quinta-feira, 21 de maio de 2009

Bloody Mary - Capítulo 2: Phoebe volta para casa

Amanheceu mais um dia ensolarado em San Diego e eu acordei às 5 h e 30 min da manhã depois de passar a noite inteira sonhando com Ron Burgundy de uma forma inacreditavelmente real. Levantei e decidi ligar o computador para ver se tinha chegado algum e-mail e de repente, quando eu menos esperava, o telefone do meu quarto chamou e atendi voando, achando que podia ser uma das garotas, quando escutei uma conhecida voz masculina:
- Oi Miss Caruso, aqui é o Joe, fiquei sabendo pelo tio Wes que vocês pretendem fazer um trabalho sobre a equipe jornalística da KVWN e queria saber se posso fazê-lo com vocês, já que eu conheço algumas pessoas que conviveram com o quinteto...
Interrompi o Joe, lembrando que o besta tinha faltado a aula no dia anterior, certamente ajudando o pai a cuidar de algum paciente emergencial: - Primeiro: odeio esse apelido de Miss Caruso, segundo: o nosso trabalho era para estar em sigilo, terceiro: você podia ter esperado até eu chegar na aula e quarto: nunca mais me ligue a essa hora, então, conversamos na escola - e logo em seguida desliguei o telefone na cara dele.
Joe é o apelido de Joseph Sebastian Larkin, filho do médico da minha escola, Dr. Alan Larkin e capitão do time de futebol da escola, além de ser o mais grudento dos apaixonados, pois ele sempre dava um jeito de ficar que nem chiclete na Tracy Turnblad, por quem todos sabiam que ele era apaixonado, o que fazia todo mundo caçoar dele. Certamente, querer fazer o trabalho conosco era mais um pretexto para ficar perto da Tracy e mais uma vez, certamente sem sucesso, tentar dizer o que sentia.
Outra figura carimbada de San Diego, Wes Mantooth é o verdadeiro rei da antipatia, diretor de criação da KVWN a pelo menos 26 anos e tio do Joe, um homem de 64 anos, alto, consideravelmente corpulento, cabelos brancos e ex-repórter do Canal Dois, cuja falência tinha sido decretada cinco anos depois do sumiço da equipe jornalística da KVWN. Ele sempre foi rival de Ron Burgundy no que dizia respeito a quem era o melhor âncora da cidade e em outros aspectos que mal e mal eu conhecia.
Foi quando lembrei que Wes certamente estava olhando a exposição ontem, porém, longe de nossos olhos, já que ele não simpatizava nada com Harken e menos ainda gostava de saber que seu pior inimigo estava sendo homenageado, portanto, ele devia ter escutado a conversa que eu e as garotas tínhamos tido com o diretor da emissora e na certa deve ter contado ao Joe e conseqüentemente ao Link, filho dele e considerado o bonitão do terceiro ano da minha escola.
Então, imaginei que quando chegasse à escola, eu teria que agüentar Joe pedindo para fazer parte do meu grupo, porém, era mais importante agora eu me vestir e descer para tomar café se eu não quisesse me atrasar para pegar a Phoebe no aeroporto, mas, quando cheguei na escada, minha irmã mais velha tinha acabado de adentrar a porta usando a chave que a mamãe lhe dera e com várias malas pesadas, além de um grande sorriso: - Por acaso Maddie não vem me ajudar?
Desci correndo, quase caindo e a abracei muito forte quando cheguei na porta, chorando de felicidade por finalmente ter minha amada irmã de volta em casa: - Quando você chegou?!
- Mamãe ligou avisando que você ia me buscar no aeroporto, porém, eu não quero que você falte aula ou se atrase, então, resolvi antecipar meu vôo e cheguei aqui a 1 h e 30 min da manhã, porém, achei melhor me hospedar no hotel próximo para fazer uma surpresa pela manhã - respondeu a Phoebe muito feliz e me perguntando como eu estava.
Exceto a esquisita paixão que sentia por Burgundy, contei todo o resto numa empolgação que eu não tinha há muito tempo, deixando a Phoebe risonha como nunca desde que ela nos dera a notícia de que estava se divorciando: - Então você e as suas amigas vão contar a história dos cinco da KVWN? Eu imagino que vocês devem ter muita gente para entrevistar e devem ter encontrado muita coisa interessante sobre eles, não?
