imy se juntaram ao “montinho”, do qual eu saí com a roupa toda abarrotada, porém, vibrando de tanta felicidade e ainda com o coração aos pinotes toda a vez que John Ronald Reuel Chakiris Burgundy, simplesmente Ron, me vinha à cabeça.
Pippa, sempre cheia de dúvidas, fez uma pergunta que me tirou totalmente dos meus devaneios: - Tio Harken, por que o Ron Burgundy tinha um nome tão comprido? - e que era relacionada ao longo nome de batismo do âncora número um de San Diego que Ed tinha falado ao contar onde e quando ele nascera, porém, não tinha especificado bem a origem, embora eu conhecesse a famosa trilogia “O Senhor dos Anéis”.
- Os livros preferidos dos pais dele eram de um autor chamado John Ronald Reuel Tolkien, sendo por isso que os pais dele, Claude e Dorothy, batizaram os outros sete irmãos dele com nomes de personagens desse autor: Éomer, Éowyn, Peregrin, Meriadoc, Arwen, Aragorn e Galadriel, só que quando veio o último filho, menino, eles acharam justo batizá-lo com o nome daquele que os fazia viajar pelas fascinantes paisagens da Terra Média e colocaram no registro os três primeiros nomes do autor, só não puseram o último porque o escrivão não permitiu! - disse Harken dando ruidosas gargalhadas ao terminar de contar a origem do nome de batismo de Ron Burgundy.
Nós quatro também gargalhávamos, porque realmente era esquisito demais, tanto é que eu imaginava e me perguntava como os irmãos dele tinham feito carreira de âncoras, como mandava a tradição familiar relatada por Ed, possuindo nomes tão estranhos.
Quando vi no relógio do meu aparelho celular, já eram quase oito da noite e certamente minha mãe ia começar a ligar repetidas vezes perguntando onde eu estava e ordenando que eu voltasse imediatamente, já que, sempre que eu saía, costumava chegar em casa às 19 em ponto.
Pippa, Imy, Tracy e eu nos despedimos ruidosamente do senhor Harken e tratamos de descer voando pelo elevador do prédio até o térreo e pegar o ônibus que nos levava até minha casa o mais rápido possível.
Demos sorte, pois o primeiro ônibus que viera era o que tínhamos pegado horas antes, porém, o engarrafamento em uma das avenidas era caótico e o coletivo demorou o dobro do tempo para chegar ao destino previsto: a minha casa, onde certamente eu levaria a maior bronca dos meus pais pela demora e pelo fato de ter saído sem avisar.
Eu só não esperava que as coisas piorassem ainda mais, pois quando abri a porta da minha casa, tinha uma reunião na sala: os meus pais e os da Tracy quase tendo um ataque de nervos, a mãe da Imy muito zangada e o treinador Hooken batendo um dos pés contra o chão de tão nervoso pela demora da Pippa em chegar em casa, o que culminou na reunião de todos logo ali, certamente ansiosos para darem umas boas broncas em cada uma de nós.
Imediatamente pegamos os folders da exposição sobre a equipe da KVWN e mostramos para justificar nossa saída, além de eu ter dito que aquilo era importante para fazermos o trabalho de História da Senhora Potter.
- A causa é ótima, eu sei, mas as senhoritas não pensem que vão se livrar de uma boa bronca, pelo amor de Deus olha que horas são agora, quase nove da noite, vocês têm idéia de como é perigoso andar por San Diego quando está escuro?! - exclamou minha mãe, cuja altura da voz podia ser ouvida em meio quarteirão.
- Eu não tenho culpa se o transporte público é atrapalhado - olhei para minha mãe, Ronica, e continuei: - O ônibus era só pra demorar 20 minutos, mas tinha um engarrafamento daqueles em uma das avenidas e ficamos presos lá quase o tempo que levamos para chegar na KVWN quando saímos hoje à tarde.
Foi quando meu pai Charlie se meteu no meio: - Isso não justifica você e as meninas não terem avisado que iam sair, vocês tem idéia de como passamos a última hora e meia, quando chegamos e não vimos nenhuma de vocês?!
Pior que o meu pai estava certo, eu realmente tinha feito a burrada de não avisar e sair desembestada pela rua com as garotas para fazer o mais rápido possível um trabalho exigido pela nariguda Senhora Potter, que valia uma nota alta.
- Desculpa papai, eu e as meninas não queríamos deixar ninguém nervoso, eu realmente devia ter ao menos ligado para o seu emprego e dizer que ia sair com as garotas para a exposição - falei muito arrependida do que tinha feito ao mesmo tempo em que não estava.
- Pelo menos deixe o seu celular com um toque que você consiga ouvir, ou melhor, avise quando sair - disse papai daquele jeito que sempre costumava ser um aviso quando ele não me botava na punição: dessa vez passa, mas da próxima, você fica de castigo Madeline.
Os pais e o tio que estavam ali pegaram as respectivas filhas e sobrinha para levá-las para casa, mas não sem antes combinarmos que amanhã à tarde todo mundo tinha que se encontrar na casa da Pippa para fazermos a parte escrita do trabalho, só que de manhã, eu teria que acordar muito cedo e matar o primeiro período da aula porque eu tinha ficado encarregada de buscar a Phoebe no aeroporto, pois ela chegaria no vôo das sete e trinta da manhã.
Passado o susto, alguns minutos depois, sentei para jantar e meus pais perguntaram como estava a exposição. Eu respondi que estava muito bonita e bem feita, inclusive comentando das gravações originais restauradas para serem colocadas ao público.
Eles sorriam enquanto comiam, enquanto eu o fazia vagarosamente e sem pensar muito, pois a minha cabeça estava em outro lugar e ele atendia por apenas um nome: Burgundy.
Depois de jantar, subi para meu quarto e me troquei, pondo um pijama rosa composto por um short curto e uma regata, enquanto meus pais ainda iam assistir ao jornal e certamente conversar algumas abobrinhas típicas de um casal casado há 32 anos.
Fui para debaixo das cobertas incrivelmente cansada e de repente, minha cabeça viajou ao total do absurdo: me imaginei beijando Ron Burgundy na boca com direito a trilha sonora embalada por Celine Dion cantando o tema de Titanic e quando eu menos esperava, ele, apenas no meu sonho acordado, se afastou, me deixando desapontada ao máximo.
Despertei daquele devaneio esquisito demais quase pulando da cama, ficando naquela hora convicta de três coisas, ao maior estilo Bella Swan: primeira, o trabalho de História sairia melhor do que o esperado, segunda, eu tinha quase certeza que alguma coisa estava muito errada naquela tarde na KVWN e terceira: eu não sabia como, mas estava incrível, irrevogável e absurdamente apaixonada por Ron Burgundy.
Realmente, esse dia não seria dos melhores, principalmente porque eu teria aula com a Senhora Potter, a professora de história que sugava nossa energia a cada aula, tamanha a exigência dela em relação à minha turma e principalmente a mim, a Piper, que todo mundo chamava de Pippa, e a Imoghen, mais conhecida como Imy, as garotas que sentavam comigo e minhas amigas desde que me lembro por gente.
Depois de comprar um vestido de verão verde água para Phoebe, eu segui direito para a escola, aonde cheguei atrasada porque perdi o ônibus do horário que normalmente eu pegava.
- Madeline! - ouvi a voz estridente e alta da professora Potter enquanto tentava entrar sem ser notada e conseqüentemente tomar uma advertência por atraso.
- A Phoebe, minha mana mais velha, está voltando do Arizona, então fui comprar um presente pra ela, só que quando saí da loja pra pegar meu ônibus, me dei conta que ele já tinha passado, por isso eu me atrasei - expliquei mostrando o pacote de presente vermelho com laço dourado, na tentativa da Senhora Potter não me dar uma bronca daquelas.
Mrs. Potter ficou olhando por um minuto e me respondeu: - Tudo bem Maddie, por hoje passa, afinal não é todo o dia que uma pessoa que gostamos volta depois de anos para casa, mas da próxima, você leva advertência, afinal é a segunda vez que a senhorita se atrasa para a minha aula.
Eu sentei danada da vida, querendo que a aula de história passasse voando e eu pudesse ir logo para o vestiário me vestir para a educação física, só que a professora, com aquela voz irritante, parecia fazer questão de deixar todo mundo totalmente sem entusiasmo para nada e, para a situação piorar ainda mais, resolveu nos dar um trabalho enorme para fazer durante a semana em que se comemorava o aniversário da cidade, quando todo mundo saía dois períodos mais cedo da aula.
- Alunos, como vocês devem saber, essa semana se comemora o aniversário da nossa adorada San Diego, então eu acho que seria uma boa chance de pedir a vocês que mostrem o que conhecem da nossa cidade de uma forma bem criativa e diferente, podendo pesquisar histórias de antigamente, fatos mais recentes, pessoas célebres e tantas outras opções de trabalho - disse Senhora Potter, completando que o trabalho devia ter dados de identificação e bibliografia, coisa que todo mundo sabia de cor, só que o conteúdo entre eles era quase uma monografia universitária devido à quantidade de coisas que ela pedia, que não cabiam em poucas folhas.
Então, logo de cara me sentei com a Pippa e a Imy, disposta a fazer o melhor, e preferencialmente o menor, trabalho que fosse possível, só que como nenhuma de nós queria fazer algo no lugar comum, praticamente não tínhamos idéia de que caminho tomar para não tomar uma bomba na nota de História ao mesmo tempo em que desejávamos que a Senhora Potter não tivesse nascido.
Quando a aula de História terminou, nos trocamos no vestiário próximo da sala e fomos para a educação física, onde mais uma vez a Pippa atraiu a atenção de todos garotos e do professor Romany por causa do curto do short e da camiseta baby look que deixava em destaque os enormes seios dela, que conseguiam a façanha de tapar meio gol na hora do futebol, onde ela era a goleira do time, enquanto eu e a Imy jogávamos vôlei e tomávamos algumas boladas porque não exatamente éramos grandes jogadoras.
Depois de cinqüenta minutos, a aula acabou e íamos para minha casa almoçar, como sempre fazíamos uma vez por semana, porém, antes que déssemos um passo fora da escola, fomos abordadas por Tracy Turnblad, da qual a maioria da turma fazia chacota por causa dos quilos a mais, não de gordura, mas de músculo, porque ela lutava boxe tailandês, que pelo que eu sabia da minha mãe contando sobre o tempo em que ficou no Canal Quatro KVWN, era um esporte que o comentarista esportivo da emissora praticava.
- Garotas, eu estou sem grupo pro trabalho, será que posso trabalhar com vocês? - ela perguntou dando aquele sorriso meio brejeiro que era típico das garotas do Texas.
Pippa, Imy e eu nos olhamos por um minuto e como simpatizávamos um bocado com a Tracy, concordamos, o que deixou ela feliz demais e nos dando inúmeros obrigadas durante todo o caminho até a minha casa, já que eu a convidei para almoçar com a gente.
Minha casa, o local mais movimentado de todo o bairro onde eu moro, já que minha mãe recebe visitas todo o santo dia, seja a das mulheres com quem ela toma chá no Clube de Tênis da cidade ou dos ativistas contra a segregação racial com quem o papai trabalha desde que a Phoebe nasceu e que eu me conheço por gente.
Tracy olhou impressionada a minha casa, comentando que mamãe tinha um gosto bem inusitado para decoração, me deixando louca de vergonha, já que a foto do âncora Ron Burgundy e sua equipe formada por mais três homens e uma loira tapava boa parte da parede da sala, porém, compreendi a razão do comentário dela quando uma lágrima saiu dos olhos dela olhando o loiro musculoso e de chapéu cowboy da foto, cujo nome era Champ Kind até onde eu sabia sobre aquele cartaz de gosto duvidoso.
- O que foi, pequena Tracy? - minha mãe Ronica perguntou ao ver que ela estava emocionada.
Foi quando meu pai Charlie, carregando as travessas do almoço, se meteu no meio da conversa, reconhecendo de cara a Tracy: - É a filha daquela sua companheira de chá, a Edna Turnblad! Caramba, mas essa menina é igual à Edna, só que mais forte e com franjinha! - e se referindo a franja que combinava direitinho com o corte de cabelo dela, um comprido moderno de cor escura.
Eu, a Imy e a Pippa ficamos nos olhando atônitas quando a Tracy, sorrindo, nos disse que era sobrinha de Champ Kind, que a mãe dela era irmã caçula dele, tendo 16 anos quando o comentarista esportivo do Canal Quatro sumiu em 1977.
- Sabe que até hoje essa história me intriga demais? - disse meu pai em tom de dúvida e completando em seguida: - Cadê aquele quinteto, que fim será que eles tiveram?
- Infelizmente isso ficou sem resolução até hoje, há quem acredite que eles foram assassinados, outros crêem que cada um seguiu seu rumo por lugares desconhecidos, outros acreditam que o Bloody Mary os engoliu e por aí vai - disse minha mãe como se aquela penúltima parte fizesse algum sentido, já que eu não acreditava em lendas urbanas, embora aquela fosse a mais famosa da cidade.
Foi quando a Pippa dirigiu a mim, a Imy e a Tracy aquele olhar abrilhantado de quem estava tendo uma idéia, porém, quando ela resolvia ter alguma, era sempre sinal de muitos problemas, pois não tinha sido apenas uma vez que eu e Imy tínhamos nos metido em encrenca por conta das idéias mirabolantes que ela vivia tendo e claro, tomado algumas bombas em trabalhos.
- Por favor, Pippa, outra das suas idéias malucas não! Você já nos meteu em problemas suficientes por conta da sua “criatividade”! - exclamei, já muito p da vida por conta da vergonha que passava devido a foto que mamãe tinha posto na sala à vista de todo mundo.
Mas a Pippa não desistia nem comigo furiosa: - Dessa vez eu prometo não meter ninguém em problemas, na verdade o nosso trabalho está bem naquela parede - ela disse isso apontando o cartaz que ocupava parte da parede da sala.
- Tá Pippa, Ron Burgundy e sua equipe de jornalismo, o que isso tem de tremendamente interessante? - disse a Imy quando conseguia ser o máximo de desagradável que podia.
- O tio Hooken conheceu todos eles, a mãe da lindinha da Tracy é irmã do Champ Kind e a dona Ronica trabalhou na sede do Canal Quatro por seis anos, além de que Burgundy foi o maior âncora que essa cidade teve nos anos 60 e 70, contando com uma equipe de apoio das boas, o que mais vocês querem? Se pesquisarmos nas fontes certas, o nosso trabalho vai ser o melhor que aquela professora magrelona e nariguda já viu! - exclamou a Pippa na maior alegria que ela irradiava quando conseguia que os peitos dela não quase pulassem fora do decote da blusa.
Franklin Hooken era o treinador do time de futebol americano da escola onde eu estudava e tio da Pippa, com quem ela tinha vindo morar por conta da casa dele ser apenas cinco quarteirões do colégio e pelo fato dela ter um amor platônico pelo tio, um cara enorme e forte que era uma flor de tão gentil apesar de se parecer com o antipático presidente da WWE, Mr. McMahon e, além disso, tinha 54 anos de idade, aparentando ser mais jovem que sua idade.
- Ah sim, o treinador do time de futebol, uma vez eu ouvi ele comentar com os meninos do time sobre o exemplo que o tio Champ gostava de dar às pessoas! - exclamou a Tracy, que pela expressão facial, tinha amado a idéia da Pippa para o nosso trabalho e em seguida disse surpresa: - Então o treinador Hooken é seu tio? Nossa!
Pippa sorriu suspirando: - Sim, o tio mais maravilhoso que uma sobrinha pode ter!
Imy pensou durante um minuto e meio e depois disse: - No fim acho que pode dar certo, não custa nada.
- Eu concordo já que todas concordam, além do mais, a idéia não é de toda ruim e eu sinceramente espero que nossa nota seja boa - falei enquanto tentava esconder que estava encantada com a beleza loura, européia e gélida de Champ Kind e o ruivo acobreado dos cabelos e o olhar incrivelmente sensual de Ron Burgundy, coisas nas quais eu não tinha reparado antes da Tracy “me acordar”.
As garotas repararam que eu não tirava os olhos do cartaz e me cutucaram, pois o papai já tinha ajudado a mamãe a servir o almoço e eles nos chamavam para sentar.
Sentamos e comemos a incrível lasanha de calabresa e frango feita pela mamãe ao mesmo tempo em que morríamos de rir das piadas do papai e nos emocionávamos com as histórias da mamãe.