- Sim, porém, o que mais me intriga é qual teria sido a razão deles terem sumido assim - falei profundamente pensativa.
- Quem sabe fazendo esse trabalho, vocês não descubram algo sobre isso, pode haver alguma testemunha que não tenha sido ouvida naquela época - disse Phoebe me olhando.
Eu tinha esquecido que Phoebe era detetive da Homicídios de Phoenix, agora transferida para San Diego, e conseqüentemente entendia tudo sobre isso, inclusive pensei em pedir ajuda para ela, pois quem sabe, com isso, eu e meu grupo de trabalho poderíamos desvendar o grande mistério de San Diego dos últimos quarenta anos: o desaparecimento de Ron Burgundy e sua equipe.
- Mas tem uma outra coisa Phoebe: e se a verdade for pior do que San Diego pensa? - perguntei em um impulso.
- A vida é feita de coisas boas e ruins Maddie, aprenda isso enquanto você é nova pra não sofrer demais no futuro - respondeu Phoebe se baseando na própria experiência de ter sido casada com alguém que ela praticamente não conhecia até descobrir ser traída e se divorciar.
Pensei muito no que Phoebe disse enquanto subia junto com ela ao antigo quarto que era dela antes de ir morar no Arizona. Entramos no quarto e começamos a desfazer as malas dela, sendo aí que percebi que já eram 6h10min da manhã, faltando 40 minutos para papai e mamãe acordarem.
Sorrindo como nunca, combinei com a Phoebe de fazermos uma surpresa aos nossos pais e juntas, fizemos um lindo café da manhã, conseqüentemente deixando a cozinha consideravelmente bagunçada e tendo que limpá-la faltando sete minutos para nossos pais acordarem.
Rápidas como sempre éramos embora nossa diferença de idade fosse 15 anos, deixamos a cozinha limpa e sentamos à mesa esperando nossos pais e quando eles desceram, nos vendo sentadas juntas à mesa, comemoraram como loucos o retorno antecipado da Phoebe e a abraçaram como se tivessem ficado sem vê-la mais de séculos, embora ela sempre viesse todos os verões com o ex-marido para a nossa casa e telefonasse com uma freqüência de quatro dias.
Sorrindo mais ainda depois que ela explicou o motivo do retorno antecipado, nossos pais e nós duas tomamos café todos juntos, comemorando aos risos e matação de saudade a reunião da família.
Mamãe foi ajudar Phoebe a arrumar as coisas dela de volta no antigo quarto que ela ocupava enquanto papai dizia para eu ir me vestir de uma vez, senão eu ia me atrasar para a escola.
Subi correndo e me vesti mais rapidamente ainda, arrumando minhas coisas na bolsa, porque na noite anterior eu tinha esquecido de fazê-lo, descendo uns 10 minutos depois de ter subido, mas não sem antes conferir se estava tudo certo e não faltando nada.
Nada faltando e tudo certo, eu desci e fiquei esperando papai ficar pronto para me levar à escola, mas, quando menos esperava, escutei um ronco seguido de uma buzina que eu sabia muito bem de onde vinha: a picape do chefe Roarke, que o sobrinho dele, o Tyrrell, usava para levar a Isabella, prima dele e filha do chefe de polícia da cidade, para a escola.
Saí e escutei aquele típico sotaque nova-iorquino dele: - Quer vir com a gente hoje, Maddie?
Olhei para dentro e vi que meu pai descia, imediatamente perguntando a ele se eu podia ir com o Tyrrell e a Bella e recebendo uma resposta positiva, desde que o Barnabas Collins de cabelo espetado não acelerasse demais o carro, pois embora ele dirigisse melhor que muitos motoristas veteranos, ele era rápido demais e isso sempre fazia o chefe Roarke ter inúmeras queixas dele.
Saí para a calçada e entrei na picape sorrindo e cumprimentando, depois perguntando como eles estavam:
- Como sempre, eu tô bem, só que o tio Roarke vive dizendo que eu ainda vou pagar multa - respondeu aos risos o Tyrrell.
- O papai não tem tempo nem pra resolver todos os mil casos que chegam no departamento por dia, vai ter tempo de te dar uma multa, Collins? Além disso, ele nem guarda de trânsito é! - respondeu a Isabella, vulgarmente Bella, aos risos, se referindo ao fato do pai dela, chefe da polícia de San Diego, quase sempre estar lotado de incontáveis queixas e ao apelido que meu pai e o professor de matemática tinham posto no Tyrrell por acharem ele parecido com um ator chamado Jonathan Frid, que eu sabia ter feito papel de um vampiro chamado Barnabas Collins em uma série chamada Dark Shadows.
- Pô Bella, até você anda agora encasquetando com esse apelido em cima de mim? - perguntou o Tyrrell dando partida no carro danado da vida porque detestava o apelido.
Nada falei enquanto os dois iam discutindo pelo caminho sobre Tyrrell ser ou não parecido com Jonathan Frid, ainda que eu não imaginasse como uma discussão daquelas podia durar 15 minutos, o tempo que eu levava para chegar à escola de carro.
Quando chegamos na escola, os dois se calaram vendo que eu já estava olhando com cara estranha e cada um seguiu seu caminho depois que nós trocamos “bom dia” e “ótima aula pra você” e a Bella dando um beliscão na bunda do primo sem que ninguém notasse e deixando ele ainda mais danado da vida do que já estava, embora eu tivesse notado, ainda que discretamente e finalmente, descoberto a razão de todo mundo viver dizendo que o Tyrrell e a Bella eram namorados apesar de serem primos - irmãos: ela era louca de amores pelo primo, pois vivia praticamente amarrada nele, já que eles sempre estavam juntos, fosse onde fosse e como.
Jurei para mim mesma que não contaria aquilo a ninguém antes que o Tyrrell me abordasse no maior constrangimento, percebendo que eu tinha visto Bella beliscando onde não devia: - Você não vai dizer isso a alguém vai?
- O que você e a Bella fazem ou deixam de fazer não é problema meu, eu só temo que o chefe Roarke descubra e isso dê confusão, pois vocês são parentes - respondi deixando muito claro na minha expressão que nada diria sobre o episódio de mão boba quase explícita que eu havia testemunhado.
Segui silenciosamente junto com o Tyrrell para a aula de espanhol e ao chegar na sala, fiquei sabendo que o professor Ramirez tinha ficado doente e não viria, o que nos deixaria sem aula até o terceiro período, fato comemorado ruidosamente pela minha turma inteira, considerada “o reduto dos esquisitos” do terceiro ano da Escola Santa Clara de Assis de San Diego, porque a maioria da minha sala tinha alguma “esquisitice”, ao menos no conceito das detestáveis líderes de torcida.
Sentei com Pippa, Imy e Tracy enquanto o Tyrrell foi sozinho para o canto dele, onde ninguém se atrevia a incomodá-lo, sob risco de tomar um belo nocaute do melhor e mais forte boxeador da escola.
- E aí Maddie, que horas você e as garotas se reúnem comigo lá em casa? - perguntou a Pippa na maior animação, anunciando que o treinador Hooken se encontraria hoje em casa de folga e nos daria a entrevista para o trabalho de História.
- Por mim, todo mundo podia seguir direto pra sua casa depois do término da aula, mas primeiro vou ligar pro papai avisando, porque ontem eu esqueci e deu confusão - respondi muito alegre.
A Imy e a Tracy concordaram dizendo que também avisariam aos pais e depois ficamos jogando conversa fora durante quase meia hora até que o Joe chegou e correu para perto da gente perguntando de imediato se podia fazer parte do nosso grupo.
- Desde que você não se escore na gente pra ganhar nota de graça, concordamos - disse a Imy, que desde a oitava série não ia com a lata do Joe.
Joe fez cara de quem não gostou do que ouviu e respondeu quase à queima roupa, chamando a Imy pelo nome:
- Meu pai conheceu a equipe da KVWN e ele conhece muita gente, mas muita gente mesmo, que conviveu com eles, Imoghen, então, se eu for aceito no grupo, todo mundo aqui vai tirar um 10 do tamanho do planeta Terra.