Depois de mais ou menos uma hora, subimos correndo ao meu quarto para pesquisar mais no meu computador, de última geração e recentemente comprado pelo papai, sobre a equipe do Canal Quatro KVWN: Ron Burgundy, Charlie Antonius McKeller Kind (Champ Kind), Brick Tamland, Brian Petrarchus (Brian Fantana) e Veronica Corningstone, a única mulher da equipe, uma loira de cara muito séria, porém, incríveis olhos verdes que cintilavam.
Gargalhávamos no quarto lendo algumas das anedotas do grupo e algumas histórias envolvendo uma legítima guerra dos sexos no horário nobre ao vivo e a cores ao mesmo tempo em que outras nos comoviam ou nos indignavam, já que o machismo daquela época era um absoluto absurdo.
Salvamos todo o tipo de informação que pudemos até as três e tanto da tarde, quando a Pippa propôs que fizéssemos entrevistas com a minha mãe, a da Tracy e o tio dela, além de irmos à sede da emissora, já que estava tendo uma exposição homenageando a célebre equipe que era ainda considerada uma das grandes equipes de jornalismo da América, mesmo que os quatro homens fossem um bando de chauvinistas, coisa da qual a Tracy discordou quase aos berros no caso de Champ Kind, pois ela dizia que a mãe dela falava que ele era íntegro e dono de um bom coração.
Concordamos para não começar uma discussão, pois logo notamos que ela, apesar da cara de menina calma, tinha uma voz de trovão que só ouvindo se acreditava e ela ficava zangada com uma tremenda facilidade, o que não nos dava outra opção a não ser assentirmos e ficarmos quietas.
Tratamos logo de pegar documentos e bolsas, pois iríamos primeiro à exposição na sede do Canal Quatro, porque, naquela tarde, a mamãe tinha ido fazer terapia, o treinador Hooken estava com o time da escola e a mãe da Tracy estava trabalhando, então resolvemos ir, só que para chegarmos, pegamos um ônibus que estava completamente lotado e passamos a viagem toda em pé, passando pelas situações mais chatas possíveis: o cobrador de olho nos peitos da Pippa, eu tendo que agüentar o fedor de um bêbado praticamente colado em mim e a Imy sendo espremida pelo corpanzil de 65 kg, distribuídos em 1,70 m, da Tracy.
Chegamos depois de quase vinte minutos dentro daquele coletivo sufocado e calorento e quando entramos no prédio de trinta andares, nos identificamos para o porteiro:
- Madeline McCormack, “Maddie”.
- Piper Hooken, “Pippa”.
- Imoghen Forest Green, “Imy” - ela se identificou vermelha feito pimenta, pois odiava o nome que tinha, razão pela qual todo mundo a chamava de Imy.
- Tracy Turnblad - ela sorriu se identificando e dizendo que era filha da irmã de Champ Kind.
O porteiro ficou nos olhando durante vários minutos, depois tirou os olhos dos peitos da Pippa, sorriu para Tracy e perguntou a Imy: - Você por acaso é uma cherokee?
- Eu sou filha de um - respondeu ela ajeitando a tiara no cabelo preto e ondulado, cuja cor ela havia herdado do pai, um legítimo índio cherokee e a ondulação da mãe, uma mulher branca da Louisiana chamada Lucy.
Entramos sem dizer mais nada, só que o porteiro veio atrás de mim e perguntou, meio que me reconhecendo: - Você não é filha caçula da dona Ronica McCormack, ex-funcionária daqui?
- Sim, sou eu, por quê? - perguntei rindo levemente e meio que imaginando o motivo da resposta, já que mamãe ainda tinha muitos amigos no antigo emprego, inclusive o diretor da emissora, Ed Harken.
- Ela sempre vem visitar o senhor Harken e fala que você tem sido a responsável pela casa desde que ela ficou doente - sorriu o porteiro.
Escutando aquilo, senti um aperto no peito, já que infelizmente minha mãe sofria do mal de Parkinson fazia um ano e todo o dia ela fazia tratamento e terapia ocupacional para controlar os sintomas, mas ela tinha dado uma sorte danada porque a doença tinha sido descoberta no estágio inicial, o que facilitava muito as coisas, pois ela tinha apenas 52 anos, jovem demais para padecer daquilo.
Sorri e disse obrigada, indo rapidamente até as garotas, já impacientes com a minha demora na portaria, para o elevador que nos levaria ao terceiro andar, onde a exposição acontecia e tomava mais dois andares da emissora.
Ao chegarmos no terceiro andar, ficamos assustadas devido às tantas coisas pessoais de cada um que havia ali, mas o que realmente nos deixou assustadas de cara foi uma foto de Brick Tamland participando de um campeonato americano de fisiculturismo usando apenas uma sunga dourada e sem o célebre óculos fundo de garrafa que o deixava com cara de paspalhão.
O rosto meio amorenado da Imy ficou vermelho igual uma pimenta, a Pippa deu um sorriso malicioso seguido de uma mordidela no lábio inferior, a Tracy virou o rosto para um lado e eu não conseguia segurar as risadas, porque a mistura de duas coisas tão incrivelmente opostas era bizarra.
- As senhoritas querem ver o que primeiro? - uma voz muito conhecida da minha audição ecoou na sala.
- Senhor Harken! - exclamei feliz da vida ao revê-lo depois que ele foi parar no hospital depois de um acidente doméstico.
- Madeline Smith! - exclamou ele vindo me abraçar e me chamando, apenas de pirraça e rindo, pelo apelido que os mais velhos que me conheciam tinham me posto por me acharem parecida com uma atriz e modelo da década de 70 que tinha feito alguns filmes da produtora inglesa Hammer e um filme do James Bond, sendo por isso que o time de futebol da escola me chamava de “Miss Caruso”, apelido que eu odiava.
As outras garotas riram enquanto eu o abraçava muito feliz e explicava o porquê da nossa ida ali e ele nos respondeu sorrindo:
- Fiquem felizes porque eu serei o guia de vocês nessa exposição! - disse ele muito feliz porque os organizadores da exposição tinham concordado que os visitantes deviam vir em grupos com hora marcada para evitar bagunça ou desordem, afinal ali tinha tantos objetos que era impossível andar ali sem bater em nada se estivesse lotado.
- Senhor Harken, será que tem como eu tirar uma cópia daquela foto maravilhosa do Brick Tamland? - perguntou a Pippa apontando a foto que tinha nos impressionado quando chegamos e nos matando de vergonha, especialmente a Tracy, que ainda estava vermelhona.
- Mocinha, eu não tenho como tirar uma cópia daquela foto, mas acho que posso permitir que tire uma foto com seu celular ou uma digital caso você tenha alguma das duas - disse Harken, pego de surpresa pelo inesperado pedido da Pippa.
Imediatamente, a Pippa tirou da bolsa uma máquina digital e a posicionou de modo que ela pegasse a foto inteira e deu um flash seguido de um gritinho agudo, o que fez a Tracy perguntar: - A Pippa é assim mesmo?
Imy respondeu antes que eu dissesse alguma coisa: - É Tracy, ela é chegadona em um cara musculoso.
Olhei e assenti enquanto eu pensava no que a Tracy pensaria da gente depois daquela, dando graças a Deus que não tivesse mais ninguém ali além de nós, senão o vexame seria maior ainda do que já era, mas no fim, ela aparentemente nem se importou muito com a conduta escandalosa da Pippa e sorria enquanto via as coisas pessoais de seu tio expostas ali, incluindo uma foto dele com a mãe dela, datada de 1976, um ano antes do desaparecimento dele.
Foi quando Harken viu a tal foto que Tracy olhava e a olhou melhor, ficando impressionado e mudo com a semelhança de Tracy com Edna, em seguida perguntando: - Por acaso você é da família Kind?
- Eu sou a filha de Edna Kind, meu nome é Tracy Turnblad - ela disse estendendo a mão para apertar a de Ed Harken e sorrindo.
O coração de Harken deu um pulo de tão impressionado que ele ficou com a semelhança de Tracy com a mãe, uma era o retrato da outra: - Meu Deus, se o Champ estivesse aqui, ficaria impressionado de como você e Edna se parecem!
- Obrigada, senhor Harken - disse Tracy sorrindo.
Durante o diálogo entre a Tracy e o Harken, eu notei que a porta de emergência do andar se fechou bruscamente e corri até lá com a certeza de que tinha alguém ali, mas quando abri novamente a porta, não havia viva alma, então pensei que podia ser o vento, porém, nas minhas narinas entrou um perfume muito estranho, uma mistura de água de lavanda com champanhe e existia o fato de que uma corrente de ar não fecharia uma porta daquele tamanho no terceiro andar de um prédio.
Fiquei muito assustada e fui rapidamente contar ao Harken o que tinha acontecido e ele imediatamente chamou a segurança do prédio para que eles vasculhassem, através do circuito interno de tv, o local todo em busca de algum invasor, porém, vasculhando todos os andares, inclusive as saídas de emergência, não acharam ninguém suspeito, sequer uma sombra.
O meu coração pulou no peito depois disso, me deixando um monte de dúvidas, inclusive de que podia haver alguma assombração naquele lugar, porém, logo espantei essa idéia, afinal de contas fantasmas eram coisas de mitologia e filme de terror.
Passado o susto, começamos a andar pela exposição guiadas por Harken, que nos mostrava os mais variados objetos de cada membro da equipe, inclusive um conjunto de sutiã e calcinha cravejados de brilhantes que pertencera a Veronica Corningstone.
- Nossa, olha o tamanho desse sutiã, os peitos dela deviam ser enormes, não é tio? - perguntou a Pippa com espanto quando viu que o sutiã era 44.
- Acho difícil alguma mulher nesse país ter os seios do tamanho dos seus Pippa, nem a Dolly Parton, com todo o silicone que ela tem, conseguiu superar a sua marca! - falou a Imy rindo muito.
- Às vezes eu odeio ter peitos tão grandes, porque comprar blusas e vestidos, na maior parte das vezes, é a missão mais impossível que eu tenho, pois nenhuma me serve e quase sempre eu tenho que ir às lojas de tamanhos de gente gorda! - disse Pippa p da vida.
Harken, rindo um pouco, disse, naquele tom paternal que caracterizava o jeito de conversar dele: - Cada um convive com o que Deus deu, Imoghen, então, ninguém devia fazer comentários como os seus e Pippa, ser gordo não é crime, portanto não fale dessa forma.
A Imy e a Pippa ficaram tão vermelhas que eu achei que elas soltariam fumaça pelos ouvidos ao mesmo tempo em que eu, Tracy e Harken dávamos gargalhadas da reação delas.
Depois de alguns minutos apenas olhando objetos pessoais e fotos de bastidores, nós quatro paramos diante de quatro fotos grandes de cada um dos cinco membros da equipe, fotos realmente lindas, mas a mais de todas elas certamente era de Ron Burgundy, que de “O âncora - A lenda de Ron Burgundy”, filme humorístico de 2004, para a vida real, tinha uma diferença berrante: o Ron da vida real era alguns milhões de anos luz mais bonito que Will Ferrell, o intérprete dele no filme.
Porém, o estilo de se vestir era absolutamente igual e eu até me atrevi a compará-lo a Edward Cullen, da série Twilight, em relação à blusa de gola rulê e calças jeans que Ron vestia na foto, porém o que realmente me chamava atenção era o ruivo escuro e acobreado dos cabelos, os bigodes tão mais finos, bonitos e curtos dele que tinham contraste com o azul claro dos olhos, o que fez meu coração pular no peito de tão encantada que fiquei.
Mas sinceramente, não podia negar que o Champ Kind da vida real era realmente e também alguns milhões de anos luz mais bonito que David Koechner, que o tinha interpretado no filme que citei, pois o da foto era um loiro de olhos verdes e traços incrivelmente perfeitos advindos da ascendência dinamarquesa dele, segundo o que Harken tinha contado enquanto falava das vidas de todos.
Outra coisa que nos impressionou foram as semelhanças faciais de Brian, Brick e Veronica com seus intérpretes do filme, porém as diferenças físicas berravam visualmente: enquanto Veronica tinha cabelos mais longos e loiros, além quadril e seios maiores e mais redondos que os de Christina Applegate, Brian tinha cabelos um pouco mais curtos e um bigode mais curto e fino, além de corpo de um legítimo lutador, bem bronzeado de sol, muito diferente de Paul Rudd e Brick era bem mais alto e musculoso que Steve Carell, como se algum metido a Dr. Frankenstein tivesse colocado a cabeça do “Virgem de 40 Anos” no corpo do “Incrível Hulk” da televisão.
- Juro, se eu encontro um exemplar desses na rua, eu agarro e não solto mais! - falou a Pippa sorrindo de orelha a orelha.
- Pippa, não precisa demonstrar novamente que adora um par de bíceps! - falou a Tracy muito brava, mostrando que já não estava gostando nadinha do comportamento escandaloso da Pippa, pois, desde a hora em que tínhamos chegado, ela não parava de elogiar Brick e fazer comentários um tanto indecorosos, deixando Harken em uma mistura de cores faciais.
Imy nada disse enquanto Harken falou com aquela eterna calmaria: - Não precisam começar uma discussão por causa dos gostos masculinos de vocês, porque esse tipo de coisa não se discute, Tracy.
- Mas depois falam dela e ela não gosta, só não quero que fiquem dizendo que ela é promíscua - respondeu a Tracy, se referindo ao fato de que as líderes de torcida diziam isso aos quatro ventos, coisa que eu odiava mortalmente e que me deixava com vontade de eliminar a Amber Von Tussle, responsável por iniciar toda a fofoca e líder da torcida do time de futebol.
O sorriso da Pippa se desfez em fração de segundo, fazendo ela apertar a câmera contra a mão e na certa praguejar mentalmente contra a nojenta da Amber, mas, como sempre, a voz calma e paternal do Harken eliminou a tensão: - Se você não é assim Pippa, não há com o que se preocupar, simplesmente ignore esses comentários.
- O senhor é uma graça! - sorriu a Pippa novamente enquanto o diretor da emissora nos conduzia ao quarto andar através das escadas.
Eu tinha que admitir, não me admirava da mamãe gostar tanto de Edward Harken, porque ele realmente era uma pessoa admirável e profundamente paternal, cuja voz repleta da calmaria sábia dos mais de 70 anos vividos acalmava todas as tensões e aparência de vovô de história infantil, mesmo que de gravata, nos fazia simpatizar com ele imediatamente.
Durante a subida, conversávamos sobre a equipe, quando o mesmo cheiro que eu havia sentido ao olhar a saída de emergência invadiu as narinas de todo mundo, deixando Harken com o coração aos pulos.
- Santo Deus, esse perfume é, é, é... do Champ! - exclamou ele branco feito papel e com a respiração extremamente ofegante.
Eu, Pippa e Tracy o acudimos enquanto Imy congelou na escada sem imaginarmos o motivo.
- Dá pra você vir nos ajudar Imoghen? - perguntei chamando-a pelo nome, pois era a única coisa que a “descongelava” quando ela ficava dura igual pedra.
Como resposta recebemos um grito de pânico, quando a Imy por pouco não rolou escada abaixo depois de um pulo para trás.
- Menina, pelo amor de Deus! - exclamou Harken indo acudi-la mesmo estando ainda com o coração disparando.
Imy apontava um canto no teto altíssimo balbuciando palavras incompreensíveis, mas logo ela gritou em alto e bom som, apavorada como nunca a tínhamos visto: - Um par de pontos roxos brilhavam, pareciam olhos nos observando!
Nos perguntávamos como assim olhos nos observando enquanto Harken olhava atentamente o canto que ela apontava e não via nada, dizendo que era impossível que alguma coisa ou alguém pudesse ficar pendurado ali e tentando acalmar a Imy com sua conclusão: - Podiam ser mariposas ou algo parecido, afinal existem bichinhos desses de todas as cores.
- Eu não sei, mas pra mim pareciam olhos! - disse a Imy ainda muito apavorada e terminando de subir as escadas com a gente, enquanto eu dava olhadas de canto de olho para trás e tinha a impressão que éramos seguidos.
Ao chegarmos ao quarto andar, onde se destacavam ensaios fotográficos feitos pelos cinco da KVWN e cada uma de nós, exceto Tracy, ficou espantada com a perfeição física dos quatro homens e das curvas de Veronica.
- Impressão minha ou Ron Burgundy e Champ Kind eram remadores? - disse Imy observando uma foto em que Burgundy estava deitado de sunga vermelha sobre uma bóia em uma piscina e outra onde Champ aparecia treinando e deduzindo o detalhe devido ao fato do pai dela ser esportista profissional de remo.
- Eles eram remadores e halterofilistas, mas o Champ também lutava boxe tailandês - respondeu Harken observando as fotos com um quê de nostalgia.