Tracy olhou por um minuto e alguma coisa e disse: - O Dr. Larkin realmente pode colaborar muito pro nosso trabalho, então, não tem problema se a gente aceitar o Joe no grupo.
- Juntando a entrevista que vamos fazer hoje com o tio Hooken e mais o depoimento do Dr. Alan, nossa, se nosso trabalho levar menos de 10 vai ser cisma da nariguda Minnie - disse a Pippa chamando a professora pelo apelido que a escola inteira tinha posto na Senhora Potter em razão do enorme nariz dela e da personagem do desenho Pica-Pau.
- Ela tem cisma com todo mundo, até com quem é quieto que nem o Barnabas Collins - falou o Joe em voz baixinha, pois não tinha sido apenas uma vez que ele quase apanhou do Tyrrell por dizer o que não devia e ele ter ouvido.
- Você realmente pede pra tomar porrada Joe - falou Tracy, que detestava quando alguém ficava de cisma por qualquer razão.
Resolvida a parte do novo membro do nosso grupo de trabalho, ficamos reunindo as informações até o momento conseguidas e ficamos comentando de algumas coisas contadas pelo Harken, inclusive boatos sobre um tórrido romance gay entre Brian Fantana e Brick Tamland, o que fez Joe rir até doer o estômago.
- Cara, não consigo imaginar esses dois se pegando é nunca! - o Joe ria até ficar vermelho e sem ar.
Imy fez a maior cara de nojo imaginando enquanto eu, a Pippa e a Tracy nos entreolhamos devido ao vexame que passávamos porque o Joe ria pior e mais alto que o Coringa do Batman.
Depois que passamos dois períodos sem aula, tivemos matemática financeira com a professora Gallagher, mais conhecida como “Cabeça de Fogo”, porque além de ser muito ruiva, era esquentada igual uma brasa.
Passado o terceiro período, fomos para o intervalo e ficamos conversando todo o tempo, inclusive na fila para pegar o lanche, onde encontramos o Emmett, atacante do time de futebol e ele como sempre, fazia elogios a mim, a Pippa e a Imy, mas quando viu a Tracy, só faltou disparar da fila sem pegar nada, mas como não queria ficar sem lanche, digamos que “se agüentou”.
Depois que ele saiu da fila, Tracy perguntou meio triste: - Ele ainda...?
Ficamos sem saber o que responder, embora a escola inteira soubesse o porquê do Emmett agir daquele jeito: dois meses atrás um acidente aconteceu no depósito de material esportivo, que não tinha sido esclarecido até o momento, apesar de um monte de depoimentos terem apontado Tracy como pivô do acidente, pois o imbecil atacante do time tinha feito uma aposta com os amigos que conseguiria agarrá-la à força e depois contar para todo mundo, para a escola inteira caçoar mais ainda dela.
Porém, quando ela se desvencilhou dando um chute daqueles na canela dele, um taco de beisebol voou do fundo do vestiário até atingir em cheio a cabeça do Emmett, que por milagre não sofrera nenhuma seqüela, embora ele tenha ficado internado no hospital devido ao impacto da batida.
- Ninguém mandou ele tentar aquilo com você Tracy, bem feito pra ele - disse a Pippa, que odiava o Emmett desde que ele tinha feito uma brincadeira de mau gosto que ele tinha feito com ela na formatura do ensino fundamental.
Olhamos a Pippa quando Tracy limpou uma lágrima do rosto, porque apesar de ter quase sido vítima de uma chacota do Emmett, ela foi a primeira a gritar feito desesperada quando viu ele caído no chão desacordado e chamar o resgate para levá-lo ao hospital.
Percebemos que ele viu a cena porque ele parou no meio do refeitório e se voltou até a gente, que já ia para a mesa e quando terminamos de sentar, ele se sentou e disse:
- Acho que está na hora de eu enfrentar o que estou sentindo e espero que você já tenha me perdoado por aquela coisa que eu quis te fazer e fique sabendo que eu agradeço por você ter me ajudado, embora eu ultimamente tenha agido como um idiota.
- Idiota você já é desde que nasceu - disse a Pippa, levando de mim em seguida uma boa cutucada para ficar quieta.
Emmett olhou a Pippa por alguns segundos e a ignorou, sendo que eu esperava que ele mandasse a “gorda” calar a boca e percebendo que realmente ele estava bem mudado desde o “acidente” que poderia tê-lo matado.
- Sabe Tracy, não é que eu tenha medo de me aproximar, o que eu tenho medo mesmo é do Champ Kind querer me matar como tentou fazer com a ex-líder de torcida Trish, por isso eu preferi me afastar, porque sei que ele é seu anjo da guarda, embora ele tenha a aparência mais sinistra que eu já vi na minha vida toda - Emmett terminou a frase gaguejando e com as mãos trêmulas.
Tracy, Pippa, Imy, Joe e eu olhamos Emmett com espanto, especialmente a Tracy, ficando bastante brava e ele disse, pálido como nunca: - Eu imaginava que você ia querer me matar depois dessa, mas eu precisava falar, isso estava preso na minha garganta.
Ao invés de ficar ainda mais danada da vida, Tracy perguntou: - Como assim?
- Certamente você vai dizer que foi uma alucinação e que elas podem ser reais até um pouco demais, mas eu garanto: eu vi a cara dele, senti os dedos gelados dele agarrando o meu pescoço e ainda o ouvi me ameaçando de morte se eu me aproximasse de você de novo e o pior de tudo é que o cara parecia o Barnabas Collins furioso por conta do tamanho daqueles caninos! - disse o Emmett apavorado, como se tivesse acabado de acordar de um longo pesadelo.
- Dedos gelados? Até onde eu sei anjos não são seres muito corpóreos - falou Imy olhando o Emmett como se ele tivesse ficado doido de pedra.
- Caninos grandes? - Joe olhou Emmett e de repente ficou numa espiral de pensamento, até que falou: - Você tá dizendo que o Champ Kind é um...?
- Sinceramente, eu não sei se foi coisa da minha cabeça que pareceu demasiadamente real, porém, que eu fiquei morto de medo, isso com certeza! - Emmett parecia uma criança com todo aquele medo.
- Você e o Joe ficaram doidos, essa coisa de vampiro não existe - disse a Pippa olhando os dois como se eles fossem idiotas e compreendendo o raciocínio silencioso do Joe.
- Por acaso tem explicação melhor Pippa? - perguntou Joe e eu percebi que ia começar uma discussão na mesa, já que eu sabia que ela ia acusar o Emmett de usar drogas ou coisa parecida e ele ia defender o amigo atacante certamente xingando a Pippa e ela ia voar em cima do Joe.
- Vocês dois não comecem antes que todo mundo vá parar na diretoria por briga e todos nós sabemos que o diretor Petrarchus não é moleza quando pune quem faz o que não deve - falei, deixando muito claro que era melhor eles se calarem antes que piorasse.
Os dois calaram e ficaram trocando olhares cheios de chispas de ódio enquanto Emmett parava de tremer e pedia mil desculpas para Tracy, que sorria dizendo que já havia esquecido tudo e que eles poderiam ser amigos, embora ela não tivesse acreditado em uma única palavra que ele tinha dito em relação à tacada que tinha tomado na cabeça, mas achava melhor não dizer nada sob risco de polemizar ainda mais.
Terminado o intervalo e conseqüentemente a aula devido ao aniversário de San Diego, ligaria para o papai avisando que iria à casa da Pippa e almoçaria lá porque tínhamos que continuar o trabalho, porém, lembrei que era o dia das compras do mês, que tinham ficado sob minha responsabilidade desde que tínhamos descoberto a doença de Parkinson na mamãe.
Mandei uma mensagem pelo celular para Tracy, Pippa, Imy e Joe avisando que eu chegaria na casa da Piper por último, por conta de ser a responsável por suprir a casa de comida pelos próximos 30 dias e fui voando pegar o ônibus até o mercado onde eu fazia as compras, chegando lá depois de dez minutos e descendo na parada que ficava do outro lado do mercado, esperando que o semáforo fechasse logo, já que o movimento dos carros naquela via era inacreditável até mesmo para uma cidade do porte de San Diego.
Fechado o semáforo, eu precisava ser rápida, já que o tamanho da pista era seis vezes a calçada e o costume era o sinal abrir muito rápido, fazendo todo mundo que circulava ali esperar mais tempo para atravessar a rua por completo.