- Mas os dois não parecem nada com os atletas que levantam aqueles pesos nas olimpíadas - observou desnecessariamente a Pippa enquanto Tracy dizia que também praticava essa modalidade de boxe.
- Os halteres eram apenas para deixá-los com os braços maiores, porque o real esporte deles era o remo, tanto é que foram durante anos campeões americanos de remo pelo estado da Califórnia - falou Ed ao observar o ensaio fotográfico onde Ron aparecia vestido de remador e espantado com o que Tracy dissera.
Eu observava alguns e me espantava de até onde o homem podia chegar em sua busca pelo corpo perfeito, pois cada um deles era perfeito na parte física ao seu modo: Ron remava e praticava halteres, Champ fazia os mesmos esportes de Ron, além do chamado muay thay, Brian era lutador e segundo Harken, dono de uma força descomunal mesmo para o tamanho dele e Brick era um fisiculturista ao estilo Lou Ferrigno e pior ainda, o estilo físico praticamente berrava na cara de quem olhasse.
Já Veronica era linda por natureza: loiríssima, curvilínea e dona de formas arredondadas e grandes que se destacavam debaixo dos terninhos, vestidos e lingeries que ela usava nas fotos, algumas que certamente deixariam os garotos da minha turma de quatro, especialmente dois ensaios onde ela aparecia completamente nua, mas sem mostrar a intimidade, apenas o bumbum e os seios ficavam à vista, mas sem vulgaridade, pois o que se valorizava era a parte artístico-temática do ensaio, onde predominavam caras e bocas sensuais, além das fantasias de Cleópatra e policial feminina.
- Veronica era a deusa da KVWN, por quem os homens dariam a alma para ter uma noite de prazer - disse Harken, observando as fotos a certa distância.
- Mas esses ensaios mais sensuais não complicavam a reputação dela na tv e fora dela? - perguntei observando as fotos e relacionando com o contexto doido dos anos 70 no que eu considerava a cidade mais maluca dos Estados Unidos.
- Veronica dizia que a mulher é sensual e sexual de nascença, que ela libera os instintos sexuais de forma intensa quando é reprimida, mas que “pode fazê-lo cuidadosamente sem problemas” quando é criada com mais liberdade, como foi o caso dela, filha de médicos - respondeu Harken gesticulando com os dedos formando aspas, desmentindo algumas coisas ditas sobre ela no filme “O âncora” e completando com um sorriso: - Então ela se liberava fotografando vestida de modo sensual ou sendo a mais fogosa das namoradas, como ela era com Ron Burgundy, mas dependendo de como o humor dela se comportava.
- Tenho que admitir: ela realmente tinha cacife pra isso - falei, impressionada pelo corpo perfeito e cheio de curvas que ela tinha e que sinceramente, eu invejava, ao mesmo tempo em que sentia um inacreditável e absurdo ciúme de Ron.
Enquanto eu e Harken debatíamos o comportamento liberal de Veronica, Tracy olhava os ensaios feitos por Champ com cara de quem via um velho conhecido, Imy anotava tudo o que podia e Pippa ficava visualmente de quatro pelos músculos de Brick e Brian.
Foi quando Harken nos chamou ao quinto andar, o último da exposição e onde se encontravam as melhores reportagens feitas pelo grupo, além de entrevistas deles e vários programas inteiros do Jornal das Seis, transmitidos ao vivo por uma tela de cinema onde os curiosos poderiam ver para ter uma idéia de como a equipe trabalhava, antes e depois de Veronica.
- Bem que a gente podia trazer a nossa turma aqui para ver a exposição, isso nos daria uma nota a mais! - falei, extremamente encantada com a exposição e mais ainda com a voz de Ron, linda, grave e profundamente doce, além de tão musical quanto à do vampiro dos sonhos de todas as adolescentes americanas, Edward Cullen.
- Uma grande idéia Maddie e para sua maior felicidade, semana que vem a exposição só abre as turmas das escolas e por uma felicíssima coincidência, a sua escola será a primeira a vir! - respondeu Harken sorrindo.
- Verdade que as fitas originais estavam com a qualidade comprometida e tiveram que ser restauradas? - perguntou Imoghen, se metendo no meio da nossa conversa e ao mesmo tempo muito faceira com o que Harken tinha dito.
- Aconteceu sim, levamos quase quatro anos de muito trabalho para conseguir restaurar essas gravações e disponibilizá-las ao público - disse Harken ainda muito feliz enquanto eu ia, aos pulos de comemoração, contar para Pippa e Tracy a feliz novidade que nos daria um tremendo 10 no trabalho.
As duas me envolveram num abraço esmagador e logo Harken e Imy se juntaram ao “montinho”, do qual eu saí com a roupa toda abarrotada, porém, vibrando de tanta felicidade e ainda com o coração aos pinotes toda a vez que John Ronald Reuel Chakiris Burgundy, simplesmente Ron, me vinha à cabeça.
Pippa, sempre cheia de dúvidas, fez uma pergunta que me tirou totalmente dos meus devaneios: - Tio Harken, por que o Ron Burgundy tinha um nome tão comprido? - e que era relacionada ao longo nome de batismo do âncora número um de San Diego que Ed tinha falado ao contar onde e quando ele nascera, porém, não tinha especificado bem a origem, embora eu conhecesse a famosa trilogia “O Senhor dos Anéis”.
- Os livros preferidos dos pais dele eram de um autor chamado John Ronald Reuel Tolkien, sendo por isso que os pais dele, Claude e Dorothy, batizaram os outros sete irmãos dele com nomes de personagens desse autor: Éomer, Éowyn, Peregrin, Meriadoc, Arwen, Aragorn e Galadriel, só que quando veio o último filho, menino, eles acharam justo batizá-lo com o nome daquele que os fazia viajar pelas fascinantes paisagens da Terra Média e colocaram no registro os três primeiros nomes do autor, só não puseram o último porque o escrivão não permitiu! - disse Harken dando ruidosas gargalhadas ao terminar de contar a origem do nome de batismo de Ron Burgundy.
Nós quatro também gargalhávamos, porque realmente era esquisito demais, tanto é que eu imaginava e me perguntava como os irmãos dele tinham feito carreira de âncoras, como mandava a tradição familiar relatada por Ed, possuindo nomes tão estranhos.
Quando vi no relógio do meu aparelho celular, já eram quase oito da noite e certamente minha mãe ia começar a ligar repetidas vezes perguntando onde eu estava e ordenando que eu voltasse imediatamente, já que, sempre que eu saía, costumava chegar em casa às 19 em ponto.
Pippa, Imy, Tracy e eu nos despedimos ruidosamente do senhor Harken e tratamos de descer voando pelo elevador do prédio até o térreo e pegar o ônibus que nos levava até minha casa o mais rápido possível.
Demos sorte, pois o primeiro ônibus que viera era o que tínhamos pegado horas antes, porém, o engarrafamento em uma das avenidas era caótico e o coletivo demorou o dobro do tempo para chegar ao destino previsto: a minha casa, onde certamente eu levaria a maior bronca dos meus pais pela demora e pelo fato de ter saído sem avisar.
Eu só não esperava que as coisas piorassem ainda mais, pois quando abri a porta da minha casa, tinha uma reunião na sala: os meus pais e os da Tracy quase tendo um ataque de nervos, a mãe da Imy muito zangada e o treinador Hooken batendo um dos pés contra o chão de tão nervoso pela demora da Pippa em chegar em casa, o que culminou na reunião de todos logo ali, certamente ansiosos para darem umas boas broncas em cada uma de nós.
Imediatamente pegamos os folders da exposição sobre a equipe da KVWN e mostramos para justificar nossa saída, além de eu ter dito que aquilo era importante para fazermos o trabalho de História da Senhora Potter.
- A causa é ótima, eu sei, mas as senhoritas não pensem que vão se livrar de uma boa bronca, pelo amor de Deus olha que horas são agora, quase nove da noite, vocês têm idéia de como é perigoso andar por San Diego quando está escuro?! - exclamou minha mãe, cuja altura da voz podia ser ouvida em meio quarteirão.
- Eu não tenho culpa se o transporte público é atrapalhado - olhei para minha mãe, Ronica, e continuei: - O ônibus era só pra demorar 20 minutos, mas tinha um engarrafamento daqueles em uma das avenidas e ficamos presos lá quase o tempo que levamos para chegar na KVWN quando saímos hoje à tarde.
Foi quando meu pai Charlie se meteu no meio: - Isso não justifica você e as meninas não terem avisado que iam sair, vocês tem idéia de como passamos a última hora e meia, quando chegamos e não vimos nenhuma de vocês?!
Pior que o meu pai estava certo, eu realmente tinha feito a burrada de não avisar e sair desembestada pela rua com as garotas para fazer o mais rápido possível um trabalho exigido pela nariguda Senhora Potter, que valia uma nota alta.
- Desculpa papai, eu e as meninas não queríamos deixar ninguém nervoso, eu realmente devia ter ao menos ligado para o seu emprego e dizer que ia sair com as garotas para a exposição - falei muito arrependida do que tinha feito ao mesmo tempo em que não estava.
- Pelo menos deixe o seu celular com um toque que você consiga ouvir, ou melhor, avise quando sair - disse papai daquele jeito que sempre costumava ser um aviso quando ele não me botava na punição: dessa vez passa, mas da próxima, você fica de castigo Madeline.
Os pais e o tio que estavam ali pegaram as respectivas filhas e sobrinha para levá-las para casa, mas não sem antes combinarmos que amanhã à tarde todo mundo tinha que se encontrar na casa da Pippa para fazermos a parte escrita do trabalho, só que de manhã, eu teria que acordar muito cedo e matar o primeiro período da aula porque eu tinha ficado encarregada de buscar a Phoebe no aeroporto, pois ela chegaria no vôo das sete e trinta da manhã.
Passado o susto, alguns minutos depois, sentei para jantar e meus pais perguntaram como estava a exposição. Eu respondi que estava muito bonita e bem feita, inclusive comentando das gravações originais restauradas para serem colocadas ao público.
Eles sorriam enquanto comiam, enquanto eu o fazia vagarosamente e sem pensar muito, pois a minha cabeça estava em outro lugar e ele atendia por apenas um nome: Burgundy.
Depois de jantar, subi para meu quarto e me troquei, pondo um pijama rosa composto por um short curto e uma regata, enquanto meus pais ainda iam assistir ao jornal e certamente conversar algumas abobrinhas típicas de um casal casado há 32 anos.
Fui para debaixo das cobertas incrivelmente cansada e de repente, minha cabeça viajou ao total do absurdo: me imaginei beijando Ron Burgundy na boca com direito a trilha sonora embalada por Celine Dion cantando o tema de Titanic e quando eu menos esperava, ele, apenas no meu sonho acordado, se afastou, me deixando desapontada ao máximo.
Despertei daquele devaneio esquisito demais quase pulando da cama, ficando naquela hora convicta de três coisas, ao maior estilo Bella Swan: primeira, o trabalho de História sairia melhor do que o esperado, segunda, eu tinha quase certeza que alguma coisa estava muito errada naquela tarde na KVWN e terceira: eu não sabia como, mas estava incrível, irrevogável e absurdamente apaixonada por Ron Burgundy.
terça-feira, 5 de maio de 2009
Frieda, a Vampira - Volume 1: A nobreza despida (1814 - 1854) - Capítulo 9: Penetrando nas linhas inimigas
Passados dois dias de sua chegada, o falso circo circulava pela cidade sem despertar nenhuma desconfiança e maravilhado com a grandiosidade da capital do Império da Áustria ao mesmo tempo estarrecido com a miséria na qual viviam inúmeros habitantes.
- Meu Deus, como pode o Imperador gastar tanto dinheiro fazendo essas obras e deixar os pobres à própria sorte?! - perguntava Wilbur horrorizado.
- Eles ainda por cima pagam os absurdos impostos cobrados por esse monstro sob pena de apodrecerem na cadeia apenas para manter os luxos absurdos da nobreza ociosa e parasitária que o cerca e o pior de tudo é que nessa nobreza certamente aquele biltre britânico está incluído ao lado daquela porca luxuriosa! - exclamou Levine furioso, porém em baixo tom.
- De nada adianta ficarmos divagando, o melhor que podemos fazer nesse caso é ajudar essas pessoas com pelo menos um pão sobre a mesa - disse Harold um tanto triste e pensando em como podia ver aquilo sem poder fazer muita coisa.
Klemens estava furioso com as cantadas que recebia devido ao seu perfeito disfarce de cigana, porém acostumava-se com aquela situação para salvar seus amigos e a bela e futura cidade que se desenvolvia.
Maria e Anton ficavam sempre juntos, ainda que isso deixasse Lauzun um tanto constrangido, afinal de contas, nem casados eles eram ainda, porém, Anton queria matar Frieda para impedir seus maléficos planos.
Ao mesmo tempo, Frieda aproveitava-se das saídas de George e dos descansos longos da cunhada Lucrecia para ir para a cama com o Marquês de Munchaünsen na casa deste, onde passava horas se divertindo sexualmente com ele e de onde ia embora usando seus poderes de vampira, de modo que ninguém percebesse que ela traía o “marido”, porém, ela nem desconfiava que seus planos talvez estivessem a um passo de serem arruinados.
Enquanto isso, em uma parte secreta da casa de George Witcherwell, o pequeno Arthur Raven estava acorrentado pelos pés e tinha tido sua varinha escondida pelo bruxo Klaus Wolff.
- Isso dói muito moço, pode pelo menos soltar um pouco as correntes? - disse o menino sentindo muita dor no tornozelo.
- O senhor Witcherwell deu ordens expressas para que eu não o soltasse até a hora dele voltar, afinal, você já tentou fugir várias vezes e não quero correr de novo esse risco - sorriu o cruel Tutchenko.
Lucrecia ouviu a conversa e não conseguia evitar a tristeza, pois o pequeno Arthur tinha a idade que teria o filho dela caso este não tivesse morrido aos sete meses vítima de pneumonia. Levava comida às escondidas para o menino, pois não o queria passando fome.
Aquela vampira inglesa ainda possuía uma ponta de bondade, pois não podia evitar pensar quando via o menino: - Se você não tivesse família, eu juro que te adotava pequeno, você tem a idade que teria o meu Wenzel se ele tivesse ficado vivo.
Todas as vezes que Arthur via os pensamentos de benevolência dela e dizia que gostava de Lucrecia, ela se perguntava por que tinha sido tão má a vida toda, até mesmo se arrependendo de seus atos passados e de ter se deixado virar vampira. Ela sabia como Frieda era cruel e impiedosa, inclusive a vampira chegara a ponto de esbofetear o rosto do menino e ameaçá-lo com um ferro em brasa apenas para torturá-lo.
- Onde eu estava com a cabeça quando permiti que Frieda fizesse isso comigo me deixando levar por aquela beleza angelical dela? - Lucrecia se perguntava ao chegar ao seu quarto e ver seu mundo cair, no melhor estilo da fossa moderna de Maysa e continuava divagando: - Porém, talvez assim eu consiga ter mais chances de fazer algo melhor pelo menino. Eu sempre imaginei que aquela vampira era perversa, mas nem tanto assim! Meu Deus, como ela pode odiar tanto um menino como aquele? Uma criança tão linda sofrendo daquela forma nas mãos daquele monstro! - até que decidiu:
- Mesmo que Frieda me dê uma estaca no meio do peito, eu tiro Arthur daqui! Não posso continuar vendo isso e não fazer nada além de levar comida escondida para ele!
Imediatamente, Lucrecia, se aproveitando que naquela hora o criado siberiano sumia sem dizer aonde ia, foi ao quarto dele, onde ela sabia que estava guardada a varinha do menino e um papel onde estavam escritas as localizações da mãe e irmãs dele, e pegou-os, indo em seguida para o porão soltá-lo e ajudá-lo a escapar. Logo depois de soltar o menino, ela foi ao seu quarto e arrumou suas roupas, jóias e outros pertences, disposta a ir embora em definitivo depois de deixar Arthur e sua família sãos e salvos.
Surpreso ao se perceber livre, Arthur agradeceu muitas vezes abraçando fortemente Lucrecia, que achou melhor usar a cocheira para levá-lo, porque com os tornozelos machucados e as pernas doendo ele não iria longe.
- Vou te levar para um lugar que eu conheço e lá você vai melhorar dos seus machucados e quanto ao Klaus Wolff, caso ele pergunte, não se preocupe, darei um jeito - disse Lucrecia enquanto colocava o menino dentro da cocheira.
- Por que está me ajudando? - perguntou Arthur achando que talvez não devesse.
- Se o filho que eu tive estivesse vivo hoje, ele teria sua idade - respondeu Lucrecia sorrindo.