Eu, apressada, procurei ir mais rápido que pudesse e quando terminava de atravessar a segunda parte da rua, percebi que algo caiu da minha bolsa e me abaixei para juntar, quando ouvi um som guinchado que parecia alguma coisa fora de controle vindo a alguns metros, senti algo ou alguém me empurrando e de relance, vendo algo acontecer, embora eu não estivesse entendendo muito bem, além de escutar um impacto que me doeu no ouvido seguido de uma voz masculina incrivelmente familiar:
- Não te ensinaram que se confere as coisas antes de carregá-las e que é perigoso parar no meio de uma via movimentada, garota?
Olhei para cima e quase desmaiei quando vi quem havia salvado minha vida: uma cópia perfeita e fidelíssima de Ron Burgundy, tanto no corpo como no rosto, além da voz igualmente linda e musical, porém, quase apaguei mesmo quando vi a frente do caminhão, amassada de tal forma como se alguma coisa tivesse o feito parar à força.
- Foi burrice minha, desculpa se eu causei algum tipo de problema ao senhor - gaguejei a frase inteira de tão nervosa que eu estava e percebendo a burrada que por pouco não me fez ser esmagada por toneladas de metal: a bolsa estava com a metade do fecho aberto.
- Pra mim você não causou nada, mas por muito pouco essa caminhonete não te transformou em pizza devido à sua falta de prudência com as regras de trânsito - disse ele me olhando e começando a se distanciar sem dizer nada como se eu tivesse despertado algum tipo de asco nele.
Não consegui dizer mais nada, sequer perguntar como ele se chamava enquanto ele se afastava até ficar longe do meu campo de visão, quando vi uma equipe de resgate chegando para levar eu e o motorista imprudente que sangrava muito por ter dado de cara no pára-brisa do carro devido ao impacto e levantei sentindo uma imensa dor no rosto, porque só naquele momento percebi que bati de cara no chão ao ser empurrada pelo meu herói.
Já estava em um leito no hospital há pelo menos uma hora, quando chegou ninguém menos que o famoso e bondoso Dr. Larkin, pai do Joe e claro, todo o meu grupo de trabalho, certamente avisado por ele que eu tinha sofrido um “pequeno acidente” e apavorado, perguntando umas mil vezes como eu estava ou se não tinha quebrado algum osso.
- Maddie está bem, apenas com dor no rosto por ter caído na calçada quando um alguém misterioso a salvou, segundo depoimento de uma testemunha - respondeu o médico Alan na tentativa de acalmar o filho e minhas três amigas.
Foi quando o acontecido veio como um filme na minha cabeça, me deixando apavorada: o carro parou a pouca distância de mim devido a um corpo grande e forte, usando um par de ombros firmes, ter criado um amassado daqueles na frente do caminhão e certamente eram do “fantasma de Ron Burgundy”, que tinha me salvado de morrer esmagada contra um Volvo estacionado próximo de mim e o que me apavorava era que eu não o tinha visto antes de tudo aquilo ocorrer.
A sensação de que eu era Bella Swan sendo salva pela primeira vez por Edward Cullen era certa, porém, aquele era mais lindo, mais perfeito e mais forte, um deus grego que parecia ter caído do Monte Olimpo para me salvar.
Eu tinha a sorte de ter ficado viva, além de Alan não ter avisado aos meus pais do acidente, pois minha mãe tinha sérias crises de Parkinson quando ficava nervosa demais, mas claro que ele avisou a Phoebe, que chegou louca de vontade de encher o imprudente motorista de porrada, mas sendo acalmada pelo Dr. Larkin, que dizia que eu estava bem.
- Esse louco podia ter matado a Maddie! - exclamava a Phoebe repetidamente.
- Exceto pela dor no rosto, estou bem Phoebe - respondi mesmo sabendo que não podia, porque o Dr. Alan me recomendou o máximo de repouso e falar o mínimo possível.
Phoebe disse aos outros que a parte escrita do trabalho ia ficar para amanhã porque eu precisava descansar, afinal aquele acidente havia sido feio, e me levou para casa.
Quando chegamos em casa, Phoebe me perguntou como eu podia ter feito a burrice de me abaixar no meio da rua para recolher uma coisa caída da bolsa.