- Eu queria saber por que minha mamãe me deixou quando eu era bebê, embora o meu papai sempre diga que mesmo eu não tendo nascido da mamãe sempre vou ser filho deles - disse o pequeno abraçado com Lucrecia enquanto o cocheiro Jules cumpria as ordens da patroa.
Lucrecia não pôde evitar uma expressão de surpresa quando soube que o pequeno Arthur era filho adotivo de Christopher e Louise Raven: - Então você sonha em reencontrar seus pais verdadeiros e saber por que você foi deixado, eu imagino, afinal todos nós queremos saber nossas origens.
Ao mesmo tempo, o falso circo estava se alimentando e conversando sobre como procederiam na cidade, quando Wilbur, recebendo uma mensagem telepática, disse muito surpreso: - Lucrecia Witcherwell está levando Arthur para um local que ela conhece, embora eu não entenda porque ela o está ajudando.
Os membros da Irmandade que ali estavam quase se engasgaram com a comida ao ouvirem o que o bruxo de cãs tinha dito enquanto Maria e Anton imaginavam com uma mulher tísica estaria em condições de ajudar alguém.
- Arthur acabou de me dizer que Lucrecia é uma vampira do bem e que se o bebê dela estivesse vivo, teria a idade dele - falou Wilbur tão surpreso que as palavras saíam em separação silábica.
Lauzun disse com desconfiança: - Por acaso existe algum vampiro que seja do bem? Sinceramente, não acredito nisso até que me provem o contrário.
- Você pode não acreditar meu amigo franco-austríaco, mas muitos vampiros são do bem e não bebem sangue humano, isso graças a um grande e bondoso vampiro chamado Carlisle Cullen - respondeu Wilbur, que a noite iria escrever uma carta para o amigo morto-vivo da Inglaterra.
- Vampiros do bem, Carlisle Cullen?! - Harold perguntou espantado e os outros, sendo Lauzun o mais espantado, imediatamente olharam como se tivessem visto um animal raro.
- Cullen é muito conhecido entre os bruxos por ter difundido a filosofia de que os humanos não devem ser apenas um alimento para os vampiros e que o equilíbrio entre as raças é muito importante para a manutenção do mundo tal como ele é - sorriu Wilbur ao falar do vampiro britânico que desde o século 17 aparentava ter 23 anos.
Klemens olhou para Wilbur e perguntou com sua curiosidade médica: - Mas não é o sangue humano que mantém os vampiros com a aparência cheia de vida?
- Essa e algumas outras teorias são uma mentira sem tamanho, inclusive a história de que todo o vampiro possui colmilhos grandes, pois Carlisle e outros não os possuem, embora existam os que os têm, mas isso varia muito, embora essa variação nunca tenha sido explicada - respondeu Wilbur olhando todos como se fosse professor de uma escola primária.
- Entre essas mentiras se inclui a de que uma pessoa pura mordida por um vampiro morre e a não pura se transforma? - perguntou Maria lembrando o que seu noivo contou a ela, de ter quase sido mordida por Karnstein enquanto estava desacordada no andar superior do castelo.
- Absolutamente certo minha bruxa pirocinética, ele muito bem poderia ter transformado você em vampira se quisesse, mas pelo que eu fiquei sabendo ele queria mesmo era matá-la - Wilbur respondeu olhando de canto para a jaula de Karnstein, que estava acordado e com cara de poucos amigos, sem dizer uma única palavra desde que haviam saído do vilarejo.
Apenas de provocação, Maria olhou para a jaula e perguntou: - Não vai falar em sua defesa ou desaprendeu a falar?
- Naquela vez, eu teria te transformado junto com a Frieda, mas agora, eu irei matá-la junto com Anton e esses ridículos quando eu sair daqui - respondeu Karnstein já recuperado de seus ferimentos, mas sem ter como escapar de onde estava.
- Daqui você vai direto para Azkaban e lá vai passar toda a eternidade, sofrendo até desejar estar morto! - exclamou Wilbur furioso com a resposta desaforada do vampiro.
- Esse filho da puta merece é uma estaca! - berrou Lauzun.
Harold fez um sinal de interrupção e perguntou: - Quanto a Lucrecia, dá para acreditar mesmo que ela é uma vampira do bem? E ainda, foi Frieda quem a mordeu?
- Lamento dizer, mas Klemens estava certo quando disse que Frieda mordeu George e ainda, ela vampirizou Lucrecia, mas Arthur me disse telepaticamente que ela se arrependeu de ter permitido isso, mas que foi assim que ela pôde ajudá-lo a fugir, porque as correntes que prendiam os tornozelos do menino eram fortes demais - respondeu Wilbur ainda muito surpreso com a atitude benevolente da irmã de George Witcherwell.
Harold lembrou-se que a agora vampira Lucrecia Witcherwell tinha sido casada e havia engravidado 12 anos antes, mas que o bebê tinha morrido sete meses após nascer, o que deixou a rica inglesa de luto por muito tempo. Porém, o holandês desconfiava de algo sobre a morte do bebê Wenzel Witcherwell McCameron, afinal, ninguém além do pai, que abandonou Lucrecia e foi misteriosamente assassinado um ano depois do “óbito” da criança, tinha visto o corpo.
- Meu Deus, como George pôde ser tão cruel a ponto de permitir isso?! - perguntou Klemens em seu tom falsamente feminino.
- George terá seu merecido castigo quando o encontrarmos, Wolff vai se arrepender do dia que nasceu e Frieda, ah, essa vagabunda também irá para o inferno! - respondeu Wilbur, profundamente revoltado com tudo o que soubera e vira até ali.
Enquanto isso, Jules, o cocheiro corcunda, chegava com Lucrecia e Arthur ao porto da cidade, de onde se tinha acesso ao secreto mundo bruxo, do qual Lucrecia tinha ficado sabendo ao testemunhar uma mulher entrando por uma passagem secreta em Londres quando era menina.
- Vou te levar a uma casa que eu conheço e lá você vai ficar até eu conseguir buscar suas irmãs e sua mãe e daqui todos vocês irão de volta para onde vieram - disse Lucrecia, conduzindo o menino pela grande Wien Hexe (Viena Bruxa), cujo acesso ela conseguira porque seu criado Jules era um bruxo mestiço, algo do qual George não sabia.
- Mas como você vai conseguir, o Wolff prendeu todos em lugares diferentes e ainda, ele é muito poderoso, vai te matar se souber que você nos soltou! - respondeu Arthur apavorado.
- Não se preocupe Arthur, eu encontrei a localização de suas irmãs e sua mãe quando fui pegar sua varinha no quarto do Tutchenko, agora é só eu e Jules irmos pegá-los e vocês todos estarão a salvo e quanto ao Wolff, fique calmo - disse Lucrecia, disposta até a matar o bruxo do mal se fosse o caso.
Já no final da Wien Hexe, Lucrecia, Jules e Arthur entravam em uma casa que parecia uma pensão, mas que na verdade era o bar “Velho Burgomestre”, onde os bruxos daquela cidade se reuniam para beber e conversar.
O cocheiro corcunda se aproximou do balcão e perguntou ao atendente se havia por acaso um quarto disponível e ele respondeu que sim, sorrindo ao reconhecer o bruxo e indo chamar o dono do bar ao que a vampira ruiva Lucrecia disse: - Você vai ficar aqui e vai melhorar, mas sob nenhuma hipótese saia enquanto eu não trouxer sua mãe e irmãs.
Arthur assentiu com a cabeça e em seguida Lucrecia puxou Jules pelo braço dizendo: - Ainda temos trabalho a fazer!
Juntos, eles foram onde se encontravam presas as irmãs de Arthur, Corinna e Elizabeth e com a ajuda de uma fatal picaretada dada por Lucrecia na parte de trás na cabeça do guarda bruxo, as soltaram e puseram sãs e salvas na carruagem , embora machucadas pelas correntes que as prendiam, seguindo para o local em que estava presa a mãe dele, Louise e lá chegando, soltaram-na com a ajuda do inesperado dom musical de Elizabeth, que fez o guarda ficar completamente hipnotizado.
Porém, enquanto saíam, acabaram surpreendidos por Klaus Wolff, que furioso com a ousadia dos dois que haviam soltado as três, sacou a poderosa varinha para matar eles e mais as ex-prisioneiras, esquecendo completamente o acordo com Christopher Raven, quando de repente, Lucrecia saltou rapidamente e com toda a fúria no pescoço dele, arrancando um pedaço deste com uma forte mordida, fazendo jorrar muito sangue, o que causou morte quase imediata para o bruxo das trevas, deixando as três bruxas Raven apavoradas com tal cena.
- Perdoem-me, mas eu não tive escolha, éramos nós ou ele - disse Lucrecia saindo de cima do cadáver e observando-o, ao mesmo tempo em que usava um lenço para limpar o sangue que escorria pela boca, queixo e pescoço.
Ao mesmo tempo, as três bruxas observavam impressionadas que uma mudança havia acontecido ao cocheiro de Lucrecia: antes corcunda e muito feio, ele havia se transformado em um belo rapaz. Ao se virar para ordenar que Jules levasse todos para o “Velho Burgomestre”, surpreendeu-se ao vê-lo tão diferente, mesmo reconhecendo-o pelas roupas de cocheiro.
- Como...?! - Lucrecia não pôde terminar de perguntar, tamanho seu espanto.
- Se Klaus Wolff morresse, segundo o que um sábio bruxo me disse anos atrás, a maldição que ele jogou em minha mãe enquanto ela me esperava terminaria e como você o matou, ela acabou - disse ele sorrindo para Lucrecia.
Louise olhou o rapaz atentamente e disse impressionada: - Todo o mundo bruxo europeu sabia do que aquele biltre fez com sua pobre mãe quando seu pai recusou-se a ajudá-lo, jogou uma horrível maldição em sua mãe, te transformando em um corcunda quando você fizesse 15 anos e agora, com ele morto, tudo voltou ao normal em sua vida graças a Deus.
- Não só na vida dele, mas também na de muitos outros que foram vítimas desse desgraçado - disse Corinna furiosa, cuspindo no agora cadáver Klaus Wolff.
- Corinne, não faça isso, é um sacrilégio! - disse Elizabeth horrorizada.
- Melhor irmos antes que outros percebam a confusão e venha uma multidão para cá - disse Lucrecia fazendo sinal para que todos fossem para a carruagem.
Enquanto Jules levava Lucrecia para casa depois de deixar todos os Ravens no bar bruxo da Wien Hexe, George estava enlouquecido de fúria e Frieda estava aos berros por saber que Arthur Raven tinha escapado do cativeiro, perguntando quem o tinha ajudado a fugir e jurando que quando descobrisse, o culpado pagaria com a vida.
- Patroa, eu posso jurar que deixei tudo muito bem trancado, inclusive eu acorrentei o corpo todo dele hoje! Até mesmo mostrei para a senhora! - disse Tutchenko, que como Frieda, estava furioso.
- Eu vi, não precisa ficar se justificando, afinal eu sei que você nunca o soltaria, mas eu quero saber quem foi, porque sozinho aquele pequeno sacripanta não escaparia! - Frieda continuava berrando.
- De repente algum amigo bruxo do olhinho azul bretão veio salvar o menino se aproveitando que não tinha ninguém por aqui, afinal, dizem que tem magia de tudo que é coisa - disse Sukenna dando uma sugestão.
- A Sukenna pode estar certa, mas, como isso aconteceria se ninguém sabia que ele estava aqui? - Frieda parou os berros para que sua linha de pensamento funcionasse.
Todos ficaram em silêncio até que George disse: - Esse garotinho deve ter se comunicado com alguém, só pode ter sido isso, porque uma vez ouvi dizer que existem bruxos que são telepatas!
Tutchenko e Sukenna ficaram espantados enquanto Frieda pensava nos momentos em que esteve com o prisioneiro ou que o tinha visto, quando se lembrou: - Houve um dia em que esse sacripantazinho estava falando sozinho, como se estivesse se comunicando com alguém! Agora entendo, certamente ele deve ser telepata e estava usando a mente para se comunicar e conseqüentemente conseguir alguém que o resgatasse!
- Eu devia tê-lo mantido dormindo, eu devia! - gritava George se sentindo um idiota por não ter percebido o dom do menino.
- Agora não adianta mais nada, o problema agora é quando o Wolff souber disso, vai ficar furioso conosco, afinal você se comprometeu a deixá-lo aqui enquanto o acordo secreto entre ele e o tal Raven não se concretizasse - disse Frieda enquanto sentava garbosamente em uma cadeira forrada de veludo.
- E a mãe e as irmãs do menino? - perguntou Tutchenko.
- Certamente que foram ou ainda serão resgatadas, então temos que alertar o Wolff enquanto ainda dá tempo, porque ninguém é louco de recuperar alguém sem ter um plano para tal, embora tenha as localizações que roubou das coisas do Tutchenko... - Sukenna dizia, quando de repente ouviu a sineta da porta.
Atendendo a porta depois de ouvi-la, Sukenna o cumprimentou e perguntou o que ele desejava.
- É aqui que moram Sir George e Lady Frieda Witcherwell? - perguntou o homem, cuja roupa dizia que ele era algum criado.
- Sim, eu sou Sir George e esta é minha esposa, Lady Frieda - respondeu o britânico sorrindo ao escutar o criado chamando a vampira de “Lady”.
- Infelizmente, o motivo de minha visita é comunicar-lhes que meu patrão foi assassinado esta tarde - disse o criado com extremo receio e em tom triste.
O espanto tomou conta de todos quando o assassinato de Klaus Wolff foi anunciado pelo criado ao que George perguntou: - Como isso aconteceu?!
- Pelo ferimento terrível que havia no pescoço dele, só pode ter sido um vampiro e pelo visto, o senhor Wolff não teve sequer tempo de dizer o feitiço que pensava em proferir, porque a varinha estava na mão, mas sem qualquer traço de magia - respondeu o criado.
- O vampiro que cometeu essa infâmia certamente deve ser muito rápido e ainda, esse desgraçado faliu pelo menos um quarto dos meus negócios! - exclamou George enfurecido não apenas pelo assassinato do amigo, como pelo fato de que ele era o único contato comercial que ele tinha em parte dos estados germânicos.
- Com essa parte o senhor não precisa se preocupar, o patrão lhe deixou bons contatos nos estados germânicos e ainda, como ele não tinha filhos ou família, dividiu a herança dele entre eu e vocês: eu, ficando com a conta que ele tinha no banco e você e sua esposa ficando com a casa, os móveis e as jóias que ele tinha - disse ele tirando do bolso uma carta-testamento feita pelo bruxo e dando a George, cuja leitura feita pelos perspicazes olhos dele confirmou a fala do criado, que em seguida deu as condolências e anunciou sua partida.
- Deixe que nós o levemos ao portão, meu bom senhor - disse Frieda sorrindo e dando o braço ao marido, deixando muito claro aos olhos dos criados o que faria.
Os dois riram levemente e se despediram do criado sorrindo e passados quase vinte minutos, Frieda e George voltaram limpando os lábios sujos com um lenço e com a vampira dizendo: - O criado podia estar um pouco passado da idade, mas o sangue estava delicioso.
- Você soube mesmo como unir o útil ao agradável, nós estamos bem alimentados e temos toda a fortuna do Wolff só para nós - George riu muito.
- Aquele criado iria certamente gastar toda a conta do ex-patrão com bebidas e mulheres, é isso que os pobretões idiotas fazem quando ganham uma herança, brevemente ficam pobres de novo, não sabem tirar o melhor proveito do dinheiro, por isso os ricos ficam cada vez mais ricos! - ria Frieda terminando de limpar os lábios.
Em seguida George ordenou que Tutchenko se livrasse do corpo do criado de Wolff e imediatamente o siberiano foi cumprir as ordens do patrão enquanto Lucrecia pedira a Jules que voltasse uma última vez para a casa de George, de onde, de dentro da carroça, se despediu com um aceno e um pensamento:
- Pelo meu filho que Deus levou tão cedo, sua puta amaldiçoada, juro que você irá pagar cada mau trato a que submeteu o pequeno Arthur! E George, me perdoe, mas você carregará esse fardo sozinho agora.
O som das rodas da carroça que longe desejava ir misturado ao vento que sacudia as cortinas da carruagem parecia dizer que finalmente o destino estava conspirando contra a tão perversa vampira que tão garbosamente e luxuosamente se gabava de sua tão bela sorte.
- Meu Deus, como pode o Imperador gastar tanto dinheiro fazendo essas obras e deixar os pobres à própria sorte?! - perguntava Wilbur horrorizado.
- Eles ainda por cima pagam os absurdos impostos cobrados por esse monstro sob pena de apodrecerem na cadeia apenas para manter os luxos absurdos da nobreza ociosa e parasitária que o cerca e o pior de tudo é que nessa nobreza certamente aquele biltre britânico está incluído ao lado daquela porca luxuriosa! - exclamou Levine furioso, porém em baixo tom.
- De nada adianta ficarmos divagando, o melhor que podemos fazer nesse caso é ajudar essas pessoas com pelo menos um pão sobre a mesa - disse Harold um tanto triste e pensando em como podia ver aquilo sem poder fazer muita coisa.
Klemens estava furioso com as cantadas que recebia devido ao seu perfeito disfarce de cigana, porém acostumava-se com aquela situação para salvar seus amigos e a bela e futura cidade que se desenvolvia.
Maria e Anton ficavam sempre juntos, ainda que isso deixasse Lauzun um tanto constrangido, afinal de contas, nem casados eles eram ainda, porém, Anton queria matar Frieda para impedir seus maléficos planos.
Ao mesmo tempo, Frieda aproveitava-se das saídas de George e dos descansos longos da cunhada Lucrecia para ir para a cama com o Marquês de Munchaünsen na casa deste, onde passava horas se divertindo sexualmente com ele e de onde ia embora usando seus poderes de vampira, de modo que ninguém percebesse que ela traía o “marido”, porém, ela nem desconfiava que seus planos talvez estivessem a um passo de serem arruinados.
Enquanto isso, em uma parte secreta da casa de George Witcherwell, o pequeno Arthur Raven estava acorrentado pelos pés e tinha tido sua varinha escondida pelo bruxo Klaus Wolff.
- Isso dói muito moço, pode pelo menos soltar um pouco as correntes? - disse o menino sentindo muita dor no tornozelo.
- O senhor Witcherwell deu ordens expressas para que eu não o soltasse até a hora dele voltar, afinal, você já tentou fugir várias vezes e não quero correr de novo esse risco - sorriu o cruel Tutchenko.
Lucrecia ouviu a conversa e não conseguia evitar a tristeza, pois o pequeno Arthur tinha a idade que teria o filho dela caso este não tivesse morrido aos sete meses vítima de pneumonia. Levava comida às escondidas para o menino, pois não o queria passando fome.
Aquela vampira inglesa ainda possuía uma ponta de bondade, pois não podia evitar pensar quando via o menino: - Se você não tivesse família, eu juro que te adotava pequeno, você tem a idade que teria o meu Wenzel se ele tivesse ficado vivo.
Todas as vezes que Arthur via os pensamentos de benevolência dela e dizia que gostava de Lucrecia, ela se perguntava por que tinha sido tão má a vida toda, até mesmo se arrependendo de seus atos passados e de ter se deixado virar vampira. Ela sabia como Frieda era cruel e impiedosa, inclusive a vampira chegara a ponto de esbofetear o rosto do menino e ameaçá-lo com um ferro em brasa apenas para torturá-lo.
- Onde eu estava com a cabeça quando permiti que Frieda fizesse isso comigo me deixando levar por aquela beleza angelical dela? - Lucrecia se perguntava ao chegar ao seu quarto e ver seu mundo cair, no melhor estilo da fossa moderna de Maysa e continuava divagando: - Porém, talvez assim eu consiga ter mais chances de fazer algo melhor pelo menino. Eu sempre imaginei que aquela vampira era perversa, mas nem tanto assim! Meu Deus, como ela pode odiar tanto um menino como aquele? Uma criança tão linda sofrendo daquela forma nas mãos daquele monstro! - até que decidiu:
- Mesmo que Frieda me dê uma estaca no meio do peito, eu tiro Arthur daqui! Não posso continuar vendo isso e não fazer nada além de levar comida escondida para ele!
Imediatamente, Lucrecia, se aproveitando que naquela hora o criado siberiano sumia sem dizer aonde ia, foi ao quarto dele, onde ela sabia que estava guardada a varinha do menino e um papel onde estavam escritas as localizações da mãe e irmãs dele, e pegou-os, indo em seguida para o porão soltá-lo e ajudá-lo a escapar. Logo depois de soltar o menino, ela foi ao seu quarto e arrumou suas roupas, jóias e outros pertences, disposta a ir embora em definitivo depois de deixar Arthur e sua família sãos e salvos.
Surpreso ao se perceber livre, Arthur agradeceu muitas vezes abraçando fortemente Lucrecia, que achou melhor usar a cocheira para levá-lo, porque com os tornozelos machucados e as pernas doendo ele não iria longe.
- Vou te levar para um lugar que eu conheço e lá você vai melhorar dos seus machucados e quanto ao Klaus Wolff, caso ele pergunte, não se preocupe, darei um jeito - disse Lucrecia enquanto colocava o menino dentro da cocheira.
- Por que está me ajudando? - perguntou Arthur achando que talvez não devesse.
- Se o filho que eu tive estivesse vivo hoje, ele teria sua idade - respondeu Lucrecia sorrindo.
- Eu queria saber por que minha mamãe me deixou quando eu era bebê, embora o meu papai sempre diga que mesmo eu não tendo nascido da mamãe sempre vou ser filho deles - disse o pequeno abraçado com Lucrecia enquanto o cocheiro Jules cumpria as ordens da patroa.
Lucrecia não pôde evitar uma expressão de surpresa quando soube que o pequeno Arthur era filho adotivo de Christopher e Louise Raven: - Então você sonha em reencontrar seus pais verdadeiros e saber por que você foi deixado, eu imagino, afinal todos nós queremos saber nossas origens.
Ao mesmo tempo, o falso circo estava se alimentando e conversando sobre como procederiam na cidade, quando Wilbur, recebendo uma mensagem telepática, disse muito surpreso: - Lucrecia Witcherwell está levando Arthur para um local que ela conhece, embora eu não entenda porque ela o está ajudando.
Os membros da Irmandade que ali estavam quase se engasgaram com a comida ao ouvirem o que o bruxo de cãs tinha dito enquanto Maria e Anton imaginavam com uma mulher tísica estaria em condições de ajudar alguém.
- Arthur acabou de me dizer que Lucrecia é uma vampira do bem e que se o bebê dela estivesse vivo, teria a idade dele - falou Wilbur tão surpreso que as palavras saíam em separação silábica.
Lauzun disse com desconfiança: - Por acaso existe algum vampiro que seja do bem? Sinceramente, não acredito nisso até que me provem o contrário.
- Você pode não acreditar meu amigo franco-austríaco, mas muitos vampiros são do bem e não bebem sangue humano, isso graças a um grande e bondoso vampiro chamado Carlisle Cullen - respondeu Wilbur, que a noite iria escrever uma carta para o amigo morto-vivo da Inglaterra.
- Vampiros do bem, Carlisle Cullen?! - Harold perguntou espantado e os outros, sendo Lauzun o mais espantado, imediatamente olharam como se tivessem visto um animal raro.
- Cullen é muito conhecido entre os bruxos por ter difundido a filosofia de que os humanos não devem ser apenas um alimento para os vampiros e que o equilíbrio entre as raças é muito importante para a manutenção do mundo tal como ele é - sorriu Wilbur ao falar do vampiro britânico que desde o século 17 aparentava ter 23 anos.
Klemens olhou para Wilbur e perguntou com sua curiosidade médica: - Mas não é o sangue humano que mantém os vampiros com a aparência cheia de vida?
- Essa e algumas outras teorias são uma mentira sem tamanho, inclusive a história de que todo o vampiro possui colmilhos grandes, pois Carlisle e outros não os possuem, embora existam os que os têm, mas isso varia muito, embora essa variação nunca tenha sido explicada - respondeu Wilbur olhando todos como se fosse professor de uma escola primária.
- Entre essas mentiras se inclui a de que uma pessoa pura mordida por um vampiro morre e a não pura se transforma? - perguntou Maria lembrando o que seu noivo contou a ela, de ter quase sido mordida por Karnstein enquanto estava desacordada no andar superior do castelo.
- Absolutamente certo minha bruxa pirocinética, ele muito bem poderia ter transformado você em vampira se quisesse, mas pelo que eu fiquei sabendo ele queria mesmo era matá-la - Wilbur respondeu olhando de canto para a jaula de Karnstein, que estava acordado e com cara de poucos amigos, sem dizer uma única palavra desde que haviam saído do vilarejo.
Apenas de provocação, Maria olhou para a jaula e perguntou: - Não vai falar em sua defesa ou desaprendeu a falar?
- Naquela vez, eu teria te transformado junto com a Frieda, mas agora, eu irei matá-la junto com Anton e esses ridículos quando eu sair daqui - respondeu Karnstein já recuperado de seus ferimentos, mas sem ter como escapar de onde estava.
- Daqui você vai direto para Azkaban e lá vai passar toda a eternidade, sofrendo até desejar estar morto! - exclamou Wilbur furioso com a resposta desaforada do vampiro.
- Esse filho da puta merece é uma estaca! - berrou Lauzun.
Harold fez um sinal de interrupção e perguntou: - Quanto a Lucrecia, dá para acreditar mesmo que ela é uma vampira do bem? E ainda, foi Frieda quem a mordeu?
- Lamento dizer, mas Klemens estava certo quando disse que Frieda mordeu George e ainda, ela vampirizou Lucrecia, mas Arthur me disse telepaticamente que ela se arrependeu de ter permitido isso, mas que foi assim que ela pôde ajudá-lo a fugir, porque as correntes que prendiam os tornozelos do menino eram fortes demais - respondeu Wilbur ainda muito surpreso com a atitude benevolente da irmã de George Witcherwell.
Harold lembrou-se que a agora vampira Lucrecia Witcherwell tinha sido casada e havia engravidado 12 anos antes, mas que o bebê tinha morrido sete meses após nascer, o que deixou a rica inglesa de luto por muito tempo. Porém, o holandês desconfiava de algo sobre a morte do bebê Wenzel Witcherwell McCameron, afinal, ninguém além do pai, que abandonou Lucrecia e foi misteriosamente assassinado um ano depois do “óbito” da criança, tinha visto o corpo.
- Meu Deus, como George pôde ser tão cruel a ponto de permitir isso?! - perguntou Klemens em seu tom falsamente feminino.
- George terá seu merecido castigo quando o encontrarmos, Wolff vai se arrepender do dia que nasceu e Frieda, ah, essa vagabunda também irá para o inferno! - respondeu Wilbur, profundamente revoltado com tudo o que soubera e vira até ali.
Enquanto isso, Jules, o cocheiro corcunda, chegava com Lucrecia e Arthur ao porto da cidade, de onde se tinha acesso ao secreto mundo bruxo, do qual Lucrecia tinha ficado sabendo ao testemunhar uma mulher entrando por uma passagem secreta em Londres quando era menina.
- Vou te levar a uma casa que eu conheço e lá você vai ficar até eu conseguir buscar suas irmãs e sua mãe e daqui todos vocês irão de volta para onde vieram - disse Lucrecia, conduzindo o menino pela grande Wien Hexe (Viena Bruxa), cujo acesso ela conseguira porque seu criado Jules era um bruxo mestiço, algo do qual George não sabia.
- Mas como você vai conseguir, o Wolff prendeu todos em lugares diferentes e ainda, ele é muito poderoso, vai te matar se souber que você nos soltou! - respondeu Arthur apavorado.
- Não se preocupe Arthur, eu encontrei a localização de suas irmãs e sua mãe quando fui pegar sua varinha no quarto do Tutchenko, agora é só eu e Jules irmos pegá-los e vocês todos estarão a salvo e quanto ao Wolff, fique calmo - disse Lucrecia, disposta até a matar o bruxo do mal se fosse o caso.
Já no final da Wien Hexe, Lucrecia, Jules e Arthur entravam em uma casa que parecia uma pensão, mas que na verdade era o bar “Velho Burgomestre”, onde os bruxos daquela cidade se reuniam para beber e conversar.
O cocheiro corcunda se aproximou do balcão e perguntou ao atendente se havia por acaso um quarto disponível e ele respondeu que sim, sorrindo ao reconhecer o bruxo e indo chamar o dono do bar ao que a vampira ruiva Lucrecia disse: - Você vai ficar aqui e vai melhorar, mas sob nenhuma hipótese saia enquanto eu não trouxer sua mãe e irmãs.
Arthur assentiu com a cabeça e em seguida Lucrecia puxou Jules pelo braço dizendo: - Ainda temos trabalho a fazer!
Juntos, eles foram onde se encontravam presas as irmãs de Arthur, Corinna e Elizabeth e com a ajuda de uma fatal picaretada dada por Lucrecia na parte de trás na cabeça do guarda bruxo, as soltaram e puseram sãs e salvas na carruagem , embora machucadas pelas correntes que as prendiam, seguindo para o local em que estava presa a mãe dele, Louise e lá chegando, soltaram-na com a ajuda do inesperado dom musical de Elizabeth, que fez o guarda ficar completamente hipnotizado.
Porém, enquanto saíam, acabaram surpreendidos por Klaus Wolff, que furioso com a ousadia dos dois que haviam soltado as três, sacou a poderosa varinha para matar eles e mais as ex-prisioneiras, esquecendo completamente o acordo com Christopher Raven, quando de repente, Lucrecia saltou rapidamente e com toda a fúria no pescoço dele, arrancando um pedaço deste com uma forte mordida, fazendo jorrar muito sangue, o que causou morte quase imediata para o bruxo das trevas, deixando as três bruxas Raven apavoradas com tal cena.
- Perdoem-me, mas eu não tive escolha, éramos nós ou ele - disse Lucrecia saindo de cima do cadáver e observando-o, ao mesmo tempo em que usava um lenço para limpar o sangue que escorria pela boca, queixo e pescoço.
Ao mesmo tempo, as três bruxas observavam impressionadas que uma mudança havia acontecido ao cocheiro de Lucrecia: antes corcunda e muito feio, ele havia se transformado em um belo rapaz. Ao se virar para ordenar que Jules levasse todos para o “Velho Burgomestre”, surpreendeu-se ao vê-lo tão diferente, mesmo reconhecendo-o pelas roupas de cocheiro.
- Como...?! - Lucrecia não pôde terminar de perguntar, tamanho seu espanto.
- Se Klaus Wolff morresse, segundo o que um sábio bruxo me disse anos atrás, a maldição que ele jogou em minha mãe enquanto ela me esperava terminaria e como você o matou, ela acabou - disse ele sorrindo para Lucrecia.
Louise olhou o rapaz atentamente e disse impressionada: - Todo o mundo bruxo europeu sabia do que aquele biltre fez com sua pobre mãe quando seu pai recusou-se a ajudá-lo, jogou uma horrível maldição em sua mãe, te transformando em um corcunda quando você fizesse 15 anos e agora, com ele morto, tudo voltou ao normal em sua vida graças a Deus.
- Não só na vida dele, mas também na de muitos outros que foram vítimas desse desgraçado - disse Corinna furiosa, cuspindo no agora cadáver Klaus Wolff.
- Corinne, não faça isso, é um sacrilégio! - disse Elizabeth horrorizada.
- Melhor irmos antes que outros percebam a confusão e venha uma multidão para cá - disse Lucrecia fazendo sinal para que todos fossem para a carruagem.
Enquanto Jules levava Lucrecia para casa depois de deixar todos os Ravens no bar bruxo da Wien Hexe, George estava enlouquecido de fúria e Frieda estava aos berros por saber que Arthur Raven tinha escapado do cativeiro, perguntando quem o tinha ajudado a fugir e jurando que quando descobrisse, o culpado pagaria com a vida.
- Patroa, eu posso jurar que deixei tudo muito bem trancado, inclusive eu acorrentei o corpo todo dele hoje! Até mesmo mostrei para a senhora! - disse Tutchenko, que como Frieda, estava furioso.
- Eu vi, não precisa ficar se justificando, afinal eu sei que você nunca o soltaria, mas eu quero saber quem foi, porque sozinho aquele pequeno sacripanta não escaparia! - Frieda continuava berrando.
- De repente algum amigo bruxo do olhinho azul bretão veio salvar o menino se aproveitando que não tinha ninguém por aqui, afinal, dizem que tem magia de tudo que é coisa - disse Sukenna dando uma sugestão.
- A Sukenna pode estar certa, mas, como isso aconteceria se ninguém sabia que ele estava aqui? - Frieda parou os berros para que sua linha de pensamento funcionasse.
Todos ficaram em silêncio até que George disse: - Esse garotinho deve ter se comunicado com alguém, só pode ter sido isso, porque uma vez ouvi dizer que existem bruxos que são telepatas!