- Eu sei que não devia ter feito isso, mas você sabe como detesto perder qualquer coisa, ainda mais agora que tivemos que cortar várias despesas porque a mamãe sofre de Parkinson - respondi embora eu soubesse que nada justificava minha imprudência.
- Eu te entendo Maddie, realmente entendo seu motivo, porém, ele não justifica o que você fez, então, eu vou passar a alongar o meu caminho para o departamento pra te levar à escola, afinal, eu não te quero metida em encrenca e também garantir que você não cometa outra burrice - disse a Phoebe, me deixando desanimada, porém, eu compreendia, afinal, ela queria minha segurança mais que tudo e eu não podia simplesmente esquecer que o fato de eu ter quase morrido também tinha sido culpa minha.
Subi para meu quarto depois de conversar com a Phoebe e tranquei a porta porque naquela hora não queria ninguém me incomodando, querendo ficar sozinha para reordenar meus pensamentos, porque até ali a minha cabeça rodava mais que o planeta Terra, especialmente por eu não conseguir parar um só minuto de pensar naquele amor inalcançável que sentia por Ron Burgundy.
Me joguei na cama com um desânimo que não sentia desde muito tempo e praticamente dormi, tamanho o cansaço psíquico que sentia, embora eu não estivesse cansada fisicamente.
De repente, ouvi alguém chamando meu nome de uma forma bela e delicada, me acordando e fazendo com que eu andasse em direção à origem daquele som, que era em algum lugar onde talvez minhas pernas não pudessem me levar, mas, por alguma razão desconhecida, não parei de andar até chegar a uma antiga casa que ficava muito longe de onde eu estava antes.
A porta velha e grande em madeira trabalhada se abriu sem que eu precisasse tocá-la, me permitindo entrar e subir até a origem daquele som lindo e delicado, um quarto exatamente igual ao do clipe “Afternoon Delight”, do filme “O âncora”, onde ninguém menos que Ron Burgundy me esperava: - Bem - vinda, Maddie.
Me aproximei sorrindo e em absoluto silêncio, porque nenhuma palavra caberia em momento tão sublime como aquele, onde finalmente eu recebia um beijo verdadeiro daquele que eu amava, além de um forte e protetor abraço, que me fez sentir a mais amada das garotas, quando, de repente, os outros quatro membros da equipe da KVWN e mais uns quantos homens e mulheres entraram e ficaram nos olhando, até que Brick, na altura de seu descomunal tamanho, disse a Ron sorrindo da forma mais sinistra e assustadora que eu já tinha visto:
- A partir dessa noite ela nos pertencerá e o mesmo será com todos aqueles que estiverem próximos dela.
Ouvindo aquela frase, tudo de repente ficou escuro e de alguma forma me dei conta do que estava acontecendo e mais que qualquer coisa desejei fugir, porém, uma dor inacreditável tomou conta de mim, seguida de um grito desesperado.
Seguido daquele grito, dei um inacreditável pulo na cama, descobrindo que tudo não tinha passado de um pesadelo dos mais terríveis e reais que eu já tinha tido.
Quando olhei o relógio do celular, vi que tinham se passado duas horas desde que eu havia me atirado na cama e uma mensagem do Joe dizendo que a parte escrita do trabalho tinha sido concluída, a entrevista com o treinador tinha sido feita e que ambas as coisas estavam no meu e-mail para que eu visse e enviasse a professora Potter e que amanhã, durante o intervalo da aula, iríamos organizar quem iria apresentar o que do trabalho e depois da aula, todo mundo iria pra casa da Tracy ensaiar a apresentação.
Respondi dizendo que estava tudo bem e que eu não me atrasaria para depois da aula, indo logo depois para o computador ver meu e-mail, pegar o que Joe disse que tinha enviado e ver como tinha ficado.

Embora eu estivesse perfeitamente acordada e soubesse que um pesadelo era apenas um pesadelo, eu me perguntava por que justamente com aquilo eu havia sonhado e mais uma pergunta se fez na minha cabeça: será que o meu pesadelo dizia alguma coisa sobre o desaparecimento dos cinco da KVWN da qual eu ainda não tinha me dado conta?

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