Tutchenko e Sukenna ficaram espantados enquanto Frieda pensava nos momentos em que esteve com o prisioneiro ou que o tinha visto, quando se lembrou: - Houve um dia em que esse sacripantazinho estava falando sozinho, como se estivesse se comunicando com alguém! Agora entendo, certamente ele deve ser telepata e estava usando a mente para se comunicar e conseqüentemente conseguir alguém que o resgatasse!
- Eu devia tê-lo mantido dormindo, eu devia! - gritava George se sentindo um idiota por não ter percebido o dom do menino.
- Agora não adianta mais nada, o problema agora é quando o Wolff souber disso, vai ficar furioso conosco, afinal você se comprometeu a deixá-lo aqui enquanto o acordo secreto entre ele e o tal Raven não se concretizasse - disse Frieda enquanto sentava garbosamente em uma cadeira forrada de veludo.
- E a mãe e as irmãs do menino? - perguntou Tutchenko.
- Certamente que foram ou ainda serão resgatadas, então temos que alertar o Wolff enquanto ainda dá tempo, porque ninguém é louco de recuperar alguém sem ter um plano para tal, embora tenha as localizações que roubou das coisas do Tutchenko... - Sukenna dizia, quando de repente ouviu a sineta da porta.
Atendendo a porta depois de ouvi-la, Sukenna o cumprimentou e perguntou o que ele desejava.
- É aqui que moram Sir George e Lady Frieda Witcherwell? - perguntou o homem, cuja roupa dizia que ele era algum criado.
- Sim, eu sou Sir George e esta é minha esposa, Lady Frieda - respondeu o britânico sorrindo ao escutar o criado chamando a vampira de “Lady”.
- Infelizmente, o motivo de minha visita é comunicar-lhes que meu patrão foi assassinado esta tarde - disse o criado com extremo receio e em tom triste.
O espanto tomou conta de todos quando o assassinato de Klaus Wolff foi anunciado pelo criado ao que George perguntou: - Como isso aconteceu?!
- Pelo ferimento terrível que havia no pescoço dele, só pode ter sido um vampiro e pelo visto, o senhor Wolff não teve sequer tempo de dizer o feitiço que pensava em proferir, porque a varinha estava na mão, mas sem qualquer traço de magia - respondeu o criado.
- O vampiro que cometeu essa infâmia certamente deve ser muito rápido e ainda, esse desgraçado faliu pelo menos um quarto dos meus negócios! - exclamou George enfurecido não apenas pelo assassinato do amigo, como pelo fato de que ele era o único contato comercial que ele tinha em parte dos estados germânicos.
- Com essa parte o senhor não precisa se preocupar, o patrão lhe deixou bons contatos nos estados germânicos e ainda, como ele não tinha filhos ou família, dividiu a herança dele entre eu e vocês: eu, ficando com a conta que ele tinha no banco e você e sua esposa ficando com a casa, os móveis e as jóias que ele tinha - disse ele tirando do bolso uma carta-testamento feita pelo bruxo e dando a George, cuja leitura feita pelos perspicazes olhos dele confirmou a fala do criado, que em seguida deu as condolências e anunciou sua partida.
- Deixe que nós o levemos ao portão, meu bom senhor - disse Frieda sorrindo e dando o braço ao marido, deixando muito claro aos olhos dos criados o que faria.
Os dois riram levemente e se despediram do criado sorrindo e passados quase vinte minutos, Frieda e George voltaram limpando os lábios sujos com um lenço e com a vampira dizendo: - O criado podia estar um pouco passado da idade, mas o sangue estava delicioso.
- Você soube mesmo como unir o útil ao agradável, nós estamos bem alimentados e temos toda a fortuna do Wolff só para nós - George riu muito.
- Aquele criado iria certamente gastar toda a conta do ex-patrão com bebidas e mulheres, é isso que os pobretões idiotas fazem quando ganham uma herança, brevemente ficam pobres de novo, não sabem tirar o melhor proveito do dinheiro, por isso os ricos ficam cada vez mais ricos! - ria Frieda terminando de limpar os lábios.
Em seguida George ordenou que Tutchenko se livrasse do corpo do criado de Wolff e imediatamente o siberiano foi cumprir as ordens do patrão enquanto Lucrecia pedira a Jules que voltasse uma última vez para a casa de George, de onde, de dentro da carroça, se despediu com um aceno e um pensamento:
- Pelo meu filho que Deus levou tão cedo, sua puta amaldiçoada, juro que você irá pagar cada mau trato a que submeteu o pequeno Arthur! E George, me perdoe, mas você carregará esse fardo sozinho agora.
O som das rodas da carroça que longe desejava ir misturado ao vento que sacudia as cortinas da carruagem parecia dizer que finalmente o destino estava conspirando contra a tão perversa vampira que tão garbosamente e luxuosamente se gabava de sua tão bela sorte.
terça-feira, 28 de abril de 2009
100 escovadas antes de ir para a cama
Baseado no filme "As noivas do vampiro" (1960)
Os silêncios são sonoros, eu penso enquanto escovo os cabelos ruivos mais uma vez 100 vezes antes de dormir, nunca conseguindo esquecer o grande infortúnio que se abateu em minha vida há cinco anos.
Essa frase ecoa em minha mente e penso o quão parece absurda, mas ela não o é, pois em meu quarto o silêncio é tão grande que posso ouvir até as asas de uma mosca batendo, ruído que não pode ser ouvido diante de tantos outros que são mais altos à noite, como os dos grilos. Tudo que eu queria era voltar atrás, evitar que isso tivesse acontecido, quem sabe se eu não tivesse escutado o seu chamado, o soltado daqueles grilhões dourados, por ele me apaixonado e dele me tornado noiva, talvez eu não me sentisse o pior dos seres humanos.
Também, me sinto a responsável pela morte de pessoas que nada tinham a ver com aquela amaldiçoada história de alguém preso na própria casa por representar uma ameaça às vidas de muitas outras.
Eu faria qualquer coisa para esquecer esses fatos tristes, mas também faria para tê-lo de volta, pois, apesar de tudo, eu ainda o amo, com toda a minha alma e o meu coração. Por isso me sinto tão dividida entre o sagrado e o profano, o bem e o mal, a moral e o imoral, a carne e o espírito, tantas antíteses que nem consigo contá-las, tantas que minha sanidade parece me fugir em alguns momentos.
Sinto que ele retornou, porém não me procurou ainda. Parece que o homem, ou vampiro, que amo não tem coragem para me encarar depois de tudo o que aconteceu, sinceramente eu não compreendo, ele me parecia tão frio e cruel na hora de cometer seus atos e agora, não possui a honestidade para pelo menos me dar alguma explicação.
Faltam 20 escovadas ainda para terminar o ritual feito sempre há mesma hora antes do sono e de repente, escuto o vidro da janela de meu quarto quebrando, exatamente como cinco anos atrás.
Olhando para trás, eu novamente o vejo tão loiro e tão lindo como no primeiro dia, seus olhos castanhos conservando o mesmo olhar vampiro daquela época e sua altivez sendo a mesma, nada tinha mudado, assim como eu.
Corro até os seus braços e não hesito em aceitar o beijo que ele dá em meus lábios, aquele que reinicia nosso amor e une os nossos corações para todo o sempre, sem se importar com as tantas antíteses que cercam a vida de um ser humano.
quarta-feira, 22 de abril de 2009
Frieda, a Vampira - Volume 1: A nobreza despida (1814 - 1854) - Capítulo 8: Preparativos
Dia seguinte na vila bruxa-trouxa, a Irmandade, Anton, Maria e alguns bruxos liderados pelo padre Constantino, incluindo o ainda machucado bruxo advogado Dr. Christopher Raven e seu criado Bernard, estavam reunidos na pequena praça para formar a equipe que iria resgatar a família do advogado bruxo onde queria que ela estivesse.
O caos verbal estava presente quando Harold fez sinal para todos se calarem e disse: - Ontem procurei alguém que tivesse o dom da telepatia e encontrei este, Wilbur Dulroney, que mora no fim do vilarejo e me disse que irá ajudar nas buscas - apresentando um homem que aparentava ter pouco mais do que 65 anos e tinha a cabeça branca como a neve do inverno daquelas paragens.
- Digo com segurança que encontrarei a família do Dr. Raven esteja onde ela estiver - falou Wilbur sorrindo e disposto a ajudar.
Todos ficaram felizes sob os olhares esperançosos dos moradores, que se solidarizaram com a situação de Raven apesar de saberem que ele trouxera de volta o vampiro Karnstein.
Em seguida, o bruxo Dulroney se concentrou profundamente e ficou completamente imóvel durante vários minutos, deixando os irmãos e outras pessoas olhando curiosas para saber o que ia acontecer quando repentinamente, Wilbur abriu os olhos e disse:
- Encontrei o menino Arthur, ele está em Viena, na casa de um indivíduo chamado George Witcherwell e, além disso, o menino comunicou-me telepaticamente que o resto da família está presa em um lugar que ele não sabe.
- Até isso esse filho de uma meretriz teve coragem de fazer?! - exclamou Levine enfurecido com o ponto em que a maldade de George chegara.
- Meu Deus do céu, eu sempre soube que George era mau caráter, mas nunca imaginei que fosse capaz de deixar uma criança em cárcere privado acobertando um bruxo das trevas! - disse Ártemis Winchester com espanto e ali presente depois de dias ausente devido a uma forte gripe.
- Vindo dele pode se esperar tudo, eu não duvido até que Frieda já tenha mordido o desgraçado! - exclamou Klemens extremamente bravo.
- Mais do que nunca quero dar um tiro no peito daquele maldito! - gritou Harold disposto a se vingar do irmão traidor e dizendo em seguida: - Vire sua língua do avesso Klemens, três vampiros já é demais!
- Por Nossa Senhora, quem é esse homem que todos tanto odeiam?! - perguntou espantado Wilbur.
Lauzun tomou a palavra e contou tudo que acontecera até ali, o que deixou Dulroney ainda mais surpreso que antes: - Por luxúria, ódio e vingança, algumas pessoas cometem barbaridades que até o próprio Deus é capaz de duvidar.
Agora que sabiam onde estava o filho caçula de Raven, eles teriam de ir até Viena para resgatar o menino e o resto da família do bruxo das leis, porém Klemens falou com espanto: - Como vamos viajar para Viena nessa altura dos acontecimentos, já imaginaram se aquela prostituta ou aquele calhorda nos reconhecem?! Nós estaremos condenados, além do mais, uma viagem daqui até a capital do império demora pelo menos um mês ou mais!
- Ora, é para isso que usarei meus cavalos alados! - exclamou Wilbur com felicidade e em seguida dizendo: - Eles encurtarão nossa viagem em pelo menos três semanas, assim poderemos resgatar mais rápido a família do Dr. Raven e evitar que Frieda os delate ao Imperador!
- Foi Deus que permitiu que o senhor viesse com nossa caravana! - disse o padre Constantino com alegria.
- Ele não só me permitiu isso como me deu o privilégio de conviver com o bruxo mais santo desta terra! - retribuiu sorrindo Wilbur.
Todos comemoraram e muitos camponeses se ofereceram para fazer parte do grupo de resgate com suas armas e foices, porém Lauzun disse: - Vocês não devem se arriscar por nossa causa, pois fomos nós que causamos esse problema todo e somos nós que devemos resolvê-lo.
- Como assim problema?! O que fizemos foi para livrar nossa terra do mal! - exclamou Wolffenbüttel ouvindo aquilo.
- Em todos esses dias pensei no que fazíamos quando Gustav ainda era o líder e cheguei à conclusão que combatíamos o mal pelo lado errado, matamos as pessoas erradas e poderíamos ter evitado o que está acontecendo agora se não tivéssemos ouvido tanto o Weil - respondeu Lauzun com absoluta firmeza.
Vários companheiros do austríaco ficaram indignados, pois além de se sentirem insultados com aquelas palavras, não aceitavam aquela “invasão” de bruxos e menos ainda que os outros conservadores aceitassem de bom grado a liderança do liberal Harold, as mudanças que este colocara e o curto discurso de arrependimento de Lauzun, especialmente Wolffenbüttel, desejando estrangulá-lo.
Enquanto isso Karnstein comia o pão que o diabo amassou, preso e amarrado em uma cela mágica que deixava o poder dele enfraquecido ao mesmo tempo em que vários camponeses iam até a cadeia só para rir dele e humilhá-lo, se aproveitando da penosa condição em que ele se encontrava, sequer podendo dizer algo em sua defesa.
Na casa paroquial, a Irmandade, Anton Hoffer e o Padre Constantino reuniram-se com Wilbur, Raven e Bernard para acertar os últimos detalhes da viagem que serviria para resgatar a família raptada do advogado bruxo.
- Como disse àquela hora, uma viagem para Viena nessa altura dos fatos vai nos pôr em perigo! - disse Klemens querendo dissuadir todos da partida.
- É para isso que se usará a magia dos bruxos do bem, para evitar qualquer tipo de perigo e ainda por cima, encurtar nossa viagem - falou Harold rindo.
Klemens não teve como contra-argumentar enquanto Wilbur falou: - Além de usar meus cavalos alados, nós precisaremos de disfarces para evitar incômodos em Viena, pois como disse o irmão, George ou Frieda podem nos reconhecer, então temos de evitar ao máximo os problemas - e em seguida completou: - Também, temos um importante aliado em Viena, um Congresso que o Príncipe Von Metternich, assistente do Imperador, organizou para recolocar as famílias reais de volta em seus tronos, o que nos deixa em grande vantagem em relação ao George, pois o biltre não tem como falar com o Imperador.
Todos ficaram surpresos, até mesmo o padre e logo depois comemoraram, começando os preparativos da viagem sob os olhares dos camponeses que ficavam ouvindo atrás das portas para falar aos outros que tinham algo a mais para fazer.
Faltava um bom tempo para o casamento de Anton e Maria, que estavam mais felizes do que nunca e a bruxa mais que tudo queria se vingar da irmã gêmea Frieda por todos os apuros pelos quais havia passado por conta do péssimo caráter desta.
Na capital do Império Austríaco, Frieda tomava um delicioso chá com a cunhada Lucrecia contando sobre a inesperada chegada do Imperador perto dela dois dias atrás.
- Não posso crer nisso, realmente você tem muita sorte! - exclamou Lucrecia aos risos.
- E como tenho minha cunhada e dela usarei para conseguir tudo o que mais quero: ver a Maria, Anton e a Irmandade inteira na forca! - disse Frieda com muita maldade na voz e no olhar.
Lucrecia novamente riu enquanto o Marquês de Munchaünsen a olhava de sua casa, escutando espantado cada palavra que ela dizia: - Ah, esta mulher é um absoluto espetáculo de inteligência e beleza! Como pode existir mulher tão bela e ao mesmo tempo tão genial?!
- Perdoa minha interferência, senhor, mas ela pode ser uma criatura das trevas, pois não é possível que ela tenha conseguido deixar o Imperador tão louco assim, pois se o conheces bem, sabe que ele não é de se encantar facilmente pelas pessoas - falou o criado do nobre com certo espanto, porém completando com algo talvez óbvio demais: - Mas, a beleza nos cega realmente.
- Sabe que você pode ter razão, como não parei para ver isso antes? E se ela for mesmo isso que você diz, então eu preciso seduzi-la de qualquer jeito, afinal nela pode estar meu maior sonho: ser imortal! - exclamou feliz o marquês, cujo verdadeiro nome era Wenzel Von Hohenzollern, planejando durante uma hora um suntuoso jantar e depois subindo ao quarto para escrever um convite para George Witcherwell e a “esposa”, o que deixou o criado horrorizado.
Ao chegar ao seu quarto, depois de demorar a subir as escadas, ele se deparou com uma inesperada visão: a vampira Frieda Gelhorn deitada completamente desnuda em sua cama e as roupas desta cuidadosamente dobradas em uma cadeira ao lado.
- Não posso crer em meus olhos: você aqui, em minha cama! - exclamou Wenzel com espanto.
- Depois do que fez por mim dois dias atrás, era o mínimo que eu podia fazer para retribuir - disse ela rindo, se virando de bruços e roçando uma perna contra a outra em um gesto sensual.
- Você chama isso de mínimo?! É o máximo! - disse ele com absoluta alegria e se aproximando da vampira nua.
- Então tire a roupa e deite aqui comigo, me dê prazer - falou Frieda rindo e se virando de frente para ele, louca para ser possuída pelo belo marquês.
Ele despiu-se por inteiro rapidamente e deitou-se sobre o corpo dela, não poupando nenhuma parte dele de seu devasso desejo, lambendo, beijando e chupando sem parar um minuto sequer ao mesmo tempo em que ela não parava de gemer envolta nos braços dele. Além disso, permitia que ele lambesse seu corpo todo e fizesse o que bem entendesse.
- Continue - ria ela se virando de um lado para outro conforme ele ia, beijava, chupava e lambia.
- Oh Frieda, não sei como pôde ter vivido naquele fim de mundo do Vilarejo de Karnstein, é aqui seu lugar e como George já me disse, você é uma deusa, merece ser amada e adorada por todos, além de ganhar muitos presentes é claro - riu o nobre lambendo o pescoço dela e em seguida pegando em uma gaveta uma caixa repleta de jóias feitas em pérola.
O presente do riquíssimo nobre mostrava seu poder absoluto sobre os homens que dela se aproximavam e ela usaria aquele poder para completar sua vingança, mas também para ter ainda mais do que já tinha.
Eles continuavam com o sexo com tudo que tinha direito, até mesmo coisas mais devassas, ali, sem desconfiar que na casa de Frieda, Sabine, aproveitando a ausência de George, o descanso de Lucrecia e a saída de Tutchenko, arrumava suas coisas para ir embora dali para sempre e denunciar a Irmandade tudo o que a vampira planejava até mesmo o que ela fazia naquele momento no quarto do marquês, afinal ela sabia tudo o que a patroa fazia e dizia.
Logo que terminou de arrumá-las, Sabine saiu pela porta dos fundos e pulou o muro de trás da casa em direção à rua onde iria pegar carona com um mascate que vendia coisas por todos os lados até fora da cidade, em um matagal, onde ficaria escondida caso George fosse procurá-la. Andando pela rua, Sabine avistou Tutchenko e tratou de se esconder para que ele não a visse, afinal ela sabia que alguns dias atrás Frieda pediu que o criado a vigiasse, pois estava muito desconfiada.
- Que o Senhor me ajude neste momento! - orava Sabine com desespero querendo que o siberiano fosse logo embora.
Sabine teve de ficar parada quase meia hora e completamente quieta para que Tutchenko não percebesse que ela estava ali perto dele, mas isso em compensação fez a fuga dela dar completamente certo e logo ela chegar até o lugar onde estava o seu amigo mascate que iria lhe dar a tão desejada carona.
- Como demoraste moça, achei que tinha desistido! - exclamou o comerciante que logo em seguida disse: - Mas você sabe que posso levá-la apenas até quatro léguas daqui.
- Nunca desisto do que quero e além do mais, sei disso muito bem, não se preocupe - falou Sabine ansiosa.
O mascate conduziu a carroça pela rua durante duas horas até sair completamente da cidade e disse vendo a francesa nervosa:
- Fique calma Sabine, eles não têm como vir atrás de nós pelo caminho que usei, pois pouquíssimos conhecem este.
- É, mas vindo do George Witcherwell, da Frieda Gelhorn ou do Tutchenko, eu espero tudo - disse Sabine ansiosa.
- Sabine, acalme-se, nada de ruim irá acontecer conosco, Deus está nos guiando - falou o mascate calmamente e seguindo viagem.
No vilarejo que se tornava vila de bruxos e trouxas, Wilbur e o padre Constantino, na grande casa do irmão Levine, preparavam detalhadamente a viagem enquanto Harold, Lauzun e alguns de seus companheiros, incluindo Klemens e Wilhem, vestiam as roupas do disfarce que eles usariam em Viena, membros de um circo itinerante.
Ao mesmo tempo, Bernard e o advogado Christopher Raven se encarregavam de enjaular um enfraquecido Conde Karnstein.
- Só voltarei a sorrir no dia em que ver minha família outra vez e este infeliz com uma estaca atravessada no peito novamente! - exclamou Raven enquanto amarrava cordas mágicas nas mãos e pés do vampiro Karnstein para garantir que ele não fugiria.
- Penso o mesmo patrão - disse Bernard louco de vontade de dar um tiro no vampiro.
- Não vou me vestir de cigana, sou homem! - gritou Klemens não aceitando o traje feminino que Wilbur oferecia a ele.
- Deixe de conversa Klemens, isso é pelo bem do vilarejo e nosso, pense nisso, quando voltarmos, você será um herói e ninguém vai rir por ter se vestido de mulher, todos reconhecerão seu esforço para ajudar a evitar uma tragédia. Além disso, você é o mais magro de todos e isso ajuda muito no disfarce - disse o bruxo na tentativa de convencer o irmão, cujos cabelos ruivos, olhos verdes e rosto sem pelo algum misturado com os lábios finos o faziam quase parecer uma mulher.
O alemão deu uma bufada e disse extremamente furioso: - Se é pelo nosso bem e do vilarejo, eu me visto com esse traje horrível!
Todos estavam quase prontos enquanto Klemens começava a se vestir, ainda que não gostasse do conjunto que havia lhe sido dado: uma blusa de mangas folgadas branca, um colete preto com vinho e uma saia comprida vermelha, além de um par de botas marrons de cano comprido e uma peruca ruiva que compunham o disfarce.
Depois de prontos, todos esperavam Wilbur dar o próximo passo. De repente, o bruxo de 65 anos fez uma magia silenciosa e um traço colorido surgiu da varinha do bruxo, dando voltas em todos durante um minuto até que Wilbur disse: - Já podem olhar-se no espelho, porém não se reconhecerão.
Todos se enxergaram e espantaram-se com o que a magia era capaz de fazer com a aparência das pessoas, já que eles estavam completamente diferentes do que de fato eram e também, suas vozes estavam irreconhecíveis, o que facilitaria a circulação deles por Viena. Klemens, ao falar e ver que sua voz estava incrivelmente a de uma mulher, nem ousou comentar, mas praguejava mentalmente.
- Se eu não tivesse que cuidar da paróquia aqui e zelar para que os ainda mais conservadores que não concordam com o Harold e o Lauzun não façam bagunça, eu iria com vocês, então, que Deus os abençoe e acompanhe nessa viagem - falou o Padre Constantino sorrindo.
- Fique com Deus padre Constantino, saiba que nós todos adoramos o senhor e agradecemos a Ele todos os dias por você ter vindo para cá! - falou Harold em nome de todo o grupo ali presente, que concordava plenamente com as palavras do líder holandês.
Depois de se despedirem do padre, eles saíram pela porta dos fundos e viram Anton e Maria, devidamente disfarçados, esperando na carroça pronta com os cavalos, demonstrando que queriam ir junto e juntos.
- Esperem um pouco, vocês não podem viajar juntos, não casaram ainda - falou Lauzun colocando seu conservadorismo em prática.
- Queremos ajudar e não vamos desistir - disse Maria agarrada ao braço do noivo.
- Quero pessoalmente dar cabo de Frieda, ela quis me matar, agora eu vou matá-la, pela minha honra - disse Anton com firmeza, demonstrando que também tinha mudado: tornara-se muito mais irascível e não permitiria nunca mais que o pisassem ou enganassem.
Todos se olharam por alguns minutos e acabaram concordando, afinal, um homem que se prezava limpava a honra quando esta era manchada e Anton se sentia sujo por ter anteriormente se apaixonado pela vampira que agora odiava incondicionalmente.
Dulroney, já na carroça com o circo móvel de mentira junto com Harold, Lauzun, mais nove membros da Irmandade, todos arrependidos de atos passados, Christopher, Bernard, Maria e Anton, deu dois assovios e bateu palmas para que os cavalos alados batessem as asas e voassem com eles e as coisas que carregavam para a longa viagem.
De repente, os eqüinos alados levantaram o veículo do chão, deixando todos surpresos, alguns até com medo de caírem, sendo tranqüilizados por Harold: - Fiquem calmos. Wilbur disse que os cavalos comportam quanto peso for necessário.
- O inteligentíssimo holandês tem razão, pois eles são considerados as melhores criaturas mágicas de nosso mundo depois dos trestálios! - exclamou Wilbur feliz.
Todos ficaram mais calmos e seguiam o trajeto aéreo conversando, torcendo para que nada atrapalhasse a viagem, afinal ela seria decisiva para evitar duas tragédias ao mesmo tempo.
Prevenido, Wilbur cobrira o circo com um feitiço que deixava a diligência voadora invisível aos olhos dos viajantes que estavam no solo e agora, não havia mais problemas para com a viagem.
Em Viena, Frieda estava furiosa com a inesperada ida de sua criada Sabine e falava com Lucrecia: - Não posso acreditar que ela tenha ido embora dessa maneira, eu nunca lhe dei motivos para fazer algo semelhante, apesar de tudo sempre a paguei muito bem e é assim que ela me retribui?! Ingrata, é isso o que ela é!
- De repente ela resolveu voltar para a terra dela, afinal de contas eu sei que lá ela deixou pais e dois irmãos mais novos, quem sabe até ela até não tem um pretendente por lá - disse a irmã de George fazendo bordados.
- Não posso deixar de admitir que seja verdade, mas você acha que naquela porcaria de lugar há homem que preste? - falou Frieda com extremo desdém e frieza e em seguida dizendo aos suspiros: - O único homem macho daquelas paragens é o George, que trocou a sisudez da Irmandade por meus calorosos beijos e meu lindo corpo - e se vangloriando da própria beleza enquanto penteava os longos e lindos cabelos castanhos.
Lucrecia, vampira como a cunhada, concordava e pensava: - Eu quisera ter apenas um quinto da sua beleza, assim eu estaria com a minha vida garantida!
Frieda se contemplava no espelho, ainda que sua imagem não aparecesse: - Não posso acreditar que tenho uma irmã gêmea tão fraca, boba, idiota e medrosa, eu sim é que sou maravilhosa, pois sei me impor com classe e domino tudo à minha volta!
Wilbur viajou durante seis dias, só descendo a diligência voadora para ele e todos comerem e fazerem as necessidades, além de trocar o condutor para evitar um cansaço demasiado.
No último dia do trajeto, quando já estavam a apenas 20 quilômetros da capital do Império Austríaco, Wilbur desceu a diligência em uma mata fechada e falou a todos: - A partir daqui, seguiremos viagem no solo, já que não queremos suspeitas em cima de nós.
- Mas aí iremos demorar pelo menos mais uma semana para chegar! - exclamou Harold.
- Com esses cavalos, chegaremos à capital em quatro dias a partir daqui, novamente fazendo revezamento de condutores para ninguém ficar muito cansado - respondeu o bruxo fazendo um feitiço para ocultar as asas dos cavalos e em seguida dizendo:
- Quando quiserem parar o cavalo por algum motivo, dêem um leve puxão no laço que eles param imediatamente.
Todos concordaram, continuando o trajeto no solo como um simples circo itinerante de ciganos, com direito a animais, mulheres barbadas, domadores, anões, cartomantes, mágicos e tantas outras atrações que faziam muitos se impressionarem.
Mais quatro dias parando para comer e fazer necessidades, além de mudar os condutores três vezes ao dia, finalmente o falso circo chegara a Viena, deixando aquela parte da Irmandade que estava lá impressionada com a grandiosidade e ritmo da cidade, já que eles estavam acostumados demais com o modo calmo demais do vilarejo, embora este estivesse mudando ruidosamente.
De repente, eles foram pegos de surpresa por alguns guardas do Imperador, que perguntaram: - De onde vocês vêm e o que trazem?
- Nós somos o Gran Circo Zaratruska vindo de qualquer lugar e indo para onde Deus quiser! - exclamou Harold usando o sotaque estrangeiro que Wilbur lhe dera magicamente.
Os guardas riram e revistaram o circo, vendo que só havia pessoas e artefatos típicos de um lugar assim e disseram: - Estão livres para irem onde quiser, só procurem um campo aberto para colocar as instalações, já que aqui não poderão ficar.
- Onde há um lugar assim? Preciso de um onde tenha acesso à comida e eu possa alimentar meus animais, já que eu tenho várias bocas para alimentar - disse Harold disfarçado de dono do circo e apontando as pessoas que ali estavam.
- Sigam à frente e dobrem à direita, lá há um terreno vazio e perto existem lugares onde poderão comprar o que precisam - disse o guarda apontando o caminho.
Seguindo à frente com o falso circo, Harold e todos ali presentes esperavam ansiosos os momentos de se vingar do casal mais devasso de todo o Império Austríaco e agora que tinham chegado à Viena, poderiam concluir com chave de ouro seu plano de vingança.
O caos verbal estava presente quando Harold fez sinal para todos se calarem e disse: - Ontem procurei alguém que tivesse o dom da telepatia e encontrei este, Wilbur Dulroney, que mora no fim do vilarejo e me disse que irá ajudar nas buscas - apresentando um homem que aparentava ter pouco mais do que 65 anos e tinha a cabeça branca como a neve do inverno daquelas paragens.
- Digo com segurança que encontrarei a família do Dr. Raven esteja onde ela estiver - falou Wilbur sorrindo e disposto a ajudar.
Todos ficaram felizes sob os olhares esperançosos dos moradores, que se solidarizaram com a situação de Raven apesar de saberem que ele trouxera de volta o vampiro Karnstein.
Em seguida, o bruxo Dulroney se concentrou profundamente e ficou completamente imóvel durante vários minutos, deixando os irmãos e outras pessoas olhando curiosas para saber o que ia acontecer quando repentinamente, Wilbur abriu os olhos e disse:
- Encontrei o menino Arthur, ele está em Viena, na casa de um indivíduo chamado George Witcherwell e, além disso, o menino comunicou-me telepaticamente que o resto da família está presa em um lugar que ele não sabe.
- Até isso esse filho de uma meretriz teve coragem de fazer?! - exclamou Levine enfurecido com o ponto em que a maldade de George chegara.
- Meu Deus do céu, eu sempre soube que George era mau caráter, mas nunca imaginei que fosse capaz de deixar uma criança em cárcere privado acobertando um bruxo das trevas! - disse Ártemis Winchester com espanto e ali presente depois de dias ausente devido a uma forte gripe.
- Vindo dele pode se esperar tudo, eu não duvido até que Frieda já tenha mordido o desgraçado! - exclamou Klemens extremamente bravo.
- Mais do que nunca quero dar um tiro no peito daquele maldito! - gritou Harold disposto a se vingar do irmão traidor e dizendo em seguida: - Vire sua língua do avesso Klemens, três vampiros já é demais!
- Por Nossa Senhora, quem é esse homem que todos tanto odeiam?! - perguntou espantado Wilbur.
Lauzun tomou a palavra e contou tudo que acontecera até ali, o que deixou Dulroney ainda mais surpreso que antes: - Por luxúria, ódio e vingança, algumas pessoas cometem barbaridades que até o próprio Deus é capaz de duvidar.
Agora que sabiam onde estava o filho caçula de Raven, eles teriam de ir até Viena para resgatar o menino e o resto da família do bruxo das leis, porém Klemens falou com espanto: - Como vamos viajar para Viena nessa altura dos acontecimentos, já imaginaram se aquela prostituta ou aquele calhorda nos reconhecem?! Nós estaremos condenados, além do mais, uma viagem daqui até a capital do império demora pelo menos um mês ou mais!
- Ora, é para isso que usarei meus cavalos alados! - exclamou Wilbur com felicidade e em seguida dizendo: - Eles encurtarão nossa viagem em pelo menos três semanas, assim poderemos resgatar mais rápido a família do Dr. Raven e evitar que Frieda os delate ao Imperador!
- Foi Deus que permitiu que o senhor viesse com nossa caravana! - disse o padre Constantino com alegria.
- Ele não só me permitiu isso como me deu o privilégio de conviver com o bruxo mais santo desta terra! - retribuiu sorrindo Wilbur.
Todos comemoraram e muitos camponeses se ofereceram para fazer parte do grupo de resgate com suas armas e foices, porém Lauzun disse: - Vocês não devem se arriscar por nossa causa, pois fomos nós que causamos esse problema todo e somos nós que devemos resolvê-lo.
- Como assim problema?! O que fizemos foi para livrar nossa terra do mal! - exclamou Wolffenbüttel ouvindo aquilo.
- Em todos esses dias pensei no que fazíamos quando Gustav ainda era o líder e cheguei à conclusão que combatíamos o mal pelo lado errado, matamos as pessoas erradas e poderíamos ter evitado o que está acontecendo agora se não tivéssemos ouvido tanto o Weil - respondeu Lauzun com absoluta firmeza.
Vários companheiros do austríaco ficaram indignados, pois além de se sentirem insultados com aquelas palavras, não aceitavam aquela “invasão” de bruxos e menos ainda que os outros conservadores aceitassem de bom grado a liderança do liberal Harold, as mudanças que este colocara e o curto discurso de arrependimento de Lauzun, especialmente Wolffenbüttel, desejando estrangulá-lo.
Enquanto isso Karnstein comia o pão que o diabo amassou, preso e amarrado em uma cela mágica que deixava o poder dele enfraquecido ao mesmo tempo em que vários camponeses iam até a cadeia só para rir dele e humilhá-lo, se aproveitando da penosa condição em que ele se encontrava, sequer podendo dizer algo em sua defesa.
Na casa paroquial, a Irmandade, Anton Hoffer e o Padre Constantino reuniram-se com Wilbur, Raven e Bernard para acertar os últimos detalhes da viagem que serviria para resgatar a família raptada do advogado bruxo.
- Como disse àquela hora, uma viagem para Viena nessa altura dos fatos vai nos pôr em perigo! - disse Klemens querendo dissuadir todos da partida.
- É para isso que se usará a magia dos bruxos do bem, para evitar qualquer tipo de perigo e ainda por cima, encurtar nossa viagem - falou Harold rindo.
Klemens não teve como contra-argumentar enquanto Wilbur falou: - Além de usar meus cavalos alados, nós precisaremos de disfarces para evitar incômodos em Viena, pois como disse o irmão, George ou Frieda podem nos reconhecer, então temos de evitar ao máximo os problemas - e em seguida completou: - Também, temos um importante aliado em Viena, um Congresso que o Príncipe Von Metternich, assistente do Imperador, organizou para recolocar as famílias reais de volta em seus tronos, o que nos deixa em grande vantagem em relação ao George, pois o biltre não tem como falar com o Imperador.
Todos ficaram surpresos, até mesmo o padre e logo depois comemoraram, começando os preparativos da viagem sob os olhares dos camponeses que ficavam ouvindo atrás das portas para falar aos outros que tinham algo a mais para fazer.
Faltava um bom tempo para o casamento de Anton e Maria, que estavam mais felizes do que nunca e a bruxa mais que tudo queria se vingar da irmã gêmea Frieda por todos os apuros pelos quais havia passado por conta do péssimo caráter desta.
Na capital do Império Austríaco, Frieda tomava um delicioso chá com a cunhada Lucrecia contando sobre a inesperada chegada do Imperador perto dela dois dias atrás.
- Não posso crer nisso, realmente você tem muita sorte! - exclamou Lucrecia aos risos.
- E como tenho minha cunhada e dela usarei para conseguir tudo o que mais quero: ver a Maria, Anton e a Irmandade inteira na forca! - disse Frieda com muita maldade na voz e no olhar.
Lucrecia novamente riu enquanto o Marquês de Munchaünsen a olhava de sua casa, escutando espantado cada palavra que ela dizia: - Ah, esta mulher é um absoluto espetáculo de inteligência e beleza! Como pode existir mulher tão bela e ao mesmo tempo tão genial?!
- Perdoa minha interferência, senhor, mas ela pode ser uma criatura das trevas, pois não é possível que ela tenha conseguido deixar o Imperador tão louco assim, pois se o conheces bem, sabe que ele não é de se encantar facilmente pelas pessoas - falou o criado do nobre com certo espanto, porém completando com algo talvez óbvio demais: - Mas, a beleza nos cega realmente.
- Sabe que você pode ter razão, como não parei para ver isso antes? E se ela for mesmo isso que você diz, então eu preciso seduzi-la de qualquer jeito, afinal nela pode estar meu maior sonho: ser imortal! - exclamou feliz o marquês, cujo verdadeiro nome era Wenzel Von Hohenzollern, planejando durante uma hora um suntuoso jantar e depois subindo ao quarto para escrever um convite para George Witcherwell e a “esposa”, o que deixou o criado horrorizado.
Ao chegar ao seu quarto, depois de demorar a subir as escadas, ele se deparou com uma inesperada visão: a vampira Frieda Gelhorn deitada completamente desnuda em sua cama e as roupas desta cuidadosamente dobradas em uma cadeira ao lado.
- Não posso crer em meus olhos: você aqui, em minha cama! - exclamou Wenzel com espanto.
- Depois do que fez por mim dois dias atrás, era o mínimo que eu podia fazer para retribuir - disse ela rindo, se virando de bruços e roçando uma perna contra a outra em um gesto sensual.
- Você chama isso de mínimo?! É o máximo! - disse ele com absoluta alegria e se aproximando da vampira nua.
- Então tire a roupa e deite aqui comigo, me dê prazer - falou Frieda rindo e se virando de frente para ele, louca para ser possuída pelo belo marquês.
Ele despiu-se por inteiro rapidamente e deitou-se sobre o corpo dela, não poupando nenhuma parte dele de seu devasso desejo, lambendo, beijando e chupando sem parar um minuto sequer ao mesmo tempo em que ela não parava de gemer envolta nos braços dele. Além disso, permitia que ele lambesse seu corpo todo e fizesse o que bem entendesse.
- Continue - ria ela se virando de um lado para outro conforme ele ia, beijava, chupava e lambia.
- Oh Frieda, não sei como pôde ter vivido naquele fim de mundo do Vilarejo de Karnstein, é aqui seu lugar e como George já me disse, você é uma deusa, merece ser amada e adorada por todos, além de ganhar muitos presentes é claro - riu o nobre lambendo o pescoço dela e em seguida pegando em uma gaveta uma caixa repleta de jóias feitas em pérola.
O presente do riquíssimo nobre mostrava seu poder absoluto sobre os homens que dela se aproximavam e ela usaria aquele poder para completar sua vingança, mas também para ter ainda mais do que já tinha.
Eles continuavam com o sexo com tudo que tinha direito, até mesmo coisas mais devassas, ali, sem desconfiar que na casa de Frieda, Sabine, aproveitando a ausência de George, o descanso de Lucrecia e a saída de Tutchenko, arrumava suas coisas para ir embora dali para sempre e denunciar a Irmandade tudo o que a vampira planejava até mesmo o que ela fazia naquele momento no quarto do marquês, afinal ela sabia tudo o que a patroa fazia e dizia.
Logo que terminou de arrumá-las, Sabine saiu pela porta dos fundos e pulou o muro de trás da casa em direção à rua onde iria pegar carona com um mascate que vendia coisas por todos os lados até fora da cidade, em um matagal, onde ficaria escondida caso George fosse procurá-la. Andando pela rua, Sabine avistou Tutchenko e tratou de se esconder para que ele não a visse, afinal ela sabia que alguns dias atrás Frieda pediu que o criado a vigiasse, pois estava muito desconfiada.
- Que o Senhor me ajude neste momento! - orava Sabine com desespero querendo que o siberiano fosse logo embora.
Sabine teve de ficar parada quase meia hora e completamente quieta para que Tutchenko não percebesse que ela estava ali perto dele, mas isso em compensação fez a fuga dela dar completamente certo e logo ela chegar até o lugar onde estava o seu amigo mascate que iria lhe dar a tão desejada carona.
- Como demoraste moça, achei que tinha desistido! - exclamou o comerciante que logo em seguida disse: - Mas você sabe que posso levá-la apenas até quatro léguas daqui.
- Nunca desisto do que quero e além do mais, sei disso muito bem, não se preocupe - falou Sabine ansiosa.
O mascate conduziu a carroça pela rua durante duas horas até sair completamente da cidade e disse vendo a francesa nervosa:
- Fique calma Sabine, eles não têm como vir atrás de nós pelo caminho que usei, pois pouquíssimos conhecem este.
- É, mas vindo do George Witcherwell, da Frieda Gelhorn ou do Tutchenko, eu espero tudo - disse Sabine ansiosa.
- Sabine, acalme-se, nada de ruim irá acontecer conosco, Deus está nos guiando - falou o mascate calmamente e seguindo viagem.
No vilarejo que se tornava vila de bruxos e trouxas, Wilbur e o padre Constantino, na grande casa do irmão Levine, preparavam detalhadamente a viagem enquanto Harold, Lauzun e alguns de seus companheiros, incluindo Klemens e Wilhem, vestiam as roupas do disfarce que eles usariam em Viena, membros de um circo itinerante.
Ao mesmo tempo, Bernard e o advogado Christopher Raven se encarregavam de enjaular um enfraquecido Conde Karnstein.
- Só voltarei a sorrir no dia em que ver minha família outra vez e este infeliz com uma estaca atravessada no peito novamente! - exclamou Raven enquanto amarrava cordas mágicas nas mãos e pés do vampiro Karnstein para garantir que ele não fugiria.
- Penso o mesmo patrão - disse Bernard louco de vontade de dar um tiro no vampiro.
- Não vou me vestir de cigana, sou homem! - gritou Klemens não aceitando o traje feminino que Wilbur oferecia a ele.
- Deixe de conversa Klemens, isso é pelo bem do vilarejo e nosso, pense nisso, quando voltarmos, você será um herói e ninguém vai rir por ter se vestido de mulher, todos reconhecerão seu esforço para ajudar a evitar uma tragédia. Além disso, você é o mais magro de todos e isso ajuda muito no disfarce - disse o bruxo na tentativa de convencer o irmão, cujos cabelos ruivos, olhos verdes e rosto sem pelo algum misturado com os lábios finos o faziam quase parecer uma mulher.
O alemão deu uma bufada e disse extremamente furioso: - Se é pelo nosso bem e do vilarejo, eu me visto com esse traje horrível!
Todos estavam quase prontos enquanto Klemens começava a se vestir, ainda que não gostasse do conjunto que havia lhe sido dado: uma blusa de mangas folgadas branca, um colete preto com vinho e uma saia comprida vermelha, além de um par de botas marrons de cano comprido e uma peruca ruiva que compunham o disfarce.
Depois de prontos, todos esperavam Wilbur dar o próximo passo. De repente, o bruxo de 65 anos fez uma magia silenciosa e um traço colorido surgiu da varinha do bruxo, dando voltas em todos durante um minuto até que Wilbur disse: - Já podem olhar-se no espelho, porém não se reconhecerão.
Todos se enxergaram e espantaram-se com o que a magia era capaz de fazer com a aparência das pessoas, já que eles estavam completamente diferentes do que de fato eram e também, suas vozes estavam irreconhecíveis, o que facilitaria a circulação deles por Viena. Klemens, ao falar e ver que sua voz estava incrivelmente a de uma mulher, nem ousou comentar, mas praguejava mentalmente.
- Se eu não tivesse que cuidar da paróquia aqui e zelar para que os ainda mais conservadores que não concordam com o Harold e o Lauzun não façam bagunça, eu iria com vocês, então, que Deus os abençoe e acompanhe nessa viagem - falou o Padre Constantino sorrindo.
- Fique com Deus padre Constantino, saiba que nós todos adoramos o senhor e agradecemos a Ele todos os dias por você ter vindo para cá! - falou Harold em nome de todo o grupo ali presente, que concordava plenamente com as palavras do líder holandês.
Depois de se despedirem do padre, eles saíram pela porta dos fundos e viram Anton e Maria, devidamente disfarçados, esperando na carroça pronta com os cavalos, demonstrando que queriam ir junto e juntos.
- Esperem um pouco, vocês não podem viajar juntos, não casaram ainda - falou Lauzun colocando seu conservadorismo em prática.
- Queremos ajudar e não vamos desistir - disse Maria agarrada ao braço do noivo.
- Quero pessoalmente dar cabo de Frieda, ela quis me matar, agora eu vou matá-la, pela minha honra - disse Anton com firmeza, demonstrando que também tinha mudado: tornara-se muito mais irascível e não permitiria nunca mais que o pisassem ou enganassem.
Todos se olharam por alguns minutos e acabaram concordando, afinal, um homem que se prezava limpava a honra quando esta era manchada e Anton se sentia sujo por ter anteriormente se apaixonado pela vampira que agora odiava incondicionalmente.
Dulroney, já na carroça com o circo móvel de mentira junto com Harold, Lauzun, mais nove membros da Irmandade, todos arrependidos de atos passados, Christopher, Bernard, Maria e Anton, deu dois assovios e bateu palmas para que os cavalos alados batessem as asas e voassem com eles e as coisas que carregavam para a longa viagem.
De repente, os eqüinos alados levantaram o veículo do chão, deixando todos surpresos, alguns até com medo de caírem, sendo tranqüilizados por Harold: - Fiquem calmos. Wilbur disse que os cavalos comportam quanto peso for necessário.
- O inteligentíssimo holandês tem razão, pois eles são considerados as melhores criaturas mágicas de nosso mundo depois dos trestálios! - exclamou Wilbur feliz.
Todos ficaram mais calmos e seguiam o trajeto aéreo conversando, torcendo para que nada atrapalhasse a viagem, afinal ela seria decisiva para evitar duas tragédias ao mesmo tempo.
Prevenido, Wilbur cobrira o circo com um feitiço que deixava a diligência voadora invisível aos olhos dos viajantes que estavam no solo e agora, não havia mais problemas para com a viagem.
Em Viena, Frieda estava furiosa com a inesperada ida de sua criada Sabine e falava com Lucrecia: - Não posso acreditar que ela tenha ido embora dessa maneira, eu nunca lhe dei motivos para fazer algo semelhante, apesar de tudo sempre a paguei muito bem e é assim que ela me retribui?! Ingrata, é isso o que ela é!
- De repente ela resolveu voltar para a terra dela, afinal de contas eu sei que lá ela deixou pais e dois irmãos mais novos, quem sabe até ela até não tem um pretendente por lá - disse a irmã de George fazendo bordados.
- Não posso deixar de admitir que seja verdade, mas você acha que naquela porcaria de lugar há homem que preste? - falou Frieda com extremo desdém e frieza e em seguida dizendo aos suspiros: - O único homem macho daquelas paragens é o George, que trocou a sisudez da Irmandade por meus calorosos beijos e meu lindo corpo - e se vangloriando da própria beleza enquanto penteava os longos e lindos cabelos castanhos.
Lucrecia, vampira como a cunhada, concordava e pensava: - Eu quisera ter apenas um quinto da sua beleza, assim eu estaria com a minha vida garantida!
Frieda se contemplava no espelho, ainda que sua imagem não aparecesse: - Não posso acreditar que tenho uma irmã gêmea tão fraca, boba, idiota e medrosa, eu sim é que sou maravilhosa, pois sei me impor com classe e domino tudo à minha volta!
Wilbur viajou durante seis dias, só descendo a diligência voadora para ele e todos comerem e fazerem as necessidades, além de trocar o condutor para evitar um cansaço demasiado.
No último dia do trajeto, quando já estavam a apenas 20 quilômetros da capital do Império Austríaco, Wilbur desceu a diligência em uma mata fechada e falou a todos: - A partir daqui, seguiremos viagem no solo, já que não queremos suspeitas em cima de nós.
- Mas aí iremos demorar pelo menos mais uma semana para chegar! - exclamou Harold.
- Com esses cavalos, chegaremos à capital em quatro dias a partir daqui, novamente fazendo revezamento de condutores para ninguém ficar muito cansado - respondeu o bruxo fazendo um feitiço para ocultar as asas dos cavalos e em seguida dizendo:
- Quando quiserem parar o cavalo por algum motivo, dêem um leve puxão no laço que eles param imediatamente.
Todos concordaram, continuando o trajeto no solo como um simples circo itinerante de ciganos, com direito a animais, mulheres barbadas, domadores, anões, cartomantes, mágicos e tantas outras atrações que faziam muitos se impressionarem.
Mais quatro dias parando para comer e fazer necessidades, além de mudar os condutores três vezes ao dia, finalmente o falso circo chegara a Viena, deixando aquela parte da Irmandade que estava lá impressionada com a grandiosidade e ritmo da cidade, já que eles estavam acostumados demais com o modo calmo demais do vilarejo, embora este estivesse mudando ruidosamente.
De repente, eles foram pegos de surpresa por alguns guardas do Imperador, que perguntaram: - De onde vocês vêm e o que trazem?
- Nós somos o Gran Circo Zaratruska vindo de qualquer lugar e indo para onde Deus quiser! - exclamou Harold usando o sotaque estrangeiro que Wilbur lhe dera magicamente.
Os guardas riram e revistaram o circo, vendo que só havia pessoas e artefatos típicos de um lugar assim e disseram: - Estão livres para irem onde quiser, só procurem um campo aberto para colocar as instalações, já que aqui não poderão ficar.
- Onde há um lugar assim? Preciso de um onde tenha acesso à comida e eu possa alimentar meus animais, já que eu tenho várias bocas para alimentar - disse Harold disfarçado de dono do circo e apontando as pessoas que ali estavam.
- Sigam à frente e dobrem à direita, lá há um terreno vazio e perto existem lugares onde poderão comprar o que precisam - disse o guarda apontando o caminho.
Seguindo à frente com o falso circo, Harold e todos ali presentes esperavam ansiosos os momentos de se vingar do casal mais devasso de todo o Império Austríaco e agora que tinham chegado à Viena, poderiam concluir com chave de ouro seu plano de vingança.
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